Poetisas da comarca dos meus sonhos

Sempre que me recordo de Astorga, uma saudade imensa me domina.

Como já escrevi, lá desfrutei de rara felicidade, vinculando-me coracionalmente aos meus jurisdicionados, certo que a tenho, em meu coração, eleita a comarca dos meus sonhos.

Dias passados, por ocasião da Feira do livro, ali mesmo, na Praça Osório, tive ensejo de relembrar os dias venturosos dos oito anos que vivi em Astorga, convivendo com seu povo amável e generoso.

É que reencontrei querida amiga, que expunha sua produção literária, representada por maravilhosos poemas.

Maria Lúcia Ferreira Barbosa, que conheci bem jovem, menina mesmo, filha de dileto amigo e serventuário da Justiça, João Ferreira Barbosa, é, agora, ao lado de sua irmã Helena Barbosa Mendonça, distinguida poetisa, para gáudio de seus amigos e apreciadores da arte literária.

A primeira, formada em Direito, fez rápida e bem-sucedida carreira no Ministério Público, aposentando-se e residindo em Londrina, onde participa de importante escritório de advocacia, pós-graduada que é em Direito Ambiental pela Universidade de Castilla – La Mancha – Toledo, Espanha.

Como ela própria afirma, define-se como ?alguém que, desde 1984, abdicou da poesia – terreno movediço das emoções e guiou seus passos pela razão e pela lógica, até o reencontro recente e inevitável com a emoção guardada e a magia das palavras?.

Retornando, em setembro de 2004, passou a produzir versos brancos e livres, como diz modestamente, embora componha lindos sonetos, ricos de rima, à exemplo deste:

Revejo minha vida e suas circunstâncias

do alto da colina duramente escalda;

coração, mas a razão em preponderância

não preveniram feridas da caminhada

Vitórias, derrotas, ação e reação,

Erros, acertos, ilusão… desilusão

fazem íris das cores desta composição,

tela vivida, pincelada de paixão…

Assim fui, assim sou, cigana de mil dores,

protagonista ativa de todo teu cismar,

garras na tua pele, sangrando teus licores…

Deles embriagada, ébria vou te buscar,

Neste desejo… na tua boca sopro amores,

nestes meus braços te faço crucificar!

A segunda, atualmente morando em Rolândia, também de rara sensibilidade poética, assim explica a sua verve: ?No colégio interno das Irmãs Apóstolas do Sagrado Coração de Jesus, onde estudou, recebeu de presente o primeiro livro de poesias de J. G. de Araújo Jorge e, a partir daí, iniciou as primeiras construções poéticas, sempre adotando o estilo breve, composto de versos de significado e vida própria que se completam no contexto do poema. Abandonou a poesia, quando as três filhas vieram, e a ela retornou há dois anos, seguindo a mesma trilha de brincar com as palavras e passar uma mensagem sem ater-se aos requisitos formais da poesia?.

Ausência é um modelo do seu poetar,

Ausência, barco sem rumo e sem vela

é grito de dor que ecoa na alma

segredo de mágoa que não revela

Estertores, que nos furtam a calma

Ausência é como cruzar distâncias

Vencer rios, mares, vales e montes

O pensamento coberto de ânsias

Passos aflitos transpondo pontes

Ausência é um sentido que atormenta

levando em nossos olhos um véu negro

é o desespero que não se agüenta

e frisando os passos de puro medo

É desespero da falta de mim

é ter o bem sem o poder tocar

Ser andarilho na estrada sem fim

gemido de dor, eterno chorar

Se perto não te tenho, meu amor

nada interessa, me despeço da vida

Eternamente vou gritando a dor

triste tormento sem tua guarida.

Astorga principalmente, mas também Londrina e Rolândia devem orgulhar-se de tão magníficas poetisas.

João Ferreira Barbosa, na placidez remançosa dos braços do senhor e D. Georgina, que convive com suas filhas, merecem louvores porque, na realidade, Lucy e Lenya Terra, heterônimo das versejadoras, podem figurar na galeria dos grandes literatos paranaenses!

De minha parte, envaideço-me em conhecê-las e tê-las em meu coração!

Luís Renato Pedroso é desembargador jubilado, presidente do Centro de Letras do Paraná e vice-presidente do Movimento Pró-Paraná.

Voltar ao topo