Jihad conquista seu 1.º WQS

O paranaense Jihad Kohdr, 20 anos, foi o grande campeão do maior campeonato de surfe já realizado no Rio Grande do Sul. Um público estimado em mais de 15 mil pessoas enfrentou o vento sul para acompanhar as baterias decisivas no último dia do Reef Classic 2004 em Torres. Os gaúchos Rodrigo Dornelles e Daison Pereira foram barrados nas semifinais, quando o sul-africano Greg Emslie tirou a maior nota – 9,63 – do campeonato e quebrou o recorde que era do próprio campeão. Na grande final, ele liderou boa parte da bateria, mas Jihad surfou a melhor onda para conquistar o seu primeiro título no circuito mundial.

Emslie terminou em segundo lugar, com o paulista Renato Galvão ficando em terceiro e o bicampeão brasileiro Leonardo Neves terminando com a quarta colocação, entre os 136 surfistas de onze paises que participaram da terceira etapa do World Qualifying Series (WQS).

O próximo confronto será no Havaí, onde estarão em jogo os mesmos US$ 75 mil e 1.500 pontos oferecidos nas duas provas seguidas também com nível 4 estrelas realizadas em Fernando de Noronha (PE) e em Torres (RS).

“Poxa, não estou nem acreditando, porque a bateria foi muito difícil. As ondas deram uma baixada, o vento está muito forte e a correnteza estava casca-grossa, dificultando bastante o posicionamento dentro da água. Mas, graças a Deus consegui achar uma onda boa (nota 7,77) que me deu a vitória. Estou muito feliz”, falou Jihad Kohdr, depois de ser carregado nos ombros pela torcida. O título do Reef Classic 2004 lhe rendeu um prêmio de US$ 10 mil e 1.500 pontos que o levaram da qüinquagésima para a terceira posição no ranking do WQS, atrás apenas do campeão e vice da primeira prova da “perna brasileira” de verão em Fernando de Noronha, Warwick Wright (AFR) e Marcelo Nunes (RN), respectivamente.

“Só tenho que agradecer aos meus amigos e a esse público maravilhoso que lotou a praia todos os dias e estava torcendo por mim na final. É difícil de acreditar que com tanto surfista bom competindo eu tenha sido o campeão. Eu estava muito confiante nesse campeonato, porque sempre que eu venho aqui para Torres eu consigo fazer boas apresentações e agora chegou a minha hora de faturar minha primeira vitória no circuito mundial”, contou Jihad, que hoje está embarcando para disputar a quarta etapa do WQS nas poderosas ondas de Banzai Pipeline, entre os dias 17 de fevereiro a 1 de março, no Havaí.

Com a vitória no Reef, Jihad Kohdr impediu que os títulos das duas primeiras etapas importantes do calendário mundial fossem para a África do Sul. O jovem Warwick Wright derrotou três brasileiros para ganhar o Hang Loose Pro Contest em Fernando de Noronha (PE) e o feito parecia que iria se repetir em Torres, pois Greg Emslie liderou boa parte da decisão. “Ele surfou muito bem durante todo o campeonato e mereceu vencer. No ano passado eu quase venci o WQS lá de Noronha e a vitória também escapou aqui, mas estou muito feliz com o vice-campeonato”, reconheceu Greg Emslie, que levou US$ 5 mil e 1.290 pontos, passando para o quarto lugar no WQS.

Os outros dois finalistas também lamentaram a falta de boas ondas, pois o vento sul estragou a formação das séries de meio metro de altura da Praia dos Molhes no último dia do campeonaso. O terceiro colocado Renato Galvão já tinha sentido o gosto da vitória em Torres, pois foi o campeão da etapa do SuperSurf realizada na Prainha em 2002, e embolsou US$ 3 mil e 1.095 pontos.

O Reef Classic contou com o patrocínio da Reef, Prefeitura de Torres e governo do Rio Grande do Sul.

O árabe que “dominou” o mar

Há mil anos estava escrito que um descendente árabe iria vencer o mar. Depois de 135 surfistas provenientes de 11 países, dezenas de baterias eliminatórias, modificações constantes na ondulação, a Praia dos Molhes em Torres e as mais de 5 mil pessoas presentes se renderam ao talento, técnica e velocidade do surfista paranaense Jihad Kohdr, que se tornou o novo campeão do Reef Classic de surfe, uma das etapas brasileiras do WQS.

