Batman é um caso de divã?

Você não acha que está na hora de o Homem-Morcego consultar um analista?

Segundo Harvey Greenberg, professor de psiquiatria do Albert Einstein College of Medicine de Nova York, sim. Não só Greenberg, como inúmeros outros psicólogos e psiquiatras consultados, já no final da década de 80 do século passado, acham que Bruce Wayne é uma pessoa seriamente perturbada, que necessita de um bom tratamento. Todos entendem que “essa necessidade obsessiva de se trajar como um morcego e ir às vias de fato com todos aqueles que ele considera uma ameaça à sociedade” não é uma atitude normal.

? Batman sempre foi uma figura sombria e atormentada, um verdadeiro bagaço ? avalia Harvey Greenberg, emendando: “Fica mais do que evidente que esse pobre sujeito está revivendo a morte catastrófica de seus pais”.

Em entrevista a Mike Barlow, do Stanford Advocate, reproduzida no Brasil pelo Jornal da Tarde, de São Paulo, Greenberg afirma que Batman é um cara totalmente reprimido, “que se preocupa em ser completamente bom e se recusa, a todo custo, tomar conhecimento da sua própria agressividade”.

Diz a lenda que, quando menino, Wayne assistiu ao brutal e frio assassinato de seus pais. Quando se tornou adolescente, jurou dedicar toda a sua vida no combate ao crime. Adulto, cumpriu a promessa.

? Ele é um sublimador freudiano completo ? diagnostica Greenberg. “Acho que ele é uma dessas pessoas decididamente receosas de tudo em seu subconsciente, que tem muito de sombrio. E por isso, não resta dúvida que se candidata ao divã de um analista.”

Já o professor de psicologia da Universidade Estadual da Califórnia, em Los Angeles, Stuart Fischoff, vê semelhanças entre a sina do Homem-Morcego e a daquelas pessoas que sofrem de distúrbios mentais, de personalidade múltipla.

De acordo com Fischoff, há muitos exemplos na vida real de comportamentos bizarros como os de Batman. E exemplifica: “Certas pessoas, falando ao telefone, comportam-se de um modo bem diverso do que adotariam se estivessem falando frente a frente. O anonimato libera as pessoas para exprimirem coisas que de outra forma relutariam em manifestar”. No caso do herói encapuzado, “a máscara seria a liberdade de expressão, como o álcool é para determinadas pessoas”.

Contudo, o dr. Fischoff não vê por que tentar modificar o Batman. “Se ele se sente feliz fazendo o que faz, e enquanto a atitude dele não se mostrar autodestrutiva, é melhor deixar as coisas como estão ? conclui.

Por sua vez, Simon Epstein, psiquiatra em Stanford, Connecticut, entende que, na verdade, há mais de um pequeno Batman em cada um de nós. “Afinal” ? teoriza ?, “a diferença que há entre um menino e um homem está na diferença do preço de seus brinquedos.”

Bob Kane acha que não. Claro. Ele é o pai do Morcegão

Quando garoto, de origem humilde, Bob Kane fazia grafites de giz nos muros da zona pobre de Nova York, onde nasceu. Em 1966 deixou de desenhar, mas não tirou os olhos do “filho” favorito. Mesmo à distância, acompanhou a trajetória do Homem-Morcego, já então através dos diversos argumentistas e desenhistas que o sucederam.

Em entrevista a Françoise Forestier, do parisiense L?Express, Bob Kane revelou que criou o personagem em 1939 e jamais deixou de amá-lo, mesmo depois de haver se afastado dele.

? Batman nasceu no cinema. Quando eu era menino, sempre que tinha 15 centavos no bolso eu ia até o cinema da esquina, o Bijou. Adorava os folhetins mudos, cada episódio terminando com o herói suspenso pela ponta dos dedos a beira de um penhasco. Um dos meus favoritos era Douglas Fairbanks. Em Zorro, ele trocava de roupa à noite, aparecia com uma capa e fazia justiça.

Os quadrinhos entraram na vida do pequeno Robert através de seu pai, que era impressor no Daily News e sempre levava o jornal para casa. Bob passou a copiar Flash Gordon, Tarzan, Mutt & Jeff. Rabiscava sem parar nos seus cadernos escolares. Ao invés de brincar na rua com a molecada, preferia refugiar-se em casa com um lápis de cor na mão.

Como a vida era difícil, aos 13 anos percorria as mercearias, padarias e restaurantes do bairro tentando vender pequenos desenhos humorísticos. O pai via o esforço do menino com simpatia, embora Bob reconheça que “querer ser cartunista nos anos 30 era tão apreciado quanto se tornar um gângster”.

? Quando eu tinha 16 anos, fui contratado pelos estúdios Fleisher para colorir os desenhos de Betty Boop e Popeye. Era a época em que surgiam as primeiras revistas em quadrinhos, entre as quais Famous Comics.

Algum tempo depois, Bob resolveu fazer uma visita a Will Eisner, o criador de Spirit, do qual ele fora colega na escola. Conta:

? Eu pensava comigo mesmo: se Siegel e Schuster, os inventores de Superman, ganhavam 800 dólares por semana cada um, eu poderia fazer melhor. Conversei com o editor de Eisner e me fechei em casa. Procurei uma idéia… O caderno de esboços de Leonardo da Vinci, com máquinas voadoras e morcegos, ficou na minha memória. Aí eu rabisquei um personagem com uma roupa cinza e asas articuladas. Chamei-o de Birdman. Depois, lembrei-me de um filme, The Bat…

Prossegue:

? Na época, Bill Finger era vendedor de sapatos. Nós nos encontrávamos num boteco localizado na antiga casa de Edgard Allan Poe, minúscula. Os quartos eram tão pequenos que foi preciso sair dali para trocarmos idéias… Resumindo, fiz um esboço do novo herói, Bill sugeriu modificações, como o capuz até o nariz, e fomos em frente. Seis páginas. Bill era formidável. Pena que, por muito tempo, os roteiristas das histórias em quadrinhos não eram nem mencionados. Hoje, é diferente: os créditos dão os nomes até do colorista, do impressor e seus primos. Bill Finger, que morreu em 1974, foi criador desconhecido de Batman. Ele tinha idéias surpreendentes. Seu truque consistia em tomar um acessório qualquer, um guarda-chuva, por exemplo, e aumentá-lo. Batman lutava contra o Coringa ao redor de um guarda-chuva gigante, gângsters eram atingidos por balas saídas de guarda-chuvas, etc.

Bob Kane confessou que, a princípio, queria apenas ganhar alguns trocados. Mas, aos poucos, foi se entusiasmando. Revela:

? Em 1940, eu acrescentei o Robin, inspirado em Robin Hood. Os jovens leitores logo se identificaram com o jovem herói: eles não tinham mais que esperar para crescer! E eu, do dia para a noite, pude comprar o meu primeiro automóvel, isto já em 1941.

Era um Chrysler New Yorker. Quase um batmóvel.

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