Cessação da obrigação pelo advento da maioridade

Indiscutível que, dentre os diversos temas tratados no direito de família, as demandas que discutem a obrigação alimentar são as de maior frequência nos tribunais, seja nos pleitos de fixação, majoração, redução, extinção da obrigação alimentar, ou ainda nas demandas executórias.

O assunto, em primeiro momento, aparenta ser de fácil compreensão, mas, assim mesmo, gera muitos debates e controvérsias.

Hoje trazemos a questão da cessação da obrigação pelo advento da maioridade.

ENUNCIADO: Se o alimentando já atingiu a maioridade, cessa a obrigação dos pais, decorrente do poder familiar, em lhe prestar alimentos, mas não cessa, automaticamente, a obrigação originária do vínculo de parentesco.

JUSTIFICATIVA: Conforme reza o art. 1.694 do Código Civil, a obrigação alimentar não decorre tão somente do poder familiar (que se estende até a maioridade), mas também da relação de parentesco entre as partes. Nos dias atuais, diante da formulação da sociedade moderna, mais comum se apresenta os filhos galgarem sua independência financeira e pessoal mais tardiamente do que ocorria com os jovens das décadas passadas, até porque deles é exigida a pós-graduação, o mestrado, o doutorado, de forma que a jurisprudência e doutrina têm confirmado a possibilidade da manutenção da obrigação alimentar após a maioridade, desde que o jovem ainda tenha a necessidade e não possua condições pessoas/profissionais para garantir seu próprio sustento. Claro que, neste contexto, não estando mais embasada no art. 1566, inc. IV, do Código Civil, a necessidade não é mais presumida, devendo, portanto, ser devidamente demonstrada. Além do mais, por uma questão de segurança jurídica, paz social e em atenção à entidade familiar, não se justifica o fim automático da obrigação alimentar.

(Ap. Cív. n.º 697.350-2; 680.897-9; 649.329-0; 635.609-4; 624.286-4)

 

  

DECISÃO EM DESTAQUE

 

DA (IM)POSSIBILIDADE DA COMPENSAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA

Fugindo um pouco do âmbito do direito de família propriamente dito, urge trazer à evidência o tema da (im)possibilidade da compensação dos honorários advocatícios, fixados quando da sucumbência dos litigantes.

O entendimento acerca deste assunto foi sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça (Súmula nº 306), mas ainda comporta discussão, conforme se depreende do seguinte voto vencido:

APELAÇÃO CÍVEL Nº 665.660-6, DA TERCEIRA VARA CÍVEL DA COMARCA DE PONTA GROSSA

APELANTE: S. M. DA S.

APELADA: BRASIL TELECOM S/A

DECLARAÇÃO DE VOTO DIVERGENTE

I – Com a devida vênia, discordo do entendimento da maioria, no que tange à possibilidade de compensação dos honorários, razão porque meu voto é no sentido de ser dado parcial provimento ao recurso interposto por S. M. DA S., apenas para vedar a compensação dos honorários advocatícios de sucumbência.

II – No meu entender a pretensão de compensação dos honorários advocatícios em caso de sucumbência recíproca não pode ser mantida.

Dispõe o art. 368 do Código Civil que: “Se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem.”

Dessa forma, é condição para a compensação a existência de duas pessoas que sejam ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, o que não ocorre com os honorários advocatícios. Isso em razão de o art. 23 da Lei nº 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia) dispor que:

Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor.” [grifamos]

Apesar de entender possível a compensação no caso, o Superior Tribunal de Justiça segue o entendimento de que os honorários advocatícios têm natureza alimentar e pertencem ao advogado:

“DIREITO PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. TERCEIRO PREJUDICADO. CABIMENTO, INDEPENDENTEMENTE DA EXISTÊNCIA DE RECURSO PRÓPRIO. SÚMULA 202/STJ. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. DIREITO AUTÔNOMO E DESVINCULADO DA CONDENAÇÃO PRINCIPAL. DÍVIDA DA PARTE VENCIDA FRENTE AO ADVOGADO DA PARTE VENCEDORA. FALÊNCIA. DÍVIDA DA MASSA. JUROS. INAPLICABILIDADE DO ART. 26 DO DL 7.661/45.

De acordo com a Súmula nº 202 do STJ: “a impetração de segurança por terceiro, contra ato judicial, não se condiciona à interposição de recurso”.

Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte.

