Fernanda dá ritmo na trilha de Cabra-Cega

São Paulo – Fernanda Porto tinha material de sobra para trabalhar na trilha sonora de Cabra-Cega. A época em que se passa o filme – a do regime militar – é também a das grandes músicas, daquelas canções memoráveis que provocam arrepios até em quem não vivenciou os anos de chumbo.

Mas há de se dizer que é difícil escolher a música para todas aquelas cenas certas do filme de Toni Venturi. E que é difícil musicar a ditadura e a resistência a ela sem cair no óbvio.

Quando foi convidada para trabalhar no filme, Fernanda fez um levantamento dos maiores hits do período de 1965 a 1971 – eram cerca de 200 músicas. Ficaram 14 – 7 canções de época e 7 temas originais. ?Eu quis fugir das cordas, dos violinos, e da música de orquestra, que é usada na maioria dos filmes?, explica Venturi. ?E também quis fazer uma ligação com os dias de hoje, com o contemporâneo. Por isso busquei a Fernanda, que é pop, mexe com o eletrônico e tem uma liga com a juventude?.

Fernanda já tinha o roteiro – de Di Moretti -, mas preferiu esperar para ver como as músicas ficariam coladas às cenas já gravadas. ?Algumas que já estavam pré-escolhidas não funcionaram. Quando a gente punha na cena, víamos que não tinha nada a ver?, conta Fernanda, que lança o CD dessa trilha de luxo pela gravadora Trama, uma semana após a estréia do filme nos cinemas de São Paulo, Rio e Brasília.

O disco tem participações de Chico Buarque, Toni Garrido e Ná Ozzetti. ?Foram três meses de pesquisa?, explica Venturi. ?Fizemos um primeiro filtro, com as músicas originais. Depois, Fernanda tratou de modernizá-las.?

Confirmadas desde o início, entrariam no filme três músicas de Chico Buarque -Roda Viva, Rosa dos Ventos e Construção. As três ganharam releituras de Fernanda, com sua impressão digital tão corajosa e singular. Dessas, Roda Viva tem roupagem especial, gravada em drum?n?bass numa espécie de maracatu eletrônico com participação do próprio Chico.

É uma versão que já está famosa, porque acabou entrando no último disco de Fernanda, Giramundo e tem videoclipe passando na MTV. ?Desde o começo já estava definido que Roda Viva seria a música-tema do filme?, diz Venturi. ?É uma música com significado importante para a época. As outras duas do Chico foram mais difíceis?, completa Fernanda.

Com Fernanda, Roda Viva recuperou-se como hit. Eletrônica e frenética, marca o ritmo das cenas finais do filme, imprimindo-lhes um tom de esperança alheio à provável tragédia que espera os personagens.

Também mais acelerada do que o original, Construção embala os delírios mais desesperados do Tiago de Leonardo Medeiros. Nesse contexto de fio da navalha, da explosão e confusão de emoções que acontece dentro de um apartamento, Rosa dos Ventos é cantada num feliz improviso – gravado de madrugada, displicente e delicado – para marcar o sexo dos personagens principais. Desajeitado e urgente, não fica imune aos versos de Chico e se transforma em uma das cenas mais bonitas do filme.

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