Elogio da loucura tributária

Gustavo Fruet

O Brasil vive uma crônica instabilidade em seu modelo tributário. Vive-se de susto em susto, o que impede de trabalhar com maior previsibilidade. O aumento da carga tributária das empresas prestadoras de serviços, previsto na Medida Provisória 232/04, é mais um infeliz exemplo. A proposta vem gerando protestos da oposição e até de parlamentares da base do governo.

Trata-se do aumento de 32% para 40% na base de cálculo do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido das empresas prestadoras de serviço, segmento com os mais diversos profissionais, gerando em torno de 100 mil empregos.

O presidente da República anunciou que alteraria a tabela do Imposto de Renda, corrigindo em parte o limite de isenção e as faixas de tributação dos 6 milhões de trabalhadores formais que pagam imposto, defasado em 49% desde 1996, com uma correção parcial da tabela em 2002. Mas o presidente não informou à sociedade que aumentaria o imposto de outra forma. Dá-se com uma mão e tira-se com a outra.

O governo enxertou na medida dois instrumentos: aumenta de 32% para 40% a base de cálculo do IR e da CSLL e tributa 34% de IR e CSLL sobre a variação cambial do patrimônio das empresas que têm bens investidos no exterior.

O governo argumenta que o aumento no Imposto de Renda e na Contribuição Social sobre o Lucro Líquido cobrados dos prestadores do serviço é uma forma de compensar o que deixará de ser arrecadado com a correção em 10% da tabela do Imposto de Renda das Pessoas Físicas. Porém, segundo vários estudos, a carga tributária dos prestadores de serviço sofrerá um acréscimo de R$ 2 bilhões por ano.

A MP aumenta a alíquota de retenção do Imposto de Renda e cria o Imposto de Renda e a Contribuição Social sobre a variação de investimentos no exterior, o que deve proporcionar mais R$ 1,7 bilhão/ano. Além disso, a medida institui a antecipação de impostos como PIS/Cofins da contribuição social, o que deve propiciar arrecadação adicional de mais R$ 500 milhões por ano. Segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, o governo ganhará R$ 4,2 bilhões, mais que o dobro do que deixará de arrecadar como compensação pela correção da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física.

Não se alegue que se trata de tributar só 5% da população. O princípio da isonomia e justiça social é fundamental. Na realidade, trata-se de aumentar tributo sobre setor que gera renda e emprego, em especial quando não há aumento da taxa de investimento, crescimento e de empregos.

É cômodo aumentar a carga tributária. Mas ela não pode servir como punição a quem trabalha. O caráter fiscal e arrecadatório não pode ter este sentido. E que não se confunda com sonegação, pirataria ou contrabando, que não param de crescer. No Brasil, o setor informal representa quase 39% da renda nacional bruta, acima da média mundial, que é de 32,5%. Isso engloba contratação irregular de trabalhadores, falsificação e adulteração, violação de direitos autorais, sonegação fiscal.

Não se trata de considerar só esta MP. É preciso lembrar as últimas modificações do PIS/Cofins, a guerra do Simples, a eternização da CPMF. Há medidas boas, como a desoneração da cesta básica, a correção da tabela do IR, combate à sonegação, mas lembre-se: a relação tributo/PIB no Brasil é próxima da Alemanha e Reino Unido e superior à dos EUA, somando-se à elevada burocracia, aos poucos fiscais, à corrupção. São fatores que influenciam na queda do emprego com carteira assinada e no rendimento dos sem carteira. Segundo estudo de Ricardo Paes de Barros, do Ipea, se todos os trabalhadores informais migrassem para o mercado formal, o País diminuiria os índices de pobreza e desigualdade em 3%.

Acrescente-se que as medidas enxertadas servem de compensação para a União, excluindo os estados e municípios, que também recebem parcela do IR mas não da CSLL. Ou seja, o governo federal garantiu o seu. Se não se contiver essa onda de incertezas e sustos, provoca-se um triste choque na economia. Eu respondo pelos meus votos. Do contrário, é o elogio da loucura.

Gustavo Fruet é deputado federal.