Os referidos honorários constituem condenação imposta ao perdedor da ação, isto é, trata-se de dívida da parte vencida frente ao advogado da parte vencedora, totalmente desvinculada da condenação principal.

Diante disso, não pode o advogado se apropriar de valores depositados judicialmente a título de condenação principal para satisfazer crédito por ele detido frente à parte contrária, decorrente de honorários de sucumbência.

Hipótese em que, tendo a cliente direito ao recebimento de crédito decorrente de ação judicial e estando o valor da condenação sujeito a pagamento em dez parcelas, via precatório, o seu advogado reteve para si o valor integral da primeira parcela, a título de honorários advocatícios arbitrados na sentença em 10% do valor atualizado do débito.

Ainda que os honorários advocatícios tenham caráter alimentar e não devam ser parcelados, cabe ao advogado se insurgir quanto à forma de pagamento adotada pelo devedor, requerendo o desmembramento dos créditos, para que sua verba seja paga via precatório individualizado, expedido em seu favor, em parcela única.

As dívidas da massa falida não estão sujeitas à regra do art. 26 do DL nº 7.661/45.

Recurso parcialmente provido.”

(RMS 24010 / SP, da 3ª T. do STJ, Rel.ª Min.ª NANCY ANDRIGHI, in DJU de 26/09/2008)

“PROCESSO CIVIL – EXECUÇÃO FISCAL – HONORÁRIOS DE ADVOGADO – AUSÊNCIA DE CONDENAÇÃO – LEGITIMIDADE RECURSAL DOS CAUSÍDICOS – ART. 23 DA LEI N. 8.906/94.

1. O direito aos honorários de sucumbência, nos primórdios de nossa jurisprudência, pertencia à parte vencedora, que com a honorária recebida atenuava suas despesas com a contratação de advogado.

2. Houve evolução legislativa e jurisprudencial e atualmente os honorários, sejam sucumbenciais ou contratuais pertencem aos advogados, que em nome próprio podem pleitear a condenação da parte sucumbente, facultando-se à parte por eles representada, legitimidade concorrente.

3. Recurso especial provido para determinar o retorno dos autos à origem, com a continuidade do julgamento, superada a ilegitimidade recursal do patrono judicial na hipótese.

(REsp 1062091 / SP, da 2ª T. do STJ, Rel.ª Min.ª ELIANA CALMON, in DJU de 21/10/2008)

No mesmo sentido, os julgados do Supremo Tribunal Federal:

“(…) Consoante o disposto na Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, os advogados têm direito não só aos honorários convencionados como também aos fixados por arbitramento e na definição da sucumbência – artigo 22 -, sendo explícito o artigo 23 ao estabelecer que os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido a seu favor. Repito mais uma vez que os honorários advocatícios consubstanciam, para os profissionais liberais do direito, prestação alimentícia. (…)” [grifamos]

(Dec. Mono. no AI 734044 / PR, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, in DJU de 10/12/2009)

“(…) O agravo não merece acolhida. O acórdão recorrido encontra-se em harmonia com a jurisprudência da Corte no sentido de que os honorários advocatícios têm natureza alimentar. Nesse sentido, por oportuno, o RE 470.407/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, cuja ementa segue transcrita:

‘CRÉDITO DE NATUREZA ALIMENTÍCIA – ARTIGO 100 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. A definição contida no § 1-A do artigo 100 da Constituição Federal, de crédito de natureza alimentícia, não é exaustiva. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – NATUREZA – EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA. Conforme o disposto nos artigos 22 e 23 da Lei nº 8.906/94, os honorários advocatícios incluídos na condenação pertencem ao advogado, consubstanciando prestação alimentícia cuja satisfação pela Fazenda ocorre via precatório, observada ordem especial restrita aos créditos de natureza alimentícia, ficando afastado o parcelamento previsto no artigo 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, presente a Emenda Constitucional nº 30, de 2000. Precedentes: Recurso Extraordinário nº 146.318-0/SP, Segunda Turma, relator ministro Carlos Velloso, com acórdão publicado no Diário da Justiça de 4 de abril de 1997, e Recurso Extraordinário nº 170.220-6/SP, Segunda Turma, por mim relatado, com acórdão publicado no Diário da Justiça de 7 de agosto de 1998′.”

(Dec. Mono. no AI 636909 / PR, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, in DJU de 25/06/2009)

Por conta disso, é impossível a compensação no caso, tendo em vista que os honorários advocatícios de sucumbência pertencem ao advogado, o qual exerce, nesta hipótese, apenas a figura de credor.

