A multa prevista no CDC é de valor inadequado quando se trata de grandes empresas

Oscar Ivan Prux

O Código de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078/90), sem dúvida, é um instrumento moderno para reger as relações de consumo. Já completa quase duas décadas e se mantém muito atual e apropriado para essas situações tão mutantes como as que acontecem no mercado, principalmente diante do processo de globalização e da evolução tecnológica nos produtos e serviços. Desde quando foi aprovada, a referida lei recebeu apenas duas modificações. A primeira, para uma correção de erro de grafia que inexplicavelmente passou na revisão e publicação e, a segunda, para estabelecer o tamanho mínimo da letra nos contratos. Portanto, em um país que faz normas como passam os ventos, o CDC é um fenômeno de longevidade sem haver alteração substancial. E nesse sentido, vários doutrinadores insistem que a manutenção do texto como está, contribui para a previsibilidade jurídica (a população já está se acostumando a conhecer essa lei) e a estabilidade nas relações sociais. Entretanto, pensando de outra forma, já existe forte corrente que prega por reformas. Argumentam, por exemplo, que com os avanços da psicologia, as técnicas publicitárias se modificaram para alcançar o subconsciente das pessoas e influenciá-las em suas escolhas na hora de consumir, sendo que o texto do CDC não está adequado para regrar bem essas novas situações. Igualmente, que já não é mais tão atual para proteger a dignidade do consumidor contra técnicas publicitárias degradantes (exemplo: fazer promoção de uma marca ou produto através de concurso no qual quem comer mais baratas ganha o prêmio).

À parte desse debate existe um dispositivo que, indubitavelmente, merece reforma urgente. Buscando desencentivar os fornecedores em agir de forma a desrespeitar direitos dos consumidores e a puní-los quando o façam, o CDC estabeleceu sanções administrativas que podem ser aplicadas pela autoridade competente. Nesse contexto, o parágrafo único, do artigo 57, prevê evental multa aplicada ao fornecedor infrator, a qual “não pode ser superior a três milhões de vezes o valor da Unidade Fiscal de Referência (UFIR), ou índice equivalente que venha a substituí-lo”. Ou seja, a multa pode chegar ao valor máximo de pouco mais do que três milhões de reais, valor que ficou “estagnado” desde a extinção desse índice a quase uma década, sem que para esses efeitos, legalmente tenha sido estabelecido outro para substituí-lo.

A par do fato de que, na prática, raramente esse tipo de multa é objeto de aplicação, a questão está em que ela, mesmo no valor máximo em que foi previsto de forma “engessada” pelo legislador, nem sempre é suficiente para compelir certos fornecedores de grande porte a respeitarem os direitos dos consumidores. Exemplo disso acontece, por exemplo, com as operadoras de telefonia e os bancos, que em razão de movimentarem valores muito superiores a esse, não se preocupam com a possibilidade de uma eventual aplicação dessa multa. Esses fornecedores possuem milhões de reclamações e ações judiciais por desrespeito aos direitos dos consumidores de seus serviços, mas não se sentem intimidados pela referida sanção. Portanto, é momento de haver uma reformulação para alterar o mencionado dispositivo legal, vinculando o valor máximo da multa a porcentagem do capital social e valores de giro comercial dos fornecedores. Assim, além de não se fixar a lei em índices passageiros e que podem ser extintos a qualquer momento, as empresas serão estimuladas a cumprir a norma, fazendo com que as grandes sintam que não compensa desrespeitar os direitos dos consumidores e as pequenas venham a correr o risco de ficar inviabilizadas.

Independente dessa modificação legal que urge, desde agora cabe exigir que as Agências Reguladoras sejam mais rigorosas e menos magnânimas na aplicação de multas decorrentes de infrações praticadas pelos fornecedores que atuam na atividade objeto da regulação. E mais, lembrar que aos órgãos e entidades competentes, bem como aos consumidores, é facultado requerer judicialmente, via a respectiva ação individual ou coletiva, pedido de indenização em valor superior a multa prevista no CDC. Foi o que fizeram a União, o Ministério Público e os Procons que através de ação coletiva buscam na Justiça que duas operadoras de telefonia paguem uma multa de R$ 300 milhões por reiterados e sucessivos desrespeitos aos direitos dos consumidores.

É com esse conjunto de atitudes pró-ativas que se protegerá efetivamente os direitos dos consumidores e se fará com que essas relações sociais sejam mais equilibradas, harmônicas e contributivas para o bem-estar da população.

Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em direito. Coordenador do curso de Direito da Unopar em Arapongas-PR. Diretor do Brasilcon para o Paraná.