A marca do corvo

Kafka, em tcheco, significa corvo, aquela ave soturna e onírica. Ironicamente, ou não, a obra de Franz Kafka (1883-1924) é marcada pelo ambiente sombrio e opressor, polarizado pela relação difícil com o pai, um comerciante burguês de Praga, e também pela condição do povo judeu. Nascido na capital da República Tcheca, Kafka sempre escreveu em alemão, língua da nação que, durante a Segunda Guerra Mundial, exterminaria sua família, matando as suas irmãs em campos de extermínio.

Textos como A Metamorfose (1915) e O Castelo (1926) dão a síntese da obra dele, mas não são a totalidade de seus temas. Punição física e psíquica, sensação de despertencimento, burocracia e desajuste social estão entre os motes prediletos do escritor, que flutua entre o real e o sonho para criar uma atmosfera sufocante e densa.

A presença inebriante do surreal, margeando o grotesco, foi escolhida como estética para diversos desdobramentos artísticos, como os filmes Eraserhead (1977), de David Lynch, O Processo (1962), de Orson Welles, e O Castelo (1997), de Michael Hanake – os dois últimos são adaptações de suas obras.

A prosa atmosférica ainda está conscientemente (ou não) nas criações do ucraniano Bruno Schulz (1892-1942) e o romeno Max Blecher (1909-1938). E a influência de Kafka sobre escritores como Jorge Luís Borges (1899-1986) e Gabriel Garcia Márquez é inegável. Responsáveis pelo “boom latino-americano”, eles também estiveram sob a marca do corvo.