As luzes de vertigo

Ele lembrou-se do que falou Madeleine em Vértigo (Um corpo que cai), que ela entrava no seu sonho num corredor de espelhos e, quando chegava ao fim do corredor, ela morria. Isto na seqüência marítima do filme, coroada com o famoso beijo de Kim Novak e James Stewart, num explodir das ondas do mar. Talvez esta seqüência e a logo anterior, quando Madeleine aponta a mão para uma árvore e diz ?aqui nasci aqui eu morri, você nem notou?, são das mais belas do cinema.

 Ao fundo da cena, aquelas gigantescas sequóias que parecem uma enorme teia-de-aranha cósmica. Mas a mais bela seqüência de Vértigo, é quando Scottie (Stewart) segue Madeleine num beco sem saída escuro e, ao abrir a porta, a encontra cercada das mais lindas flores do mundo, num esplendor de cores. Mas talvez a mais instigante cena de Vértigo seja a do cemitério: Madeleine nas brumas, perdida em contemplação, numa atmosfera de sonho.

Ou então a seqüência em que ela se aproxima da gigantesca ponte vermelha de São Francisco, a Golden Gate, e se atira no mar. Madeleine é vista de longe, com sua echarpe esvoacante ao vento do crepúsculo. Ou talvez a seqüência em que Madeleine está diante do quadro de Carlota e a câmara se aproxima de seu coque, subindo logo em seguida para o coque de Carlota Valdez. Neste momento, o espectador tem uma espécie de satori búdico. Mas a mais extraordinariamente bela seqüência de Vértigo é quando Madeleine retorna das cinzas, como uma fênix-pássaro-élan-fosforescência. O beijo que se segue é uma das mais belas seqüências do cinema, com James Stewart completamente tomado pela paixão por Kim Novak. Feito em 1958, este filme continua sendo o melhor de Hitchkcock e um dos melhores do cinema ao lado de 2001, de Kubrick, Teorema, de Pasolini e Persona, de Bergam, além de logicamente Hiroshima Mon Amour, de Resnais. Estes filmes são como lâmpadas eletrônicas, a brilhar eternamente na cabeça do espectador, pelo seu caráter etéreo e sublime, algo como aquele início onírico de Bela da Tarde, de Buñuel. 

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