Ithamara Koorax, esta ilustre desconhecida

Pouco conhecida no Brasil, a cantora carioca Ithamara Koorax ganhou na última semana um dos prêmios mais importantes do mundo do jazz, concedido pela revista americana DownBeat. O trabalho premiado pela publicação, considerada a ?bíblia do jazz?, foi o CD mais recente da cantora, o Brazilian Butterfly. Nascida em Niterói, Ithamara é uma artista flexível, que não se dedica apenas a um ritmo de música, se dizendo apaixonada pelos cantores brasileiros, como a paranaense Stellinha Egg, e outros de renome internacional, como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Aldir Blanc e Tom Jobim.

A cantora, que quase não põe os pés no Brasil, chega a fazer mais de 100 shows em um ano, mas ninguém no País nunca ?fica sabendo disso?, como ela mesmo diz. Por causa da carreira ?errante?, a artista passa frequentemente por lugares como Finlândia, Londres, Paris, Portugal, República Tcheca, Coréia… Por e-mail, Ithamara concedeu uma entrevista exclusiva a O Estado. Abaixo, você pode ler os melhores trechos da conversa.

Trajetória

?Minha mãe, ainda viva, foi cantora lírica. Meu pai gostava muito de jazz. Quando criança, estudei piano clássico e teoria musical, antes de estudar canto. Comecei fazendo backing-vocal para Tim Maia. Mas só iniciei a carreira profissional como líder em 1990, quando montei um show para lançar as parcerias da dupla Guinga & Aldir Blanc. Também em 1990 fiz a minha primeira gravação, Iluminada, tema da personagem de Vera Fischer na mini-série Riacho doce. Hoje eu tenho mais de dez temas em novelas da Globo.?

Ritmos diversos

?O rótulo de cantora de jazz veio do exterior, da crítica americana e européia. Mas canto todos os estilos, não tenho preconceito algum. Nas trilhas para a TV Globo, por exemplo, nunca cantei jazz, e sim músicas de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Aldir Blanc, Tom Jobim. Faço também muitos concertos de música clássica, ao lado de orquestras sinfônicas, cantando Villa-Lobos e Heckel.?

Shows

?O meu próximo show, Tempo Feliz, que estréia dia 4 de janeiro para uma temporada de um mês na casa noturna Bar do Tom, no Rio de Janeiro, é dedicado aos repertórios de Baden Powell e Dorival Caymmi.?

Brazilian Butterfly

?Meu CD mais recente, Brazilian Butterfly, considerado um dos melhores discos de jazz de 2007 pelos críticos da revista DownBeat, na edição especial de janeiro de 2008, tem apenas uma música norte-americana, do Herbie Hancock. As outras são de Caymmi, Pixinguinha, Waldemar Henrique, Geraldo Vandré e Milton Nascimento. Aliás, o disco é dedicado a uma cantora paranaense, Stellinha Egg, uma das minhas cantoras brasileiras favoritas ao lado de minha madrinha Elizeth Cardoso, de Elis Regina e da Flora Purim.?

Carreira internacional

?Gostei e gosto de todos os países onde me apresentei, nunca fui mal recebida. Seja na Finlândia, em Londres, em Paris, em Portugal, na Ásia ou na República Tcheca, onde cantei pela primeira vez em outubro passado, a receptividade é sempre muito boa. Fazemos shows nos mesmos teatros ou grandes espetáculos ao ar livre para uma média de quatro mil pessoas. O Brasil é que não fica sabendo disso, porque não é noticiado. Então acaba sendo mais fácil viajar para a Coréia do que ao Paraná, aonde não sou chamada para cantar desde 1991. Recentemente saiu um livro interessantíssimo, do DJ Zé Pedro, chamado Meus discos e nada mais, e ele dedica um capítulo a mim, falando algo que a imprensa brasileira nunca teve coragem de escrever: que a minha carreira é invisível no Brasil por causa da inveja que o meu sucesso no exterior acaba causando, infelizmente.?

Influências

?Além das que eu já mencionei Stellinha Egg, Elis, Elizeth e Flora, assimilei influências também de João Gilberto, Tito Madi, Tony Bennett, Sinatra, Mark Murphy, Shirley Horn, Betty Carter, Carmen McRae, e uma polonesa chamada Urszula Dudziak. É engraçado lembrar que duas cantoras que eu mais ouvi na infância, Ella Fitzgerald e Sarah Vaughan, que eu amo, não me influenciaram em nada. Porque talvez eu já soubesse, inconscientemente, que seria ridículo eu querer imitar cantoras como elas, especialistas em scat-singing e atuantes em um contexto de jazz mais chegado ao bebop. O meu conceito de jazz é mais elástico, mais aventureiro. Tanto que as minhas duas cantoras favoritas da nova geração são a Rachelle Ferrell e uma brasileira chamada Aline Morena.?

Prêmio da DownBeat

?É uma grande honra, claro. Em 2007 foi a primeira vez em que, na votação dos leitores da DownBeat, dois brasileiros ficaram considerados entre os cinco melhores do mundo: eu e o João Gilberto. Esta votação acontece há 72 anos e a DownBeat é chamada de bíblia do jazz porque é a mais importante revista de jazz em todos os tempos, uma referência mundial. O páreo ali é duríssimo! Basta dizer que, em 2007, o Tony Bennett foi eleito melhor cantor pela primeira vez, aos 81 anos de idade e 60 de carreira! Li várias entrevistas do Tony dizendo que era o prêmio mais importante da vida dele. Então eu não posso negar que estou muito feliz. Ainda mais porque o João Gilberto é uma lenda viva, o criador da bossa nova, e tem mais de 50 anos de sucesso. Eu tenho apenas 18 anos de carreira, ainda estou em fase de crescimento no mercado internacional. Mas não fico deslumbrada nem preocupada com este tipo de premiação, porque num ano eu posso chegar em quarto lugar, num outro em décimo, ou nem aparecer na lista, se eu não tiver um disco novo no mercado ou se o disco for mal promovido.?

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