A hora da renovação

São Paulo

– Com previsão de muito frio, o que faz a delícia dos cinéfilos gourmets – uma vez que o Festival de Gramado não é a mesma coisa sem fondue e vinho -, começou ontem à noite na cidade serrana do Rio Grande do Sul mais uma edição da mostra que há mais de 30 anos distribui os Troféus Kikitos. Iniciado como Festival do Cinema Brasileiro, Gramado mudou o perfil no começo de 1990, quando a produção caiu a (quase) zero, como conseqüência do desmantelamento da cultura do País pelo então presidente, Fernando Collor de Mello. Gramado abriu-se, então, para a produção latina e virou um Festival de Cinema Brasileiro e Latino, beneficiando-se da proximidade de Porto Alegre, verdadeira capital do Mercado Comum do Sul (Mercosul).

Desta vez, Gramado quase conseguiu realizar o sonho de todos os organizadores de festivais. Uma das dificuldades que se verificam nesses eventos que pipocam pelo Brasil inteiro é a repetição de títulos. Gramado-2003 exibirá uma seleção quase totalmente inédita, entre os longas de ficção. Há só uma exceção para confirmar a regra. Dos cinco longas brasileiros, só um foi exibido, fora de concurso, na Mostra PE de Audiovisual – Festival do Recife: Apolônio Brasil, Campeão da Alegria, de Hugo Carvana. Os quatro restantes incluem Noite de São João, segundo longa de Sérgio Silva, diretor de Anahy de las Missiones, e três obras de diretores iniciantes – Dom, de Moacir Góes, o conhecido diretor de teatro, que faz a estréia no cinema, De Passagem, de Ricardo Elias, e O Preço da Paz, dos paranaenses Paulo Morelli e Maurício Appel.

Gramado faz assim uma aposta no novo, selecionando três obras de diretores principiantes entre as cinco que concorrerão aos Kikitos para os melhores do cinema brasileiro. Os cinco latinos da competição são: Corazón de Fuego, do Uruguai; Lugares Comunes, da Argentina; Cuentos de Hadas para Ninar Cocodrillos, do México, A Selva, de Portugal; e Los Lunes al Sol, da Espanha.

Este último foi o filme que os espanhóis indicaram para concorrer ao Oscar deste ano. Los Lunes al Sol não foi selecionado pela Academia de Hollywood, mas causou sensação por desbancar uma indicação que parecia certa -a de Fale com Ela, de Pedro Almodóvar. Pedrito terminou concorrendo nas categorias de melhor diretor e roteiro original, indicado pela academia.

Documentários

Desde 2002, os documentários concorrem numa categoria à parte. Aqui, inverte-se o que ocorre nas obras de ficção. Paulinho da Viola, de Izabel Jaguaribe, está em cartaz nos cinemas de São Paulo, O Prisioneiro da Grade de Ferro, de Paulo Sacramento, venceu as etapas nacional e internacional do É Tudo Verdade, Festival Internacional de Documentários de São Paulo, em abril, e integra a seleção oficial do Festival de Veneza, que começa ainda este mês. À Margem da Imagem, de Evaldo Mocarzel, também integrou outras mostras e o único totalmente inédito é, assim, Recife/Sevilha – João Cabral de Melo Neto, de Bebeto Abrantes. Todos, de qualquer maneira, são obras de diretores principiantes, o que reforça a idéia de que Gramado, este ano, resolveu investir na renovação de talentos.

Maratona

Além dos 14 longas de ficção e documentários, outros 26 filmes, de curta e média-metragem, também concorrem aos Kikitos, o que faz com que, nas cinco noites de competição – até sexta, pois o festival termina no sábado -, o público terá de acompanhar uma verdadeira maratona no Palácio dos Festivais, o Cine Embaixador. E não é tudo. Quatro longas brasileiros serão exibidos, fora de concurso, na seção Première Glauber. São o decepcionante Concerto Campestre, em que Henrique Freitas Lima adaptou do livro de Luiz Antônio Assis Brasil; o simpático Celeste & Estrela, de Betse de Paula; e o filme que é, simplesmente, o melhor e mais rico da safra recente da produção brasileira, Narradores de Javé, de Eliane Caffé.

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