Milton Nascimento fala do padrinho Agostinho dos Santos

Foi Agostinho dos Santos mesmo que inscreveu suas músicas no 2º Festival Internacional da Canção? Como foi essa história?

Milton Nascimento – Eu estava um pouco decepcionado com o clima de guerra entre os artistas e o público que encontrei em 1966, no Festival Berimbau de Ouro, e prometera a mim mesmo jamais participar de outro concurso. Agostinho, que tinha me visto tocando num bar em São Paulo, queria tirar isso da minha cabeça e, um dia, chegou e disse que ia fazer um disco novo e que precisava de três músicas para, junto com o produtor, escolher uma. Gravei Morro Velho, Maria Minha Fé e Travessia, e, em vez de colocá-las num álbum, Agostinho inscreveu no festival, escondido de mim. A primeira pessoa a me contar que eu tinha classificado as três músicas foi Elis Regina, que havia encontrado numa tarde na rua. Ela chegou pra mim e disse: “Parabéns, você está no festival!”. E eu respondi que não tinha feito inscrição nenhuma. Daí ela falou: “Nossa, então tem outro Milton Nascimento!”. Aquilo quase me matou, saí dali pensando um monte de coisas, que teria que mudar de nome, etc… Até que eu escuto uma risada atrás de mim, era o Agostinho rindo da minha cara. As três músicas foram classificadas, Maria Minha Fé na voz de Agostinho, e as outras duas comigo cantando. Travessia acabou ganhando o segundo lugar e eu ainda levei o prêmio de melhor intérprete. Agostinho é o responsável por tudo isso, eu jamais teria participado de outro festival se não fosse pelo plano montado carinhosamente por ele. Ele foi meu padrinho musical e uma das pessoas mais importantes da minha vida.

Qual a importância e o legado deixados por ele para a música brasileira? Ele foi um dos precursores do canto moderno no País?

Milton Nascimento – Sem dúvida! Agostinho foi um dos grandes astros da música brasileira enquanto esteve conosco, mas infelizmente partiu muito cedo. Essa foi uma das maiores perdas da minha vida, assim como Elis. Sem falar que o Agostinho era um cara com muitas preocupações sociais, e pouca gente comenta isso. Foi ele que me levou ao Clube Aristocrata, em São Paulo, um clube só de pretos que era muito ativo no cenário político da época. E um dos caras mais respeitados naquele meio de artistas, músicos e intelectuais era justamente o Agostinho.

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