Camila Pitanga vence temores para compor personagem médica

Até hoje, Camila Pitanga fica trêmula e com as pernas bambas a cada vez que Luciana, sua personagem em “Mulheres Apaixonadas”, aparece em cena realizando algum procedimento médico. As reações, no entanto, não são fruto de sua já propalada fobia de sangue, que acabou amenizada durante os laboratórios para a composição da dedicada médica.

De fato, a atriz achou que não fosse chegar em sã consciência ao final da cirurgia que ela, José Mayer e Carolina Kasting acompanharam com o cirurgião Paulo Niemeyer, antes do início das gravações da novela. Mas resistiu bravamente. Mesmo assim, a necessidade de transmitir familiaridade e precisão com ações tão distantes de seu dia-a-dia ainda lhe tira a calma. “Fico imaginando que ela estudou anos para dizer aquilo como se fosse a coisa mais natural do mundo”, justifica, rindo de sua própria lógica.

A preocupação revela o extremo cuidado de Camila com cada detalhe das personagens que interpreta. O rigor com o próprio trabalho é manifestado ainda no estúdio, onde ela faz questão de conferir no monitor as cenas que acabou de gravar. “Até há pouco tempo, ficava mal quando não gostava de alguma coisa. Agora, só procuro ver o que funciona ou não, para tentar melhorar”, compara, tranqüila. Prova do senso crítico relativizado é que ela elege como prediletas justamente as cenas que mais lhe causam medo. “Adoro viver o cotidiano médico dela. Sinto-me constantemente testada”, revela, com uma indisfarçável pontinha de orgulho.

Aos 26 anos de idade, Camila já tem 10 de carreira na tevê e fala de trabalho como uma veterana. Por isso mesmo, destaca a personalidade de Luciana como um dos grandes atrativos do papel e chega a defini-la como sua primeira personagem verdadeiramente adulta na tevê. “Minhas outras personagens eram meninas sonhadoras, sedutoras, batalhadoras até, mas não tinham a maturidade que ela tem”, avalia, visivelmente conquistada pelas atitudes da médica.

P

– Você acha difícil lidar com a imprevisibilidade na trajetória dos personagens de novela?

R

– É natural ter um pouco de expectativa. Mas aprendi que o ator não pode criar expectativa em novela. É preciso se entregar mesmo, ir construindo a trama junto com o autor, com o público. É sempre um tiro no escuro. Nesta novela, em especial, trabalhamos desde o início com um perfil muito restrito dos personagens. Não tinha nada muito definido, mas isso é bom, é instigante. Desde o início, fui me conectando com o que vinha de informações e fui criando o perfil da Luciana, junto com o autor. Não só pelo que ele me dá diretamente, no texto, mas também pelo que vejo da novela.

P

– Quer dizer que o trabalho dos outros também influencia o perfil que você dá a ela?

R

– Não só o trabalho dos outros, mas o meu próprio. Gosto muito de ver a novela e às vezes me surpreendo com alguma coisa que faço, com uma leitura que não tinha intenção de dar e acabo criando para o público. Minha personagem não é só o que faço. É o que faço inserido num contexto de outras histórias. Quando vejo, costumo sentir se devo ir por um caminho ou por outro, se é melhor naquele momento ficar mais romântica, ou mais alegre, ou mais dura. É vendo a novela que percebo estas nuances.

P

– Mesmo na época de “Porto dos Milagres” você não teve medo da imagem da “sensual mulher brasileira”? Afinal, era até apontada como uma “nova Gabriela”…

R

– Não tive esta preocupação porque as personagens eram bem distintas e a história também. Apesar de serem dois trabalhos baseados em obras do Jorge Amado. Meu papel é ir vivendo cada personagem, a comparação é feita mesmo pelas outras pessoas. Mas, na época, nem senti esta cobrança do público. Foi mais mesmo a imprensa, que ficava tecendo paralelos. Não sinto que o público tenha esta expectativa comigo. Pode ter saudade de um personagem que é muito querido, mas não necessariamente relacionando esta imagem a mim. É algo que acontece modo geral com um personagem marcante.

P

– Como você avalia a participação do negro na teledramaturgia?

R

– Ainda há muito a se conquistar. Não existe uma visibilidade equilibrada com o que o negro representa na história do Brasil, nem com o que ele é hoje em termos de participação social. Ainda não há equilíbrio, mas acho que há espaços se abrindo. É uma questão na qual ainda estamos caminhando.

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