Absolvido coronel do massacre do Carandiru

O coronel Ubiratan Guimarães foi absolvido ontem pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça (TJ) paulista. Em um julgamento surpreendente, os desembargadores decidiram por 20 votos a 2 anular parte da sentença do 2º Tribunal do Júri de São Paulo, pela qual Ubiratan tinha pego, em 2001, 632 anos de prisão – só a parte em que jurados condenaram o coronel, dizendo ele se excedera ao reprimir o motim de presos no Pavilhão 9 da Casa de Detenção. A operação, ocorrida em 2 de outubro de 1992, deixou 111 mortos e ficou conhecida como o Massacre do Carandiru. O coronel foi julgado pela morte de 102 deles.

Não cabe mais recurso na Justiça paulista. O procurador Antonio Visconti disse ontem que pretende recorrer ao Superior Tribunal de Justiça. Ele quer anular a decisão do TJ para que o julgamento do caso seja retomado. "Eu discordo da decisão, mas respeito, pois é preciso respeitar as decisões do Poder Judiciário. De outra forma, não teremos um estado de direito", disse o procurador.

Tenso ao chegar ao tribunal, o coronel disse que dormiu cedo na véspera da decisão. Ubiratan, que é deputado estadual pelo PTB, assistiu ao julgamento do banco dos réus dentro do semicírculo formado pelos 25 desembargadores mais antigos do TJ, todos membros do Órgão Especial. Seu rosto ficou tenso quando o relator do processo, desembargador Mohamed Amaro, deu seu voto, negando todas as razões alegadas pela defesa da nulidade da condenação.

A situação do réu parecia complicar-se mais ainda quando o revisor do caso, desembargador Vallim Belocchi, acompanhou o voto do relator. Foi quando pediu a palavra o desembargador Walter Guilherme. Primeiro, o magistrado disse que aquele era um julgamento com conotações políticas.

Em seguida, Guilherme passou a analisar as teses da defesa. Foi então que, por meio de seu voto, que o TJ reinterpretou a vontade dos jurados que haviam condenado o coronel em 2001. No júri, os jurados são obrigados a votar diversas teses da defesa e da acusação. No caso de Ubiratan, uma dessas teses era a de que o coronel agira no estrito cumprimento do dever legal, que foi aceita pelo jurados por 6 votos a 1. Com isso, no entendimento da maioria dos desembargadores, o julgamento devia ter sido encerrado nesse momento e o coronel, declarado absolvido.

Em vez disso, a juíza do caso seguiu adiante com o julgamento, perguntando ao júri se o coronel se havia excedido. Esse respondeu que sim, por 4 votos a 3, o que provocou a condenação. "Se ele havia agido no estrito cumprimento do dever, não havia por que perguntar sobre o excesso, pois se é estrito o cumprimento do dever, ele não comporta excesso", disse o advogado Vicente Cascione, que defendeu o coronel.

Quando o resultado foi proclamado, um grupo de amigos do réu aplaudiu a decisão. Ao mesmo tempo, militantes de organizações de direitos humanos fizeram um protesto. O coronel sorriu. "Sempre tive a consciência tranqüila e acreditei na Justiça. Naquele dia salvamos as vidas de 2 mil presos que não participaram da rebelião e poderiam morrer queimados se a gente não entrasse no prédio. Nunca dei ordem para matar e sempre lamentei os que morreram."

Protestos

Para as entidades de defesa dos direitos humanos, a decisão do TJ foi um retrocesso. "É vergonhoso, algo que vai fazer Brasil ir de novo para o livro dos recordes da impunidade e ganhar manchetes internacionais", diz o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa de São Paulo, Ítalo Cardoso.

Enquanto os protestos continuavam, o coronel deixou o tribunal e foi para a casa. "Vou ver minha mãe, que está velhinha e dar um beijo nela."

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