Marlon Brando: o mito de uma geração

Recente pesquisa realizada nos EUA apontou os cem personagens mais importantes do cinema. A lista privilegia personagens só de filmes de língua inglesa. A lista foi publicada na Premiere dos EUA e aí você pode ter certeza de que o personagem poderá mudar, mas o ator, Marlon Brando, com certeza estará em cena.

Brando é um mito que moldou toda uma geração de (anti)heróis americanos. A lista da Premiere inclui aqueles personagens que você, cinéfilo, também ama – Ethan Edwards, de “Rastros de Ódio”, de John Ford; Ricky Blaine, de “Casablanca”, de Michael Curtiz; Scarlett O’Hara, de “…E o Vento Levou”, de Victor Fleming; Fred Dobbs, de “O Tesouro de Sierra Madre”, de John Huston; e James Bond, da série com o espião criado pelo escritor Ian Fleming – os votantes esclareceram que preferem 007 na pele de Sean Connery. Mas o número 1, o top da lista, foi Don Vito Corleone, de “O Poderoso Chefão”, de Francis Ford Coppola. Brando também contribui com outros personagens para a lista dos cem mais. O Terry Malloy de “Sindicato de Ladrões”, o Stanley Kowalski de “Uma Rua Chamada Pecado”.

A pesquisa publicada por Premiere e dois lançamentos em DVD nas locadoras e lojas especializadas do País -“Sayonara”, de Joshua Logan, dos anos 1950, e “Caçada Humana”, de Arthur Penn, dos 60 -reabrem o culto em torno de um dos maiores mitos do cinema. E isso ocorre justamente numa daquelas datas redondas, que a imprensa adora celebrar. Marlon Brando comemora, no sábado, 80 anos.

Você não poderia imaginar que isso fosse ocorrer algum dia. Poderia jurar que Brando iria se consumir como aquele outro rebelde célebre, James Dean, que fez três filmes cultuados – “Vidas Amargas”, de Elia Kazan; “Juventude Transviada”, de Nicholas Ray; e “Assim Caminha a Humanidade”, de George Stevens, todos no biênio 1955-56 – antes que seu carro se espatifasse numa estrada do Texas, há quase 50 anos.

Brando teve mais altos e baixos do que qualquer outro astro ou estrela – embora nesse departamento seja páreo duro concorrer com Elizabeth Taylor e John Travolta. Ao comemorar 80 anos nesta semana, ele talvez ache que não tenha nada para comemorar. Para nós, o público, ele é um ídolo, um mito e uma referência. E o mais curioso é que você talvez não saiba, mas o furacão Brando nasceu no mesmo dia e ano de uma certa Doris Day, que hoje, portanto, também está comemorando 80 anos. O maior rebelde do cinema e a virgem do hímen de aço, definição que ela ganhou pela série de comédias que fez com Rock Hudson, por volta de 1960 -, são do mesmo signo, talvez tenham o mesmo ascendente.

Sayonara, Caçada Humana em DVD

Quase dez anos separam Sayonara, de Joshua Logan, de 1957, e Caçada Humana, de Arthur Penn, de 1966. Dez anos durante os quais a carreira de Marlon Brando entrou em parafuso e o maior astro da tela nos anos 1950, o emblema de toda uma geração, acumulou fracassos retumbantes. Brando sempre teve um desprezo olímpico pelas convenções de Hollywood. Isso fazia parte de sua arrogância, como artista e como homem. Hollywood retribuiu, regozijando-se com o que parecia sua derrocada.

Logan teve um grande começo, com êxitos como Férias de Amor, com Kim Novak e William Holden, e Nunca Fui Santa, com uma Marilyn Monroe particularmente excitante. Foi quando veio a diluição de Sayonara, baseado no romance de James Michener, com Brando como oficial americano que se envolve com cantora japonesa, durante a Guerra da Coréia. O filme é Madame Butterfly sem Puccini e, embora bem feito, é aflitivo na sua mediocridade. O Brando apaixonado pela japonesa transferiu a ficção para a vida e se casou com uma suposta oriental – Anna Kashfi. Descobriu que era uma americana disfarçada e o divórcio virou baixaria.

Caçada Humana é de outra linhagem. Arthur Penn fez o maior western psicanalítico do cinema – Um de Nós Morrerá, com Paul Newman como Billy the Kid. Prosseguiu aqui com a psicanálise da América, mostrada como uma sociedade doente, que só consegue resolver seus conflitos por meio da violência. Brando é excepcional como o xerife que tenta manter a lei e a ordem no fim de semana em que a caçada a um fugitivo vira diversão sangrenta. O filme foi remontado à revelia do diretor, mas o espectador, que não tem o que seria o Caçada Humana ideal na cabeça, só pode achar Caçada Humana um monumento. O filme é Tiros em Columbine como ficção, enfatizando a idéia do revólver como substitutivo do falus. Os DVDs da Warner – Sayonara e Columbia – Caçada Humana não trazem os extras que mereciam, mas o segundo é daqueles que cinéfilo não pode deixar de ter em casa.

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