A trabalhadora, a gravidez e os seus direitos

1. Introdução

As mulheres trabalhadoras grávidas tinham garantido pela lei, até 1988, somente o direito ao chamado salário-maternidade no período de quatro semanas antes e oito semanas depois do parto (art. 392, caput, e 393 da CLT), atingindo um total de 84 dias.

A partir da Constituição de 1988 ampliou-se o direito da mulher gestante. Garantiu-se o salário-maternidade de cento e vinte dias, aumentando-se em trinta e seis dias o direito antes existente (art. 7.º, XVIII, CF/88).

O Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, seguindo a tendência das conquistas sindicais, vedou a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto (art. 10, II, b, ADCT).

2. A concepção objetivista e o pronunciamento do Excelso STF

A atual Constituição Federal não modificou a concepção objetivista concernente à estabilidade provisória da gestante, a qual é centrada na teoria do risco da atividade econômica, fruto de longa discussão doutrinária acerca da responsabilidade civil do empregador.

O Excelso Supremo Tribunal Federal, recentemente, confirmou posição já anteriormente adotada sobre o tema. Citando precedentes, o ministro Celso de Mello deixou assente: “A empregada gestante tem direito subjetivo à estabilidade provisória prevista no art. 10, II, “b”, do ADCT/88, bastando, para efeito de acesso a essa inderrogável garantia social de índole constitucional, a confirmação objetiva do estado fisiológico de gravidez, independentemente, quanto a este, de sua prévia comunicação ao empregador, revelando-se írrita, de outro lado e sob tal aspecto, a exigência de notificação à empresa, mesmo quando pactuada em sede de negociação coletiva”(1).

É de se salientar que o C. TST já se adaptou a esta realidade, revisando sua Orientação Jurisprudencial n.º 88 da SBDI I, que agora assim está redigida: “O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade (art. 10, II, b`, ADCT)” (DJ 04.05.04).

3. Indenização x Reintegração

A Súmula n.º 244 do C. TST, em sua antiga redação, dispunha que a garantia de emprego à gestante não autorizava a reintegração, mas apenas o direito a salários e vantagens correspondentes ao período e seus reflexos (Res. 15/1985. DJ 09.12.85).

Recentemente revista, este passou a ser o seu comando: “A garantia de emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade” (Res. 121/2003. DJ 21.11.03).

4. Despedida discriminatória

É possível, ainda, a condenação em dobro em face da negativa da empresa em receber a trabalhadora de volta às atividades, a partir da ciência da gravidez, atraindo a aplicação da Lei n.º 9.029/95, demonstrada a despedida discriminatória. Nesse sentido foi a decisão da 2.ª Turma do E. TRT da 9.ª Região no RO 01544-1999-092-09-001 (3.322/01), Ac. 26.660/01, DJPR 21.09.01.

5. Solicitação de exame de gravidez na demissão

Existem argumentos no sentido de que a solicitação do teste de gravidez para a dispensa da empregada não se mostra inconstitucional, ilegal ou abusiva.

Quem se nega a submeter-se a exame médico necessário não poderá aproveitar-se de sua recusa, diz o art. 231 do NCCB (Lei n.º 10.406/02). Logo, apesar de a matéria seguir controvertida, em face da Lei n.º 9.029/95, Sergio Pinto Martins(2), a respeito, bem explica: “Nada impede, contudo, à empresa, solicitar exame médico na dispensa da empregada, visando verificar se esta se encontra grávida, justamente por ter por objetivo manter a relação de emprego, caso o resultado seja positivo. O empregador não poderá saber se a empregada se encontra ou não grávida se não proceder ao exame”.

Negando a empregada a submeter-se ao exame, a empresa não poderá obrigá-la a isso, em face da Lei n.º 9.029/95. Entretanto, se despedida, não poderá a empregada alegar, de boa-fé, que estava grávida. De qualquer modo, havendo a ação, deveria ficar o empregador liberado de qualquer pagamento até o dia que houvesse a prova da gravidez, colocando o emprego à disposição nesse momento. Se não for aceito, fica dispensado da indenização. Em sessão de 14.10.04, a 2.ª Turma do E. TRT da 9.ª Região não teve outro entendimento (TRT-PR-ROPS 56159-2003-008-09-00-1).

