Conto de Dalton Trevisan: ‘O Anão e a Ninfeta’

O conto ‘O Anão e a Ninfeta’ de Dalton Trevisan é belo. O velho tirou do fundo da gaveta poupança do tempo de colheita farta ou vampiro é jovem para sempre? Não interessa. Interessa o anão andando pelas ruas, tomando cuidado para não ser pisoteado, doido por mulheres, soltando cheques sem fundos, emprestando os últimos trocos da mãe para pagar a primeira vigarista que oferta prazer suculento, deitada na cama, do tamanhinho do anão em pé. Nenhuma é capaz de amar o anão. São bandidas e cachorras.

Viver é consumir paixão. Paixão tem preço. Salário do mês torrado numa tarde no Quatro Bicos. Motorista esperando no lado de fora. Don Juanito, príncipe bandalho, prefere luz negra dos inferninhos à luz do sol. Vampirinho safado, doidinho por loira pistoleira, lá vai ele sacudindo a bundinha alegre. Mãe não é otária: “Meu filho, meu filho. Seja bobo. Essa fulana não presta”. Tarado não dá bola: “Se você visse, mãe, como é bonita!”. Bonita, mas traidora.

O velho e bom Dalton Trevisan está todo neste conto. Ivan Lessa leu em outubro e bradou às margens do Tâmisa: “Não farei crítica do livro do escritor curitibano, que eu não tenho gabarito para isso (apenas emudeço de admiração)”. Assim é fácil. Eu não posso contestar o terrível Ivan: “Ele tem razão”. Mas sou como o anão. Na calçada. Correndo risco de levar chute, tomando cuidado para não ser pisoteado. Indo em frente. Olhando para cima, correndo risco de pegar torcicolo. Viver é correr riscos.

O anão evoca Curitiba que se foi, mas familiar, mãe de outra aí, noturna e fria, na rua São Francisco ou arredores da catedral que ainda emite discretas badaladas, não a dos velhos sinos. Curitiba de amantes desesperados ou furiosos em busca de afeto pago – existe outro tipo de afeto na cidade, oh senhor! Ou de carícia arrancada de meninas com mentiras, promessas de abandono de mulher e quatro filhos por uma noite no hotel com ninfeta de quinze anos. João sai do banheiro, é tão peludo que dá medo! Amor no circo dos horrores.

É um Dalton coerente com a longa obra, evocando tempo que se foi como o da boate Quatro Bicos, mas não deixando de espiar os mocós crackentos da cidade destes dias e noites com seus tipos repulsivos e indignos sequer de piedade, porque repudiam a piedade e são indiferentes aos próprios destinos. Os personagens – velhos e novos – que povoam os livros de Dalton Trevisan estão longe de invenção, não saem de mente imaginativa, são retratos garimpados nos becos da cidade.

Quem habita o lado interno das fronteiras de Curitiba, sabe: eles transitam pelas ruas com suas ânsias de viver e seus mecanismos quase sempre falhos para conseguir afeto e calor. As pequenas trapaças, pagar para ser amado, são trapaças que não os livram da armadilha que os espera, porque é a única saída que têm. Eles estão condenados a serem infelizes.