José Wilker está rindo de orelha a orelha com o sucesso que vem fazendo seu personagem

tv51.jpgBastam poucos minutos de conversa com o ator José Wilker para perceber que ele está completamente encantado com o seu atual trabalho, o Giovanni Improtta de Senhora do Destino.

Wilker fala do personagem com grande fluência, sempre com um imenso carinho e um indisfarçável brilho nos olhos. Talvez essa empolgação se deva a uma certa semelhança de personalidade entre ator e personagem: ambos são irônicos e irreverentes. Mas Wilker prefere dizer que o fascínio se deve ao bom humor e ao romantismo do ex-bicheiro. "Acho o Giovanni muito bonitinho. Ele é um cara que vai se educando sentimentalmente ao longo da vida. Acho legal", filosofa, com um sorriso no canto dos lábios.

Na verdade, não é só o sentimentalismo de Giovanni que chama a atenção do ator. Wilker tem plena consciência do apelo popular do personagem e já percebeu que ele ainda pode lhe render muitos "aplausos". O próprio Aguinaldo Silva já observou que basta Giovanni aparecer na trama para a audiência subir. Agora, Wilker está rindo "de orelha a orelha". Ainda mais porque, para ele, fazer esse papel está sendo um grande divertimento.

Wilker ainda conta com sua espontaneidade para tentar alavancar ainda mais o sarcástico Giovanni. Muitas das "pérolas" ditas pelo ex-bicheiro são criadas por Wilker, que garante não "quebrar a cabeça" para inventá-las. Segundo ele, as frases surgem naturalmente durante as gravações. Para complementar a boa fase, o ator ganhou o título de Melhor Ator da eleição Melhores e Piores 2004 de TV Press. Mas Wilker considera que um prêmio é não só um reconhecimento, como também e, principalmente, sinônimo de uma grande responsabilidade. "Agora que ganhou, reinvente-se. Agora que foi reconhecido, recomece", ensina, do alto de seus 59 anos.

Duplas jornadas de trabalho

Atualmente, além da novela, Wilker se divide entre as gravações semanais de dois programas sobre cinema no rádio e na tevê a cabo e a presidência da Riofilme, órgão ligado à Prefeitura do Rio que cuida de assuntos relacionados a cinema, cargo que ocupa desde junho de 2003.

Essa atividade, aliás, foi uma das responsáveis pelo afastamento do ator da tevê desde agosto de 2002, quando terminou Desejos de Mulher, até junho deste ano. "Eu estava instalando um processo de trabalho e viajava muito. Cheguei a passar quase cinco meses fora do Brasil em festivais de cinema", conta.

Mas Wilker não se incomoda nem um pouco com o excesso de trabalho, principalmente, se as tarefas forem ligadas à interpretação e a cinema, sua grande paixão desde os oito anos de idade. "Quando você faz o que gosta o tempo é seu aliado. Quando faz o que não gosta ele é seu carrasco", filosofa.

P – Já se constatou que, quando Giovanni aparece na trama, a audiência sobe em média três pontos. A que você acha que se deve essa simpatia que o personagem desperta no público?

R – Não sei explicar porque as coisas dão certo. Ah… são várias razões. A primeira é pelo extraordinário senso de humor do Giovanni, muito semelhante ao dos brasileiros em geral. Em segundo lugar, nós, brasileiros, também somos excessivamente românticos. A história de uma pessoa que espera por uma mulher 30 anos, de alguma maneira, é atraente, não só para as mulheres, mas também para os homens. Em terceiro, o Giovanni tem raízes muito bem fincadas naquela faixa de brasileiros que trabalha duro para conseguir o que quer, e a expectativa do sonho realizado está lá cristalizada nele. Finalmente, acho o texto do Aguinaldo muito gostoso de dizer. Não há uma boa interpretação sem uma base sólida, que é o texto.

P – O Giovanni é o seu personagem de maior apelo popular?

R – Sem dúvida, o Giovanni é um dos de maior resposta que tive em 35 anos de tevê. Eu só tive equivalentes em Roque Santeiro, Fera Ferida e Renascer, mas o Giová parece ter caído mesmo no gosto do público. Nas ruas, escuto as coisas mais variadas. Desde o cara me aconselhar a investir na "ninfa bebê" até pessoas que ficam me contando o que está acontecendo na novela. Eu só tenho que comemorar, pois sempre tive muita felicidade com os personagens que fiz ao longo da minha carreira. Não que eu tenha feito bem ou mal. Odeio essa coisa de auto-elogio, não convivo bem com esse departamento.

P – Você já fez papéis que não obtiveram sucesso junto ao público?

R – Em tevê não tenho muito como avaliar, pois a tevê trabalha com quantidades monumentais de tudo, inclusive de telespectadores. Mas em teatro um dos trabalhos que mais gostei de fazer como ator foi um retumbante fracasso. O nome da peça era Ensaio Selvagem e eu interpretava uma mulher. Houve semanas da gente só conseguir fazer uma sessão porque não havia público para as outras. O Teatro Ipanema, no Rio, estava sempre vazio…

P – Como surgem as "pérolas" do Giovanni?

R – Muitas já estão no texto. As que eu crio, não sei explicar muito bem como elas surgem. Não sou um ator cerebral, que fica planejando fazer isso ou aquilo. As palavras surgem ali na cena mesmo. A questão do excesso de pronomes fui eu que inventei e agora o Aguinaldo já incorporou ao texto. Também escuto muitas coisas nas ruas. Algumas até já usei como "a lei de smurf", que um cara me sugeriu em um sinal quando estava indo para o Projac, e "stop de linha". As pessoas se sentem muito próximas do Giovanni e um pouco amigas dele. Elas sugerem que eu fale e eu falo, mas sem dar nenhum destaque excessivo. O personagem não pode parar por aí.

