Degradações da metrópole inspiram exposição em SP

Acostumado a intervir nos subterrâneos e nas áreas degradadas da metrópole, o artista multimídia Zezão transpõe a sensação da arte de rua para a galeria Choque Cultural, em São Paulo, a partir de amanhã, com a exposição “Vari Ações Urbanas”. Obviamente esta não é a primeira vez que Zezão expõe seus trabalhos em um ambiente fechado – já participou de mostras coletivas na própria galeria e em outros locais, como o Masp, e inclusive no exterior. A diferença é que desta vez ele ocupa sozinho os três andares da galeria.

“Estamos desafiando o artista para ver como ele se coloca num espaço de uma casa inteira”, afirma Eduardo Saretta, curador da Choque Cultural. “Nosso espaço expositivo não é usual”, completa.

Ao todo, serão exibidos 20 trabalhos do artista, que na quarta-feira, a três dias da abertura, cuidava da montagem da exposição. “Toda hora fico mudando de ideia, de um dia para o outro minha cabeça já mudou, mas como tenho um deadline, tenho que executar”, comentou Zezão. Conhecido pelos grafites de tags azuladas feitos em canais de esgoto e galerias pluviais de São Paulo, o artista apresenta pinturas, fotografias, painéis de madeira e videoinstalação, inspirados por suas andanças pela cidade e produzidas especialmente para a “Vari Ações Urbanas”. “O nome da exposição surgiu de todas essas informações”, diz ele.

Os suportes para algumas das obras são pouco usuais, como o assoalho de alumínio de um ônibus, que serviu de base para uma pintura psicodélica. Há também telas com colagens de madeira e de papel, ironicamente envoltas por uma dourada moldura tradicional. O diálogo com o espaço urbano característico do trabalho de Zezão também está presente em uma videoinstalação, no subsolo da galeria. No vídeo, o artista registrou a água jorrando de um bueiro de uma rua da Mooca, na zona leste da capital, durante uma das enchentes ocorridas na cidade no início deste ano. “Tem tudo a ver com o meu trampo”, comenta.

Continuação

A exposição é uma espécie de continuação do trabalho apresentado pelo artista na mostra “De dentro para fora/De fora para dentro”, em cartaz no Masp (Museu de Arte de São Paulo) de novembro de 2009 a fevereiro passado, composta por ele e outros artistas identificados com a arte de rua e organizada em parceria com a Choque Cultural. Parte de um painel feito por Zezão que esteve no museu foi reaproveitado, assim como pedaços de madeira recolhidos das ruas também foram utilizados em peças. “Eu bato o olho em uma madeira e já vou tendo uma ideia”, conta ele. “Sempre tento desenvolver um trabalho com esse feeling da rua.”

Há ainda cinco fotografias registrando intervenções do artista em lugares como a antiga rodoviária Júlio Prestes – em fase de demolição para a futura instalação de uma escola de dança do governo estadual – e a Estação da Luz, ambas na região central. Nelas, Zezão utiliza a técnica do “light painting”, “pintando” uma imagem com o efeito criado pela luz.

Invisível

Zezão, que tem 39 anos, começou a grafitar em 1995. A manifestação artística servia como uma terapia ocupacional para ele. Procurava pintar em lugares “invisíveis” – regiões degradadas e habitadas por moradores de rua – para que pudesse ter o seu “momento introspectivo”, além de ser uma maneira de protestar contra o abandono dos lugares e das pessoas que ali transitavam. “Meu trabalho está sempre exorcizando alguma coisa, estou sempre pondo o dedo na ferida.”

E nada mais invisível do que o subterrâneo da cidade. A partir de 2000, foi nas paredes das galerias pluviais e dos canais de esgoto que ele encontrou o melhor suporte para seus grafites. Fora a satisfação com o trabalho realizado ali onde fica “tudo o que a sociedade não quer”, Zezão não esconde que há um certo incômodo com o mau cheiro e com o clima pesado daquele ambiente. “Esse lugar carrega uma energia que não é a good vibe, é a total bad trip”, reconhece.

Atualmente, para marcar os 15 anos de carreira, o artista está compilando registros fotográficos de seus trabalhos para editar um livro. Muitas dessas fotos, aliás, ajudaram a divulgar seu trabalho, no início dos anos 2000, pela internet. Foi por meio do fotolog dele (www.flickr.com/photos/zezao) que o pessoal da Choque Cultural conheceu sua obra, iniciando então o contato, que posteriormente, resultou na representação do artista pela galeria.

Vari Ações Urbanas. Galeria Choque Cultural. Rua João Moura, 997, Pinheiros. Telefone: (11) 3061-4051. www.choquecultural.com.br. De 26 de junho a 7 de agosto de 2010. Terça-feira a sábado, das 12 horas às 19 horas – abertura no sábado (26), a partir das 16 horas. Grátis/Livre.