A boca maior

Das exortações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva aos seus ministros, na terceira reunião do gênero desde o início do governo, uma está a merecer alguma reflexão mais aprofundada. Aquela em que o chefe da nação ensina que é sempre melhor ter ouvidos maiores que a boca. “Muitas vezes temos a boca maior que os ouvidos e isso não é nada bom”, disse Lula, sugerindo maior controle das informações que circulam pelos ministérios. “Falar é prata, calar é ouro”, diz um velho ditado.

Lula, na verdade, está preocupado com a imagem que, dia após dia, vai sendo consolidada país afora: o governo parece “perdido” e desarticulado em algumas áreas importantes, como a social. Perdido, desarticulado e lento – sendo que este último adjetivo advém da posição tomada pelo próprio Partido dos Trabalhadores, na última reunião de sua executiva nacional, que exigiu maior agilidade ao Planalto. Segundo Lula, além de falar demais, alguns colaboradores do primeiro escalão do governo estariam cedendo às tentações dos holofotes e câmeras fáceis. Resultado: tem gente queimando gente ao se meter em seara alheia, ou que pouco entende. Um comportamento reprovável.

A imagem da boca maior que os ouvidos, entretanto, é considerada. Também os assessores do presidente norte-americano Bush tentaram evitar vazamento de informações prejudiciais ao andamento da guerra. Mas ela pode ser assumida isoladamente do contexto em que foi dita por Lula, para desprezo de um conceito não muito condizente com o discurso petista – o da transparência. Controle de informações é algo que arrepia. Pode ser bom e pode ser ruim. E nem tudo o que é bom para o governo necessariamente o é também para a sociedade. Assim, convém que os do governo façam como os caninos, eriçando orelhas para melhor ouvir o que se diz na planície, aqui onde a sociedade coloca em prática – pela vontade ou pela imposição – as decisões do Planalto.

Questões de transparência à parte, governo ideal – e pode também ser isso que Lula está a dizer – é aquele que mais sabe ouvir que falar. Que consegue agir com firmeza de propósitos, objetivamente, sem a tergiversação que busca nos imprevistos da situação ou nos percalços advindos do passado o muro de inúteis lamentações. Ouvir quer dizer auscultar, saber identificar o que pensam, querem ou reivindicam os governados. A prudência, de fato, está mais no saber ouvir que no destramelado dizer.

Até aqui – e isso é incontestável – o governo tem demonstrado boca maior não só em relação aos ouvidos, mas também em relação às mãos. Isto é, falou mais do que ouviu, disse mais do que agiu. E está todo mundo aguardando ações que materializem as promessas que geraram a onda de esperanças da última campanha. É verdade que não foi com essas palavras que o presidente, sempre dado a metáforas, falou a seus colaboradores mais íntimos. Mas dá para entender dessa forma sem muito esforço. Afinal, desde o Fome Zero até os problemas da violência no campo e na cidade, passando pela geração de empregos e retomada do crescimento – tudo isso ainda remanesce no campo das esperanças e promessas.

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