A fuga de Cuba

Há duas interpretações. Alguns atletas cubanos fugiram de sua delegação no pan atraídos pelo dinheiro que podem ganhar profissionalizando-se fora da ilha de Fidel. Outra é que buscaram a liberdade. Parece-nos que as duas coisas. Ou uma, se considerarmos que ganhar dinheiro com o suor do próprio rosto não é nenhuma imoralidade. O fato é que, durante os jogos do pan realizados no Rio, desde o início a delegação cubana foi sofrendo defecções. O jogador de handebol Rafael d´Acosta deu o fora e foi encontrado em São Paulo. Disse que pretende pedir asilo político ao governo brasileiro. O técnico de ginástica artística Lázaro Lamelas também preferiu a liberdade. Os cubanos acham que apenas é a liberdade de ganhar dinheiro. Aquela que, em ação de camelôs, quase todos os atletas cubanos exerceram ao vender na vila do pan seus próprios uniformes de atleta. Em dólares e a preços bem salgados. Alguns confessaram que não vendiam porque já haviam se desfeito de tudo, menos da roupa do próprio corpo. Ganhavam dinheiro por motivos ideológicos ou amor a Cuba?

As defecções mais doídas foram as dos boxeadores: do bicampeão olímpico Guillermo Rigodeaux e do campeão mundial Erislandy Lara. O principal esporte de Cuba é o boxe e estes eram seus melhores boxeadores. Aliás, dos melhores do mundo. De qualquer forma, resta para o governo cubano o consolo de que estes foram os jogos mundiais de que participaram em que houve menor número de fugas de atletas. A cada saída dos times cubanos para o exterior, sempre um grande número deserta.

Já os que deixam Cuba arriscando suas próprias vidas em barcos improvisados, buscando chegar a Miami, é difícil acreditar que tanto se arrisquem e façam tais sacrifícios por dinheiro. Uma visita aos bairros cubanos da principal cidade da Flórida demonstra que lá eles também têm uma vida difícil. Mas testemunham que têm liberdade e este é o bem maior que procuram. A possibilidade de ganhar dinheiro, ter mais conforto e comida, também. Mas já se mostram felizes com a possibilidade de ir e vir que não existe em Cuba.

No final do pan, que foi um sucesso e mostrou que uma boa organização torna possível uma festa de tal magnitude mesmo numa cidade infectada de problemas como o Rio, Raúl Castro, que manda em Cuba porque é general e tem o grande mérito de ser irmão de Fidel Castro, mandou um avião russo Ilyushin, da empresa Cubana de Aviación, pertencente, como tudo na ilha caribenha, ao seu governo, para pegar cerca de 240 atletas que ainda estavam no Brasil. Levaram todos, à noite, numa operação que mais parecia uma fuga. Nem o time cubano que ganhou medalha de prata no vôlei ficou. Não foi à cerimônia do pódium e ganhou uma estrondosa vaia. E não receberam, como outros vitoriosos cubanos, as medalhas a que tinham direito. Elas serão enviadas a Cuba pelo correio. No domingo, último dia do pan, mais um avião veio para pegar o resto da delegação cubana. O motivo, dizem, é que surgiu um boato que se generalizou no sentido de que haveria uma fuga em massa dos atletas cubanos. Mesmo sendo a mais antiga ditadura do mundo e um dos últimos países comunistas do globo terrestre, parece que ainda não conseguiram incutir nas mentes dos cubanos que os dogmas ideológicos marxistas são mais importantes do que a liberdade e o vil metal.

Para se fazer justiça, e porque isso é evidente, lembremos que nos esportes, como em outros setores, os cubanos são ótimos. Só que fica a impressão de que são assim vitoriosos, como os gladiadores da antiga Roma, treinando sempre e sob os auspícios e ordens dos que detêm o poder. São instrumentos de propaganda do regime. E quando conseguem escapar são acusados de traidores da pátria, cujo governo que se eterniza insiste que têm de viver naquele paraíso. Queiram ou não queiram.

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