Entrevista exclusiva

Multicampeão, ex-médico do Atlético relata experiência na China e apoio à oposição no Furacão

No último final de semana, o Guangzhou Evergrande foi campeão chinês ao golear o GZ Zhicheng por 5×1. Pela sétima vez seguida o time faturou o principal título do país, desta vez com duas rodadas de antecedência. Uma equipe que vem se fortalecendo graças também aos brasileiros, tanto do elenco, quanto da comissão técnica.

Comissão técnica do Guangzhou é quase toda brasileira, incluindo Edilson Thiele, Carlos Pracidelli, preparador de goleiros, e Murtosa. Foto: Arquivo pessoal
Comissão técnica do Guangzhou é quase toda brasileira, incluindo Edilson Thiele, Carlos Pracidelli, preparador de goleiros, Murtosa e Paulo Turra, auxiliares. Foto: Arquivo pessoal

Comandado pelo técnico Felipão, o clube conta em campo com o meia Ricardo Goulart e os atacantes Muriqui e Alan. Fora dele, uma comissão técnica toda brasileira, com os auxiliares Murtosa, Paulo Turra (ex-treinador do Cianorte), o preparador de goleiros Carlos Pracidelli (que jogou no Atlético e trabalhou no Coritiba), o preparador físico Darlan Schneider (ex-Paraná) e o médico Edilson Thiele (que trabalhou no Atlético).

Todos homens de confiança de Luiz Felipe Scolari, que vem sendo o grande responsável por esta evolução do Guangzhou, no país e no continente.

“Foi uma surpresa muito grande, pois em primeiro lugar poder novamente trabalhar com o Felipão é muito especial. Eu já havia trabalhado com ele na seleção. Ele talvez seja a pessoa mais respeitada e admirada aqui na China e conquistou nada menos do que de sete campeonatos aqui ele, entre Taça da China, Champions, Copa da China e Campeonato Chinês”, afirmou Thiele, em entrevista à Tribuna.

André, filho de Edilson Thiele, fez estágio por dois anos com o pai. Chance de ficar mais perto da família. Foto: Arquivo pessoal
André, filho de Edilson Thiele, fez estágio por dois meses com o pai. Chance de ficar mais perto da família. Foto: Arquivo pessoal

E toda essa comissão brasileira vem ‘reformulando’ o futebol chinês, que nos últimos anos chamou a atenção por contratações milionárias de estrelas mundiais. Uma iniciativa de tentar fazer o país crescer no esporte e voltar a disputar uma Copa do Mundo, o que aconteceu apenas uma única vez, em 2002, quando enfrentaram justamente Felipão, que naquele ano conquistaria o penta.

Até por isso, algumas dificuldades ainda são encontradas por lá, principalmente em dois aspectos. O primeiro é na questão estrutural. A China passou a se preocupar com o futebol há pouco tempo. Inclusive, a Super Liga Chinesa foi criada apenas em 2004.

“Os clubes sao estruturados e com muito potencial, mas ainda têm que evoluir em relação à parte de prevenção, mas tudo que você pede eles procuram te dar o melhor. Claro que tem clubes que tem mais condições e outros com menos, como no Brasil”, revelou Edilson Thiele.

Medicina chinesa vem evoluindo e ensinando neste intercâmbio continental. Foto: Arquivo pessoal
Medicina chinesa vem evoluindo e ensinando neste intercâmbio continental. Foto: Arquivo pessoal

A segunda é na parte cultural. Com outros métodos de trabalho, os brasileiros no início tiveram que se adaptar, mas o intercâmbio de conhecimentos vem sendo fundamental para a melhoria do esporte local.

“No nosso clube temos três médicos chineses e dois fisioterapeutas, sendo um brasileiro. Mas com o decorrer do tempo eles vão se adaptando ao nosso jeito e nós ao deles. Nós é que somos os estranhos a eles. A maioria dos jogadores chineses amam fazer massagem e acupuntura, então nós precisamos nos adaptar a tudo isto. Introduzimos alguns conceitos e nos adaptamos aos existentes. Assim, levamos com harmonia”, disse o médico brasileiro.

“Nós fizemos um relatório, onde colocamos todas as lesões ocorridas durante o ano, bem como o tempo de recuperação de cada um, baseados nos critérios da FIFA e isto se tornou um modelo que será mantido aqui. Em relação à medicina chinesa, que é milenar, nós temos que ter a mente aberta para fatos que por vezes ignoramos, até por falta de conhecimento e pensar em utilizar no Brasil, sem dúvida”, completou ele.

Situações que estão se refletindo nas atuações. O Guangzhou perdeu apenas quatro jogos no Campeonato Chinês e vem trazendo resultados para todo o país, esportivamente, uma vez que é a base da seleção da China, e financeiramente, já que a venda do volante Paulinho, para o Barcelona, por R$ 151 milhões, é a maior transferência da história do país.