O garoto foi simplesmente brilhante durante os 4 dias de disputa. No sábado, ele disputou duas difíceis baterias de 25 minutos cada, sendo que na primeira ele obteve a segunda melhor nota do campeonato, 9,57, e na combinação – numa bateria contam as duas melhores ondas surfadas -, Jihad obteve a melhor média do evento, 18,57, um resultado excepcional.

Campeonatos, sejam eles de qualquer natureza, sempre têm lógica. Quase sempre vence o melhor, aquela equipe mais bem treinada, com melhor ataque e defesa, goleiro menos vazado, artilheiro, etc. Em esportes individuais a situação é a mesma, Greg Emslie, o sul-africano que ousou desafiar Jihad na bateria final, fez a maior nota do campeonato na manhã de ontem. O paranaense estava com a melhor nota até então. De qualquer maneira, mesmo num mar mexido, o vento sul baixou em terras gaúchas durante a noite anterior, o garoto de 20 anos Jihad Kohdr soube trabalhar as ondas com habilidade e além de oferecer um espetáculo ao público que torcia por ele -, tinha consciência para escolher a onda certa e manobrar a mesma para obter boas notas dos juízes.

Jihad utilizou uma tática diferente na semifinal, quando foi segundo colocado em sua bateria, e na final de domingo. “Esperei as boas ondas com paciência. Na semifinal eu estava em quarto lugar, peguei uma boa onda, fui para terceiro e no final da bateria, uma ótima onda me deu o segundo lugar que valeu a classificação para a finalissima”, disse.

A tática quase matou do coração o seu amigo, técnico e manager, Rodrigo Baptista, que disse “a gente tinha que ir bem neste campeonato, pois precisávamos da grana, afinal estamos sem patrocínio”, contou. Digamos quase sem patrocínio. A marca de surfwear Quicksilver brasileira patrocinava o garoto. Mas como eles decidiram encerrar o negócio no País, Jihad ficou sem patrocínio temporariamente. Rodrigo já entrou em contato com a poderosa Quicksilver australiana, que deve assumir a operação Brasil em meados deste ano, e existe um compromisso que essa empresa vai adotar e patrocinar o surfista paranaense.

Na bateria final, Jihad novamente começou mal. Ficou em quarto lugar por um bom período. Aos poucos ele se encontrou no mar irregular, pegou uma onda mediana, depois uma boa e, em seguida passou para segundo lugar. Depois dessa onda, ao invés de voltar para o pico a uns 50 metros da praia, direto pela água, Jihad resolveu sair do mar, andar pela praia ao lado da torcida e retornar por outro caminho. “Nesse momento eu senti o calor e carinho da torcida, fiquei emocionado e voltei com tudo”, disse.

Poucos minutos depois, Jihad surfou a melhor onda da final, levantou a torcida, e passou para primeiro lugar, derrubando o experiente sul-africano que sempre surfa bem em campeonatos de ondas pequenas.

Os últimos 15 minutos foram de tensão. Emslie, em 2.º, precisava pegar uma onda que pontuasse 6,98 para ultrapassar Jihad. Não conseguiu por 14 minutos e 50 segundos. Nos últimos instantes ele surfou uma boa onda, mas obteve apenas a nota 6,20. Foram momentos de nervosismo para Jihad e Rodrigo, abraçados junto ao palanque, esperando o resultado dos juízes. Quando o locutor oficial gritou que o gringo não havia obtido a virada, a explosão de alegria foi geral.

“Agradeço a minha família e a Deus. Sou muito emotivo, mas acho que treinei muito e fui bem nas duas baterias de hoje”, disse Jihad, que é muçulmano, bom menino, uma carreira cheia de expectativas pela frente.

Sim, Jihad Kohdr, de Matinhos, Paraná, é o novo campeão da etapa brasileira Reef Classic de surfe. Ele ganhou U$ 10 mil, 1500 pontos e passou de 51.º lugar no ranking do circuito para a terceira posição. Mais do que isso, Jihad foi aclamado pela torcida na final, ganhou o respeito dos adversários e a simpatia da imprensa.

Sim, há mil anos estava escrito nos livros que um descendente árabe, povo acostumado com o deserto, iria domar ondas com sua prancha e vencer as águas do oceano.

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