P – Como assim?

R – O centro da minha atuação é mais em cima de uma postura frente à vida, que resulta nesse tipo de expressão do Giovanni. Ele não teve as escolas que as pessoas em geral têm ou deveriam ter. Ele passa por esse vocabulário, por essa gramática, como se fosse a coisa mais normal do mundo, para ele é uma linguagem corriqueira. Se eu ficar destacando isso, vai virar uma caricatura, que acho empobrecedora e que não junta com a novela.

P – Existe algum termômetro para saber que tipo de bordão funciona ou não?

R – Meu primeiro público é muito especial. É o pessoal da técnica que assiste a todos os ensaios, todas as novelas, todos os dias. Se você consegue prender a atenção deles, de alguma maneira significa que você está em um caminho razoável, que pode conduzi-lo a uma conversa boa com os telespectadores. Nós temos nos divertido muito. Às vezes, temos de parar uma cena por causa de acessos de riso provocados por alguma barbaridade gramatical do Giovanni.

P – Por que você não gosta de fazer laboratório para compor seus personagens?

R – Eu não sei fazer essa coisa de laboratório, de pesquisar. Eu, frente a um personagem, procuro acumular o máximo de informação possível a propósito da vida. Leio muito, sou curioso, tudo me atrai. Vivo cercado de livros, músicas, filmes, além de conversar muito com diferentes pessoas. Tudo isso acaba sendo material de trabalho para mim. Quando estou atuando, essas coisas vêm… É um pouco de intuição aliada a alguma técnica, que eu não sei qual é, que depois de 40 anos de carreira eu devo ter aprendido. Tenho que ser franco e dizer que esse é um método que serve só para mim. Não aconselho ninguém a fazer assim. Eu não tenho a menor paciência de ficar estudando texto em casa. Os personagens ficam no cabide do camarim.

P – Em Bandeira Dois, sua primeira novela, exibida em 1971, você interpretou o filho de um bicheiro. Agora você está interpretando um ex-bicheiro. Você já conhece bem esse universo?

R – Devo confessar que não sei quase nada a respeito desse meio, apesar de já ter até trabalhado em uma peça financiada pelo pessoal do jogo do bicho nos anos 60 e ter feito um filme também bancado por um cara ligado ao jogo. Ele queria contar para uma mulher que estava apaixonado por ela e fez um filme, que nem chegou a ser lançado. Mesmo agora, continuo não conhecendo muito desse mundo. O Aguinaldo conhece a fundo esse meio e escreve bem sobre isso.

P – O que mais fascina você na profissão de ator?

R – Eu me divirto imensamente com o meu trabalho. Não sou sisudo e nem fico me levando excessivamente a sério. Já descobri que esse meu trabalho é uma grande diversão. Eu cometo todos os crimes impunemente: não vou preso porque assalto, roubo, mato, xingo, sou infiel ou falto ao trabalho. Eu me permito tudo nesse trabalho. Não conheço outro que me permita essa liberdade e essa tamanha instigação à criatividade.

P – Depois de 40 anos de carreira, existe algum personagem que você ainda gostaria de fazer?

R – Nunca aspirei fazer nenhum personagem. Às vezes tenho até um pouco de inveja de certos atores que querem fazer aquele determinado personagem, que batalham por aquilo e que se empenham em ganhar dinheiro para produzir aquele trabalho. Eu nunca tive esse tipo de aspiração. Quero interpretar todos aqueles que, de algum modo, me desafiarem e forem atraentes para mim. Eu sou ator porque sou. Sou visceralmente ator e não sei fazer outra coisa. Nem quero.

Bandeira Dois, primeira novela

# Bandeira Dois, 1971, Globo, Zelito.

# O Bofe, 1972, Globo, Bandeira.

# Cavalo de Aço, 1973, Globo, Atílio.

# Os Ossos do Barão, 1973, Globo, Martinho.

# Corrida do Ouro, 1974, Globo, Fábio.

# Gabriela, 1975, Globo, Mundinho Falcão.

# Anjo Mau, 1976, Globo, Rodrigo.

# Plumas e Paetês, 1980, Globo, Renato.

# Brilhante, 1981, Globo, Oswaldo.

# Final Feliz, 1982, Globo, Rodrigo.

# Transas e Caretas, 1984, Globo, Tiago.

# Roque Santeiro, 1985, Globo, Roque Santeiro.

# Carmem, 1987, Manchete, Camilo.

# O Salvador da Pátria, 1989, Globo, João Matos.

# Mico Preto, 1990, Globo, Frederico.

# Renascer, 1993, Globo, Coronel Justiniano.

# Fera Ferida, 1993, Globo, Demóstenes Maçaranduba.

# A Próxima Vítima, 1995, Globo, Marcelo Rossi.

# O Fim do Mundo, 1996, Globo, Tião Socó.

# Anjo de Mim, 1996, Globo, Bianor.

# Salsa e Merengue, 1996, Globo, Urbano.

# Suave Veneno, 1999, Globo, Waldomiro Cerqueira.

# Um Anjo Caiu do Céu, 2001, Globo, Tarso.

# Desejos de Mulher, 2002, Globo, Ariel.

# Senhora do Destino, 2004, Globo, Giovanni.

Voltar ao topo