Bisturi pode curar um coração partido

Uma matéria do conceituado jornal inglês Daily Mail publicada recentemente, traz informações sobre o que seria uma tendência comportamental entre as britânicas: a realização de plásticas como forma de vingança contra os ex-maridos.

Esta nova forma de recomeçar a vida está sendo apelidada de “cirurgia de vingança”. A inglesa Lisa Hanson, por exemplo, diz que está praticamente irreconhecível depois de passar por um amargo divórcio há quatro anos.

“A cada procedimento senti minha confiança aumentar e, agora, tenho a fantasia de encontrá-lo andando pela rua e, quando me reconhecer ele será surpreendido”, prevê sorrindo.

Segundo estatísticas divulgadas no começo do ano, as mulheres  divorciadas respondem, hoje, por um quarto de todas as cirurgias plásticas realizadas no Reino Unido.

Muitas mulheres desse grupo admitem que se submetem a diversos procedimentos cirúrgicos para surpreender ou para mexer com os brios do ex-companheiro.

Muitas divorciadas tentam se vingar de ex-maridos, recorrendo às cirurgias plásticas, mas nem sempre o bisturi pode curar um coração partido.

Desejo e fantasia

Nos Estados Unidos, país onde, tradicionalmente, todas as idéias podem ser comercializadas, algumas clínicas de cirurgia plástica  já oferecem pacotes de divórcio para homens e mulheres, que  procuram os procedimentos cirúrgicos estéticos, depois de uma separação.

Apesar dos benefícios da cirurgia plástica serem inegáveis, com ou sem separação, o que os estudiosos do tema se perguntam é se é correto tirar proveito da infelicidade e da fragilidade alheias.

Não são somente as mulheres divorciadas que chegam aos consultórios de cirurgia plástica com o desejo de se “reinventar”. O executivo desempregado, a filha preterida, o adolescente com mamas aparentes, a sexagenária que acabou de ficar viúva, a modelo que não pode perder um grande trabalho no exterior, a imigrante japonesa insatisfeita com suas pálpebras e muitos outros pacientes acalentam o mesmo desejo: virar uma página da vida, transformando-se em “outra pessoa”.

Antigamente, para se reiventar ou fazer aumentar a sua autoestima, as pessoas mudavam o corte do cabelo, passavam por dietas a fim de perder peso ou renovavam as peças do guarda-roupa.

“Hoje, com as cirurgias plásticas bastante acessíveis, elas são a primeira escolha da lista de providências que a pessoa fragilizada emocionalmente dispõe para dar a “volta por cima”, após uma situação desagradável”, explica o cirurgião plástico, Ruben Penteado.

Autoestima e bem-estar

O especialista faz questão de esclarecer que a cirurgia plástica estética apresenta suas limitações. Para se obter uma mudança real na vida pessoal é preciso muito trabalho emocional.

Após uma conversa esclarecedora com o cirurgião, por exemplo, o paciente pode até chegar à conclusão que não precisa mudar nada, exteriormente. “Um bom aconselhamento deve vir antes do bisturi, pois, em muitos casos, o especialista não vê razão para a cirurgia almejada pelo paciente, e o orienta a desistir da empreitada”, destaca o médico.

Hoje, as técnicas de cirurgia plástica são alguns dos instrumentos que a sociedade moderna dispõe para buscar uma elevação na autoestima e no consequente bem-estar das pessoas, fazendo com que ela conviva melhor com sua própria imagem.

Bem diferente do início da especialidade quando não se falava em estética, bem-estar ou bele,za, pois a importância da autoestima não era tão difundida socialmente. “O discurso era reparar as deformidades”, acentua Penteado.

Mudanças sutis

A mudança exterior não é uma arma que auxilie na “vingança”. Quem nasceu com um nariz muito grande ou com a orelha acentuadamente não considera a cirurgia plástica apenas uma vontade, e sim, uma necessidade.

A cirurgia plástica também é importantíssima para as pessoas diante de algum trauma ou acidente. No entanto, diante do paciente que demonstra o desejo de se “reinventar”, o trabalho do cirurgião é o de mostrar a sutilidade do que é normal e belo. “As mudanças devem ser consideradas sutis, que não se notam, não são transformações radicais”, explica o cirurgião plástico.

Em meio a este processo de valorização social e de busca pela autoestima abalada por um casamento fracassado ou pela perda de um ente querido, ou ainda, pela falta de oportunidades profissionais, dentre muitas outras situações, o cirurgião plástico tem que estar atento aos excessos e às más indicações dos procedimentos cirúrgicos, que sempre devem ser evitados para o bem do paciente.

Hoje em dia, a propaganda cria expectativas irreais nos pacientes. A idéia de que uma cirurgia plástica pode ser rápida, simples e indolor gera muitas fantasias. Na maioria das vezes, quando é exagerada, o resultado imprevisto não é real, demonstrando apenas a manifestação de uma insatisfação pessoal.

Por isso, cabe ao especialista, ajudar a identificar e desfazer fantasias antes mesmo da realização da cirurgia, sob o risco da não realização plena do desejo do paciente, o que pode diminuir ainda mais o seu grau de autoestima.