Aplicação de células embrionárias em humanos

Foi publicado ontem o primeiro artigo científico que descreve resultados do teste de uma terapia com células-tronco embrionárias (CTEs) em humanos. Os cientistas trataram, nos Estados Unidos, duas mulheres que sofriam de cegueira. Os resultados preliminares, divulgados pelo periódico The Lancet, já animam os pesquisadores: depois de quatro meses de acompanhamento, não houve a formação de tumores, principal temor associado a esse tipo de terapia.

As duas pacientes receberam injeções em um dos olhos com cerca de 50 mil células de uma região da retina – o epitélio pigmentar, tecido escuro que serve de suporte para as outras três camadas da retina. Uma delas, de 70 anos, tinha degeneração macular seca, uma das principais causas de cegueira irreversível em pessoas da terceira idade no Brasil e no mundo. A outra mulher, de 50 anos, sofria de uma doença chamada distrofia macular de Stargardt, que afeta indivíduos mais jovens.

As células injetadas foram derivadas de uma antiga linhagem de CTEs. As pacientes receberam terapia imunossupressora leve para diminuir o risco de rejeição. De qualquer forma, o olho é considerado uma região imunoprivilegiada, pois o risco de o corpo combater o tecido transplantado é menor. As duas mulheres apresentaram melhora animadora, porém pequena.

A principal vitória dos pesquisadores foi verificar a não formação de tumores após a terapia. A aplicação direta dessas células, embora tenha grande potencial terapêutico, carrega uma série de riscos de origem biológica (como a possibilidade de se tornarem células cancerígenas, com multiplicação fora de controle) e de complicações éticas relacionadas ao uso de embriões. Os obstáculos científicos e legais são grandes no mundo todo (veja abaixo a situação do Brasil).

A melhora das pacientes, contudo, é vista com cautela e será alvo de novas investigações. Isso porque parte do sucesso pode não ter relação com as células injetadas, mas sim com a terapia imunossupressora. Uma das mulheres, por exemplo, melhorou dos dois olhos – mas só um recebeu a injeção. O principal autor do estudo, Robert Lanza, da Universidade da Califórnia, nos EUA, é também um dos donos da Advanced Cell Technology, empresa americana que pretende comercializar a terapia.

Esse é o único estudo clínico em andamento com aprovação da Food and Drug Administration (FDA), órgão de vigilância sanitária norte-americano.

Em outubro de 2010, a empresa Geron Corporation já havia começado a usar células derivadas de CTEs em pacientes com lesões na medula espinhal. Mas, em novembro do ano passado, os testes foram interrompidos sem que os primeiros resultados dos estudos fossem publicados. A Geron argumentou que “falta de dinheiro para investir” e “insegurança do mercado” foram as principais razões para o abandono das pesquisas.

A geneticista Lygia da Veiga Pereira, do Laboratório Nacional de Células-Tronco Embrionárias (Lance) da Universidade de São Paulo (USP), afirma que os autores do trabalhos quiseram tranquilizar possíveis investidores, depois da decisão da Geron. “Provavelmente, publicaram esse artigo para mostrar que as CTEs são um campo promissor e que há grupos obtendo bons resultados nessa área”, aponta Lygia.

AE

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