Chega de urucubaca

Geneton Neto conta a história dos derrotados da Copa de 50

Apesar dos inúmeros meios de diversão na Granja Comary, em Teresópolis (além do habitual salão de jogos, há videogame e os inseparáveis tablets e smartphones), ainda são vistos livros por lá. Um deles é “Dossiê 50”, do jornalista Geneton Moraes Neto, da TV Globo. E o dono do livro é justamente o técnico Luiz Felipe Scolari, que recebeu um exemplar de presente de João Garcia, jornalista gaúcho e um dos mais próximos interlocutores de Felipão. A assessoria do treinador confirmou a notícia, e quem gostou foi o autor da obra. “Espero que possa servir para que aquela geração não seja tomada como derrotada, ou como sinônimo de urucubaca”, comentou Geneton, que esteve em Curitiba na sexta-feira participando do festival literário Litercultura.

O experiente jornalista, com vários livros publicados e importantes entrevistas exibidas na TV Globo e na Globo News (com ex-presidentes, generais da época da ditadura e artistas), tomou como uma jornada pessoal a redenção dos onze jogadores que estavam em campo em 16 de julho de 1950. “Tudo começou quando entrevistei Barbosa. Ele era um anônimo funcionário do parque aquático do Maracanã. Depois de falar com ele, pedi que fôssemos para o gramado do Maracanã e fizéssemos imagens dele na trave onde ele sofreu o gol de Ghiggia. Ele fechou a cara e disse: ‘Lá dentro, não’. Aquilo me marcou muito, e resolvi buscar todos os jogadores que participaram do Maracanazo”, contou Geneton Moraes Neto.

A derrota mais doída da história do Brasil teve doze protagonistas. Além de Barbosa, Augusto, Juvenal, Bauer, Danilo, Bigode, Friaça, Zizinho, Ademir, Jair e Chico, os titulares da seleção na final da Copa de 50, há Ghiggia, o homem que calou o Maracanã. Geneton também foi atrás dele, e o depoimento do uruguaio é o material extra da nova versão de “Dossiê 50”, editada pela Maquinária e que está à venda nas livrarias. “É o único documento com a palavra dos jogadores. E mostra a nossa vocação para a tragédia, essa sensação de perder tudo em cima da hora, como foi com Tancredo Neves, como foi nas Diretas Já, como foi com Ayrton Senna”, disse o jornalista.

Os relatos do livro são mais assombrosos do que as lendas que existem sobre aquela final. Bauer contou que voltou do Rio para São Paulo deitado no chão do vagão de um trem. Friaça saiu de São Januário (concentração da seleção) e foi parar em Teresópolis – e nunca soube como isso foi acontecer. Às vésperas da final, Ademir foi a um hospital apenas para que uma criança aceitasse ser operada. E Zizinho garantiu ter contatos telepáticos com o mítico capitão uruguaio Obdulio Varela. “São relatos humanos. O livro não fala tanto dos detalhes técnicos e táticos, ele retrata personagens de um dia que é lembrado até hoje, 64 anos depois”, resumiu Moraes Neto.

Para ele, o principal legado da obra será a recuperação daqueles jogadores. “Não é um time de traidores. Aquele foi o primeiro grande momento do nosso futebol. Fomos vice-campeões do mundo”, afirmou Geneton. Era o sonho daqueles jogadores, principalmente Barbosa. Pouco antes de falecer, em 2000, ele lamentou. “A pena máxima, no Brasil, é de 30 anos. Pois a minha já dura 50. Jamais fui perdoado”.

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