6. Fechamento da empresa

Sempre houve controvérsia sobre a existência do direito da gestante à estabilidade em caso de fechamento da empresa.

Recente julgado do C. TST fez opção jurídica pelo direito da empregada, pontuando “a estabilidade provisória da gestante não se compara a outro tipo de estabilidade, porque o legislador constituinte teve por objetivo assegurar a sobrevivência da mãe e do filho”(3).

7. A demora no ajuizamento da ação

Uma das questões mais polêmicas sobre a estabilidade da gestante é aquela originada da demora da mulher trabalhadora em ajuizar a ação. Supõe-se, assim, a sua má-fé e só defere-se direito a indenização desde o ajuizamento da ação, pois seria sua a culpa pela demora.

Essa corrente foi defendida arduamente pelo eminente professor e juiz Valentin Carrion, que afirmava: “A sentença deve deferir os salários a partir do ajuizamento da ação; perde os salários anteriores quem os pleiteia tardiamente; a lei quer a manutenção do emprego com trabalho e salários, mas não pode proteger a malícia”(4). E também a ela se alinham Sergio Pinto Martins(5) e Estêvão Mallet(6).

Em sentido oposto a essa orientação doutrinária, coloca-se uma corrente jurisprudencial mais tolerante com a demora no ingresso da ação. O argumento principal é o seguinte: permitindo a lei que a empregada ingresse com ação até dois anos depois da ruptura do contrato não há que falar em perda do direito da gestante aos salários, mesmo que o ajuizamento se dê após expirado o prazo da estabilidade provisória(7).

8. O caso especial da gestante doméstica

Quanto à licença maternidade, afirma o art. 7.º, inciso XVIII, como direito de trabalhadoras urbanas e rurais: “licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias”. O parágrafo único do mesmo artigo assegura à categoria da trabalhadora doméstica o direito previsto no inciso XVIII.

Parece não haver dúvida, então, que às trabalhadoras domésticas gestantes garantiu-se o direito à licença maternidade de cento e vinte dias.

Relativamente à estabilidade da gestante, se deve ser aplicada à trabalhadora doméstica, a orientação predominante é negativa, como se vê do seguinte aresto:

“DOMÉSTICA – ESTABILIDADE À GESTANTE. O artigo 7.º, parágrafo único, da Carta Magna não elencou dentre os direitos concedidos às domésticas as vantagens do inciso I (proteção à relação de emprego contra despedida arbitrária). Portanto, não estendeu às mesmas a garantia prevista no artigo 10, II, b`, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, conferindo-lhe apenas o auxílio-maternidade (artigo 7.º, XVII, da CF/88ª(8).

NOTAS:

(1) STF-AI 448572-SP

(2) MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 19.ª ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 599.

(3) Ob. e p. cit.

(4) CARRION, Valentin. Comentários à consolidação das leis do trabalho. 26.ª ed. Atual. e ampl. por Eduardo Carrion. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 251.

(5) MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 13.ª ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 368-369.

(6) MALLET, Estevão. O novo código civil e o direito do trabalho. In: O impacto do Novo Código civil no Direito do Trabalho. Coord. DALLEGRAVE NETO, José Affonso e GUNTHER, Luiz Eduardo. São Paulo: LTr, 2003. p. 60.

(7) TRT-PR-RO 3.700/91. Ac. 3.ª T. 8.641/92. Rel. Juiz Pedro Ribeiro Tavares. DJPR 13.11.92; TRT-PR-RO 16.499-95. Ac.2.ª T 6.461-97. Rel.Juiz Ricardo Sampaio. DJPR 21.03.97; TRT-PR-RO 773-98. Ac. 4.ª T 16.628-98. Relatora Designada a Eminente Juíza Rosemarie Diedrichs Pimpão. DJPR 14.08.98.

(8) TRT-PR-RO 9.348/97. AC. 4.ª T. 33.269/97. DJPR 05.12.97. Rel. Juíza Rosemarie Diedrichs Pimpão.

Luiz Eduardo Gunther

, juiz do TRT da 9.ª Região e Professor das Faculdades Integradas Curitiba e Cristina Maria Navarro Zornig, assessora no mesmo Tribunal.e-mail:
cristinazornig@trt9.gov.br

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