As empresas de factoring e a cobrança abusiva de juros

Nos últimos anos, foi possível perceber um elevado aumento na atividade das empresas de factoring, costumeiramente designadas como ?financeiras?.

Esta atividade, salutar na sua origem, tem sido desvirtuada, provocando a ocorrência de situação reprovada pela lei, qual seja, a cobrança excessiva de juros abusivos, em empréstimos financeiros.

Com efeito, perante o ordenamento jurídico brasileiro, é perfeitamente válido o empréstimo de dinheiro entre particulares, mediante a cobrança de juros contratados. Todavia, desde 1933, vigora o Decreto n.º 22.626, também conhecido como ?Lei de Usura?, que impede a cobrança de juros remuneratórios acima de 12% ao ano, sem capitalização, ou seja, sem a cobrança de juros sobre juros.

Este Decreto, entretanto, não alcança as instituições financeiras, que foram expressamente excepcionadas de sua incidência, vez que, em uma economia de mercado, não faz sentido limitar a remuneração do capital financeiro, destinado a fomentar o desenvolvimento e a produção. Mas, para que não haja a incidência da Lei de Usura, é necessário que a instituição se qualifique como financeira, e seja devidamente autorizada a funcionar, pelo Banco Central, inclusive prestando caução de garantia, pois vai atuar no mercado de captação de recursos populares.

Bem por isso, quando há liquidação de algum banco, compete ao Banco Central intervir e garantir os depósitos dos clientes, até como forma de assegurar a credibilidade do Sistema Financeiro Nacional.

Situação bem diferente ocorre com a empresa de factoring, que não se qualifica como instituição financeira e, por isso, não necessita de autorização do Banco Central para o seu funcionamento, nem está sujeita à sua fiscalização.

Na realidade, a empresa de factoring, pela lei, somente está autorizada a mera atividade mercantil de compra de créditos de empresas, originários de faturas devidamente contabilizadas, mediante um desconto que pode variar conforme o risco do recebimento, a ser assumido integralmente pela factoring.

Ou seja, no exercício regular de sua atividade, a factoring não realiza nenhuma espécie de financiamento, mas adquire os créditos das vendas a prazo de outras empresas, geralmente através da cessão de duplicatas ou cheques, liquidando à vista, valores que serão resgatados no tempo a vencer, propiciando um incremento no capital de giro das empresas, geralmente, daquelas que encontram-se com maior dificuldade de crédito.

Justamente porque não emprestam, mas adquirem os créditos, não há atividade financeira propriamente dita, que necessitasse da intervenção do Banco Central.

Ocorre que esta atividade, muitas vezes é deturpada e, não raro, a factoring acaba se tornando uma autêntica financeira, realizando operações de empréstimo de dinheiro, que fogem totalmente de sua razão originária.

É o famoso e corriqueiro caso do sujeito, pessoa física ou jurídica, que necessitando de um crédito, procura uma empresa de factoring, e desconta um cheque ou título similar, para vencimento futuro, com a incidência de juros escandalosos.

Em tais circunstâncias, a factoring age como qualquer particular que empresta dinheiro e, como tal, é limitada pela Lei de Usura, que veda a cobrança abusiva de juros, acima de 12% ao ano, passível de nulidade por tudo aquilo que exceder a esse limite, o que pode e deve ser feito judicialmente.

Marcione Pereira dos Santos é advogado, professor universitário em Maringá e Cascavel, com mestrado em Direito Civil pela UEM.

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