Borrasca anunciada

Na Comissão de Constituição e Justiça, uma escaramuça; nas comissões especiais, uma batalha; no plenário, uma guerra. Assim foi profetizado, assim será pelo que se viu na CCJ, quinta-feira que passou, durante o processo de aprovação da admissibilidade da proposta de emenda constitucional pela reforma da Previdência, apresentada pelo Planalto. O governo fez barba e cabelo. E desmontou a escaramuça com maioria folgada – 44 votos a 13. Mas o grau de manobras que foi obrigado a empregar bem demonstra o tamanho do abacaxi que está para descascar. Some-se a isso à reação do Poder Judiciário, que, no mesmo dia e hora, advertia o Executivo para o que será capaz de fazer nos próximos dias ou semanas.

Apenas o PDT de Leonel Brizola, como partido, colocou-se contra a proposta que faz correr ódio e calafrios na espinha dos funcionários públicos de Norte a Sul. Dentre os demais, todos contribuíram com a vontade do governo. Uns mais outros menos, incluindo a ala bem orientada de Antônio Carlos Magalhães do PFL que paga, assim, pequenas ajudas que teve no processo das escutas telefônicas. Do PMDB ao PSDB, viu-se de tudo. Na hora do voto, e para manter o discurso, teve deputado que sumiu; outros usaram expedientes quase imperceptíveis à grande massa de brasileiros para impedir o voto nominal. No Parlamento, tudo é válido e possível, desde que haja – como se diz – vontade política.

Houve até quem, nas galerias, rasgasse um volume da Constituição. “Assuma a sua traição!”, berrou o deputado Alceu Colares, do Rio Grande do Sul, acusando o presidente da CCJ, Luiz Eduardo Greenhalgh, do PT, que outrora era contra tudo. “Eu lutei por este País como Vossa Excelência! Exijo respeito!”, devolveu Greenhalgh, esganiçadamente e diante das câmeras. Estrategistas da política tupiniquim já correram ao Planalto aconselhando o governo a tomar mais cuidado nos próximos passos. Um desses cuidados: “conversar” mais com os deputados. E por conversar, entenda-se o que se permite à solta imaginação.

Sim, porque a se julgar pelo que ouviu pessoalmente (e sem poder falar, que ali o protocolo não lhe permite) o presidente Lula durante a solenidade de posse do novo presidente do Supremo Tribunal Federal, Maurício Corrêa, vem chumbo grosso. A magistratura, unida, vai lutar contra o que o novel presidente do STF profetizou: o esvaziamento do Judiciário provocado pelos “males” da reforma, de um lado com a corrida de milhares de pedidos de aposentadoria, de outro o desestímulo a novos ingressos na carreira. A magistratura pede apenas que seja considerada caso especial, assim como os militares. E anuncia que lutará por isso, pois não aceita o carimbo de “privilégio” numa situação que coloca a categoria como a mais bem paga (na atividade e no prêmio da inatividade) da Nação. E a luta da magistratura fortalece a luta do funcionalismo público, também unido pelo sentimento de traição por parte do PT.

Seja como for, a reforma da Previdência começa a ganhar corpo, finalmente, arrastando após si a reforma tributária – outro abacaxi inevitável – que esconde, se não tem outros méritos de vulto, a perenização da CPMF, o chamado imposto do cheque. A reforma sindical e da legislação trabalhista virá na esteira e, quem sabe, também a reforma política e tudo o mais. O clima do fazimento anima as bolsas, baixa o custo do dólar e faz despencar o chamado risco Brasil. Embora a taxa dos juros continue nas alturas. Sic transit gloria mundi, ou melhor, assim passa o governo do PT que jurou redescobrir o Brasil a partir do dia 1.º de janeiro último.

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