Cientistas descobrem antidepressivo natural

Essa, nem os raizeiros, reconhecidos conhecedores dos efeitos curativos das plantas, sabiam: o pau-santo pode ser usado para curar o chamado mal do século: a depressão. A descoberta foi feita por pesquisadores da Universidade Estadual de Maringá (UEM) que, há sete anos, estudam essa planta de pequeno porte, natural das regiões de cerrado.

Embora o pau-santo (Kielmeyera coriacea) já tenha sido objeto de diversos estudos científicos, tais pesquisas se restringiram à investigação das propriedades antimicrobianas e antifúngicas da planta. A pesquisa da UEM é o primeiro trabalho científico de que se tem notícia sobre os efeitos antidepressivos do pau-santo.
Para os professores Diógenes Aparício Garcia Cortez e Elisabeth Aparecida Audi, coordenadores do projeto, a razão é simples. ?Há uma tendência na área de levar para comprovação em laboratório os conhecimentos da medicina popular. Como o pau-santo não é tido como antidepressivo, é natural que as pesquisas não caminhem nesta direção?, destacam.

Pode-se dizer então que a descoberta foi um grande achado. Tudo começou em 1996 em um curso de pós-doutorado na Suíça, onde Cortez passou a pesquisar a fitoquímica do pau-santo. Sabia-se, de antemão, que a espécie apresentava xantonas, que são uma família de substâncias químicas inibidoras da enzima monoaminoxidase, produzidas em estados depressivos. Dessa forma, poderia se assemelhar a compostos antidepressivos clássicos, já existentes.

A depressão pode ser explicada por uma queda nos níveis de serotonina e noradrenalina no cérebro, neurotransmissores relacionados ao equilíbrio emocional. Dependendo da intensidade dessa diminuição, e dos tipos de neurotransmissores afetados, a doença se torna mais ou menos grave. A enzima monoaminoxidase está envolvida no metabolismo da serotonina e noradrenalina. Alguns antidepressivos provocam uma redução na atividade desta enzima, diminuindo sua interferência nos neurotransmissores.

Em todo o mundo existem pesquisadores voltados para o estudo das xantonas, exatamente pelo seu efeito. O que não se tinha idéia é que a Kielmeyera coriacea pudesse apresentar propriedades altamente ativas dessas substâncias, conforme ficou comprovado nos testes biológicos. Estudos fitoquímicos e da atividade biológica revelaram o excelente potencial da planta que, segundo os pesquisadores, tem efeitos comparáveis ao Prozac e ao Hipericum, medicamentos usados para tratar estados de depressão, sendo o primeiro de natureza sintética e o outro um fitoterápico originário de uma planta natural da Europa.

A substituição pelo pau-santo seria, segundo os pesquisadores da UEM, extremamente vantajosa. Tratando-se de uma planta nacional, o medicamento produzido a partir dela sairia mais barato do que aquele da similar européia e com uma vantagem extra: o pau-santo não apresenta o fator de hipersensibilidade que o Hipericum traz. Segundo os pesquisadores, a hipericina, encontrada no Hipericum, é a responsável pelas reações de hipersensibilidade no contato da pele com o sol. Some isso ao fato de que o cultivo e o manejo da Kielmeyera coriacea podem gerar emprego e renda para o País.

Laboratório quer explorar o pau-santo

A produção industrial do medicamento pode se concretizar a médio prazo. A convite de um dos maiores laboratórios instalados no Brasil, os pesquisadores apresentaram os resultados do trabalho. Por enquanto, ninguém adianta o nome da empresa para não atrapalhar a negociação, mas todos garantem que o interesse de ambas as partes é grande.

Vale destacar que, a partir do projeto, vários trabalhos foram publicados em revistas do meio, internacionalmente reconhecidas. As pesquisas na área da fitoquímica foram coordenadas pelo professor Cortez e os ensaios biológicos pela professora Elizabeth Audi, doutora em neuropsicofarmacologia.

Do projeto, resultou ainda um registro de patente. Os pesquisadores da UEM destacam que os sete anos de trabalho trouxeram excelentes resultados. ?Nossos estudos não se resumem aos extratos brutos da planta, pesquisamos até as substâncias químicas purificadas. Significa dizer que temos a substância responsável pela atividade já identificada e isolada?, comenta Cortez. Ele explica que foi feito todo um mapeamento da planta, registrando informações importantes como a porcentagem da substância ativa e a identificação sobre as partes da planta em que ela está presente.

Em termos de avanço de pesquisa, o próximo passo seria a síntese da substância, o que abre portas para sintetizá-la em laboratório. Para isso, é necessário realizar ensaios complementares. ?Estamos na fase de ensaios pré-clínicos, que são os ensaios com animais e, de acordo com os modelos usados, não foi encontrado nenhum efeito tóxico da planta?, explica o pesquisador. A síntese de um medicamento nem sempre é viável e depende da complexidade da substância. Mas, se o processo for possível com a Kielmeyera coriacea será um grande passo, na opinião de Cortez.

De Norte a Sul

Planta de porte médio, a Kielmeyera coriacea já foi identificada pelos pesquisadores da UEM, em diversas regiões de cerrado, de Norte a Sul do Brasil. No Paraná, a espécie foi encontrada na região de Campo Mourão e se tem notícias da sua presença próximo ao litoral do Estado.

Com os resultados obtidos, a UEM aparece, hoje, como uma referência quase nacional e mundial em pesquisa com a Kielmeyera coriacea. Os coordenadores do projeto lembram ainda que as pesquisas realizadas são, potencialmente, uma grande fonte de recursos para o Estado. ?Além disso, nossos estudos são apenas a ponta do iceberg?, disse Cortez, destacando que o trabalho possibilita novas linhas de pesquisas com outras espécies vegetais. ?É um trabalho de grande alcance.?

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