“O diferencial do nosso time é a qualidade dos jogadores chineses. Temos oito jogadores da seleção chinesa. Isto faz nosso time forte. Além disso, temos o Ricardo Goulart, que não entendi até agora, como torcedor, como não foi chamado para a seleção, pois está jogando muito”, apontou Thiele.

Lealdade a Felipão

Especialista em ortopedia e joelho, Thiele tem longa experiência com o futebol. Começou no Atlético em 1990 e de lá pra cá praticamente permaneceu no esporte. Teve diversas passagens pelo Furacão, seleção brasileira e até no vôlei, onde teve a oportunidade de trabalhar com o técnico Bernardinho, no extinto time do Rexona, em Curitiba.

Edilson Thiele virou braço direito de Felipão desde os tempos de seleção brasileira. Foto: Arquivo pessoal
Edilson Thiele virou braço direito de Felipão desde os tempos de seleção brasileira. Foto: Arquivo pessoal

Um técnico que se assemelha ao jeitão de Felipão, que, inclusive, virou uma grande referência e amigo do médico. Foi ele quem levou o ex-coordenador do departamento médico do Atlético primeiro para a seleção brasileira e agora para a China. Murtosa sempre foi visto como o fiel escudeiro de Scolari, mas Edilson Thiele também virou este homem de confiança do treinador. Tanto que a sequência na Ásia depende exclusivamente da decisão do técnico.

“Eu só fico aqui se for para trabalhar com ele, não só pela lealdade, mas também por consideração. Acho que ele ficará mais um ano aqui, mas nestes próximos dias saberemos. Você não tem noção como ele é respeitado e idolatrado aqui. Onde você vai, seja em restaurante, aeroporto, parque, todos pedem uma foto. Eu pude trabalhar com o Bernardinho no Rexona e na seleção de vôlei e eles têm muitas coisas parecidas, são bravos, mas com coração enorme”, revelou ele, indo contra as informações de que Felipão encerraria sua passagem de dois anos no Guangzhou. Inclusive, o carinho por lá, ao contrário do massacre no Brasil por conta do 7×1 para a Alemanha na Copa do Mundo de 2014 pesaria nessa decisão.

Veja o vídeo:

Relação com o Atlético

Uma sequência de mais uma temporada na China deixaria Edilson Thiele um pouco mais distante do Furacão, seu clube do coração e que, mesmo de longe, apoia a oposição. Apesar de já ter trabalhado com Mario Celso Petraglia, atualmente presidente do Conselho Deliberativo do Rubro-Negro, inclusive em 2001, quando foram campeões brasileiros, ele está ligado a Henrique Gaede, que foi candidato a presidente nas eleições de 2015 pela chapa na qual estava Thiele.

“Acompanho tudo mesmo de longe. Eu participei ativamente da última eleição como oposição, pois na verdade acho que a continuidade é ruim em qualquer seguimento, respeitando sempre o que foi feito por todos que passaram, os que erraram e os que acertaram, pois todos eram atleticanos. Temos que criar novas lideranças, sem desmerecer ninguém. Na verdade, eu queria de volta um Atlético único, pois hoje existe os a favor do Petraglia e os contra, embora todos sejam atleticanos. Quem acaba perdendo é o proprio clube”, revelou.

Edilson Thiele como médico do Atlético em 2009. Foto: Arquivo
Edilson Thiele como médico do Atlético em 2009. Foto: Arquivo

Nos últimos dois jogos do Atlético na Arena, a torcida optou por não entrar na Arena da Baixada e acompanhar os duelos contra Atlético-GO e Sport na praça Afonso Botelho, onde foi instalado um telão com o jogo e também onde a oposição reuniu assinatura de sócios para uma Assembleia no clube, para discutir alguns assuntos com a diretoria.

“Se está existindo este manifesto, é por algum motivo, e se está no regimento do clube, o sócio e o torcedor têm seus direitos e devem ser ouvidos, isto é uma forma democratica e justa. Creio que o Sallim (presidente) terá o bom senso, presumo, de escutar os torcedores, pois como o Atletico é um clube exclusivamente de futebol, o seu torcedor é a joia preciosa do clube e precisa ser ouvido e respeitado. Quando o movimento e tao grande como o que eu vi, em que a torcida está vendo o jogo na praça e não dentro do estádio, acho que algo tem que ser feito. Tudo dentro das normas que regem o estatuto do clube e pensando no bem do clube e dos seus associados, sem levar em conta a política”, completou ele, que em nenhum momento da entrevista escondeu o lado atleticano, mesmo estando do outro lado do mundo.