Embora a Súmula nº 306 do Superior Tribunal de Justiça determine a compensação dos honorários advocatícios nos casos de sucumbência recíproca, diante do caráter alimentar dessa prestação, bem como do entendimento de que referida verba pertence ao advogado, não há como se autorizar a compensação. Nesse sentido, os seguintes julgados deste Tribunal de Justiça:

“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO SUMÁRIA – ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – DECLARAÇÃO DE INTERRUPÇÃO DE PRESCRIÇÃO EM DECORRÊNCIA DA FACILITAÇÃO DA DEFESA DO CONSUMIDOR – JUNTADA DE PLANILHA PORMENORIZADA – INOVAÇÃO RECURSAL – PRETENSÕES DISSOCIADAS DA MATÉRIA DISCUTIDA NOS AUTOS E DECIDIDA NA SENTENÇA – NÃO CONHECIMENTO – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – MAJORAÇÃO – DESCABIMENTO – BENEFICIÁRIO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA – CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DAS CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS E DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – POSSIBILIDADE – INTELIGÊNCIA DO ART. 12 DA LEI Nº. 1.060/50 – COMPENSAÇÃO DE HONORÁRIOS – IMPOSSIBILIDADE – NATUREZA ALIMENTAR DA VERBA DO PROFISSIONAL LIBERAL – IMPENHORABILIDADE – PRECEDENTES DO STF E DO STJ – DECISÃO REFORMADA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, PARCIALMENTE PROVIDO – POR UNANIMIDADE.”

(Ac un. n.º 15.387, da 17ª CC do TJPR, na Ap. Cív. n.º 628.638-4, de Ponta Grossa, Rel. Des. FERNANDO VIDAL DE OLIVEIRA, in DJ de 08/02/2010)

“(…) HONORÁRIOS – VALOR COMPATÍVEL – COMPENSAÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – DIREITO AUTÔNOMO DO ADVOGADO – RECURSO PROVIDO EM PARTE.

(Ac un. n.º 15.269, da 17ª CC do TJPR, na Ap. Cív. n.º 612.751-5, de Ponta Grossa, Rel. Des. PAULO ROBERTO HAPNER, in DJ de 29/01/2010)

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. SEGUNDA FASE. CONTA CORRENTE. PRAZO DECADENCIAL DO ART. 26, II, CDC. INAPLICABILIDADE. NATUREZA PESSOAL DA DEMANDA. TAXAS E TARIFAS. COBRANÇA. LEGALIDADE. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO À TAXA LEGAL. IMPOSSIBILIDADE. PARÂMETRO. TAXA MÉDIA DE MERCADO. SUCUMBÊNCIA. REDISTRIBUIÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ART. 23 DA LEI Nº 8.906/1994 (EA). COMPENSAÇÃO. VEDADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.”

(Ac un. n.º 16.597, da 14ª CC do TJPR, na Ap. Cív. n.º 618.843-2, de Campo Mourão, Rel. Des. GUIDO DÖBELI, in DJ de 04/02/2010)

“(…) HONORÁRIOS. IMPOSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO. RECURSO DO AUTOR CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO E DA RÉ CONHECIDO E DESPROVIDO. (…)”

(Ac. n.º 14.286, da 18ª CC do TJPR, na Ap. Cív. n.º 610.303-1, de Ponta Grossa, Rel. Des. CARLOS MANSUR ARIDA, in DJ de 04/02/2010)

“(…) HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS EM QUANTUM DIGNO A REMUNERAR OS SERVIÇOS PRESTADOS PELO PROCURADOR. COMPENSAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPOSSIBILIDADE. APELAÇÃO 2 CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA.”

(Ac. un. n.º 13.653, da 18ª CC do TJPR, na Ap. Cív. n.º 612.902-2, de Ponta Grossa, Rel. Des. JOSÉ CARLOS DALACQUA, in DJ de 24/11/2009)

Por esses motivos, voto pelo provimento parcial do recurso, por entender que, ainda que existente sucumbência recíproca dos litigantes, impossível se revela a compensação da verba honorária.

III – Por todo exposto, voto no sentido de DAR PARCIAL PROVIMENTO à Apelação Cível manejada por S. M. DA S., apenas para não admitir a compensação dos honorários advocatícios de sucumbência.

Curitiba, 21 de julho de 2010.

 

Vilma Régia Ramos de Rezende

DECLARAÇÃO DE VOTO

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