Academia divulga os melhores filmes de 2003

Pelo menos no cinema nacional, o gosto do público coincidiu com a crítica e os profissionais do setor. Dos três longas com mais indicações para o prêmio da Academia Brasileira de Cinema (ABC), a ser entregue no próximo dia 8, Carandiru e Lisbela e o Prisioneiro ultrapassaram de longe um milhão de espectadores. O terceiro, Amarelo Manga, ficou bem atrás, 140 mil pessoas o viram, mas a cifra é expressiva diante da modéstia de seu lançamento, oito cópias, contra algumas dezenas dos outros dois. Carandiru teve 14 das 16 indicações para longas nacionais. Lisbela e Amarelo, 13 cada um. Eles foram escolhidos por 130 votantes, entre os 27 títulos lançados em 2003.

Os indicados foram conhecidos ontem numa entrevista coletiva em que se anunciou também o patrocínio da empresa de aviação TAM, R$ 1,6 milhão, sem recurso das leis de incentivo, para as edições até 2007. “Com isso, o nome muda para Grande Prêmio TAM de Cinema Brasileiro e poderemos adiantar sua entrega, para abril ou maio, o que beneficia a carreira comercial dos filmes”, comemorou o presidente da Academia, Luiz Fernando Viana. “A coincidência das indicações com a boa bilheteria não poderia ser mais feliz, pois nosso esforço é para que os filmes sejam ótimos e vistos pelo maior número de pessoas possível.”

Este ano o ator e diretor Paulo José será um dos homenageados e serão lembrados, também, filmes seminais que completam 30 anos, entre eles Macunaíma, Deus e o Diabo na Terra do Sol e O Desafio. O diretor da entrega, Ivan Sugahara não adiantou mais, “para não estragar a surpresa da festa”. No ano passado, na homenagem ao diretor Carlos Manga e ao ator José Lewgoy, ele foi feliz ao remontar cenas das chanchadas que os dois fizeram juntos ou separadamente nos anos 40 e 50.

Além de chamar a atenção para a produção nacional, o prêmio da ABC reúne profissionais da área para trocar experiências. A coletiva de hoje foi um exemplo. O diretor de Amarelo Manga, Cláudio Assis, apareceu por lá, surpreso com seu bom desempenho num certame do qual ele nem sabia. Mas já fez contato com o vice-presidente de marketing da TAM, Wagner Ferreira, para apoio a seu próximo longa, Baixios das Bestas, em fase de roteiro. Bateu na porta certa, pois a empresa, além de financiar o prêmio, entrou com verba na produção de Carandiru, A Taça do Mundo É Nossa e O Redentor e quer ampliar sua participação no cinema nacional.

Veneza vê um festival americanizado

Steven Spielberg acha que o mundo anda complicado e violento demais, por isso são necessários filmes amenos, que possam trazer tranqüilidade e fazer as pessoas esquecerem do seu cotidiano. Justificando assim o escapismo tático do cinema, o diretor apresentou seu novo filme, O Terminal, que estréia dia 10 no Brasil. O longa-metragem abriu, com pompa e circunstância, mas fora de concurso, o 61.º Festival de Cinema de Veneza.

No Terminal, o americaníssimo Hanks faz, pela primeira vez, o papel de um não-americano. Ele é Viktor Navorsky, que chega a Nova York vindo de algum país imaginário do leste europeu. Durante a viagem, uma revolução estourou, tropas rebeldes tomaram o poder e os Estados Unidos não reconhecem o novo governo. Para todos os efeitos, seu país não existe mais e o passaporte que tem em mãos virou papel colorido, assim como seu dinheiro. Navorsky não pode entrar em Nova York e nem ser mandado de volta. Passa a viver no terminal de trânsito de passageiros. Dias, semanas, meses. A história, Spielberg contou, é baseada no caso verdadeiro do iraniano Merham Nasseri que viveu durante anos no Aeroporto Charles De Gaulle em Paris. Como não podia voltar e a França não lhe dava visto, passou a morar no aeroporto. Algo que parece saído da pena de Franz Kafka.

Enfim, a idéia de Spielberg é que um aeroporto moderno pode ser visto como um rico microcosmo que abriga gente de toda a espécie. Pessoas generosas, autoritárias, aproveitadores, mulheres carentes e vai por aí. No todo, o filme é interessante, dando-se o desconto do patriotismo subliminar (América, terra da tolerância, etc.) e a ausência absoluta de qualquer senso crítico em relação ao país e ao sistema de vida. Spielberg é um Frank Capra moderno.

A coletiva foi badaladíssima. Meia hora antes não havia mais lugar e quem chegava tinha de trabalhar em pé, sob calor africano. Spielberg e Hanks responderam de forma concisa e gentil às perguntas, exceto uma, de um jornalista chileno, que perguntou se o cineasta gostaria de dirigir um filme chamado O Resgate do Soldado Bush. Faz alguns anos, Spielberg abriu Veneza com seu patriótico O Resgate do Soldado Ryan, aliás estrelado pelo mesmo Tom Hanks. Responderam, mas pouco acrescentaram à compreensão do filme.

Em Veneza, tudo respira esse desejo de charme, uma vez que os festivais de cinema, na era da globalização, estão se tornando cada vez mais pretextos para a realização de bons negócios. A cada ano, nota-se mais a presença de empresas – de moda, televisão, telefonia celular, o que se quiser – em torno do núcleo do festival.

Voltar ao topo