Problema social

Literalmente aplicadas, algumas disposições do Estatuto do Torcedor irão empurrar a Arena da Baixada para uma absoluta elitização. A adoção de cadeiras para numerar os lugares implicará na redução da atual capacidade de 30 mil para 18 mil pagantes. A execução do projeto de construção da área do Expoente não ampliará a área popular. É que, mesmo com eventuais alterações, o projeto programa a construção apenas de camarotes como área útil em direção ao campo. Eventualmente, cadeiras executivas. A repercussão irá bater em cheio nas camadas menos privilegiadas, porque será valorado o preço do ingresso. A conclusão decorre de uma equação lógica: quanto menos espaço para uma área de lazer onerosa, maior é o preço do ingresso. É uma falha grosseira do Estatuto. Não dispondo de normas para regular o valor de ingresso em estádios de futebol, incentiva o arbítrio dos clubes, principalmente daqueles cujo comando é insensível para os problemas do bolso e do coração do povo.

O Atlético, em tese, não teria culpa, pois deve cumprir a lei. Cada lugar numerado exigido pelo Estatuto tem que ser adaptado pelas dimensões da Fifa. Mas, também, não faz nada para minorar o problema. Ao contrário, agrava-o. Nem sempre a aplicação literal da lei concilia-se com o direito. Sob o pretexto de cumpri-la, os dirigentes não respeitam o espírito do legislador que não é o de oprimir o torcedor, mas sim de protegê-lo. No caso da Arena, se houvesse vontade de atender e respeitar o povo mudar-se-ia o projeto, ofertando-lhe mais espaços. Mas a simples proposta de setorizá-los para graduar a valoração do preço do ingresso já é uma discriminação social tratando-se de um estádio de futebol.

Em curto prazo a Arena pode se transformar em um problema social. Preservado o projeto histórico, mantida a ostensiva sofisticação do “lado do colégio”, irá criar desgraçadamente dois Atléticos: o dos ricos milionários compradores e usuários de cadeiras executivas e camarotes, e o dos pobres e aí já inclui a classe média, ficarão em casa tendo como o consolo um grito de gol pelo rádio de pilha. No máximo, um palmo de concreto atrás dos gols pago com o dinheiro desviado da compra do pão dos filhos para sustentar a paixão.

A Arena é do povo atleticano. Não tem dono. Povo no conceito mais amplo, que não aceita e abomina a diferenciação e a discriminação social.

Ouviram-se os donos de cadeiras e camarotes. Ofertaram-lhes uísque e caviar. À torcida, desprezo. Qual é a diferença entre um torcedor de arquibancada e um de cadeira ou camarote? Para o Atlético, como um valor comum, todos são iguais. Eventual diferença dá mais importância ao torcedor de arquibancada. Se a proposta futura é transparente e sem outros interesses, ouça-se, também, a torcida.