A depedência química e o desejo reprimido

Estudo realizado com pessoas em tratamento de dependência química por álcool e outras drogas aponta que 47% dos homens entrevistados apresenta algum tipo de disfunção sexual.

Este índice é bem maior do que o encontrado pelo Estudo da Vida Sexual do Brasileiro (EVSB), realizado em 2004, com mais de sete mil brasileiros, no qual a prevalência do problema entre o gênero masculino foi de 18,2%.

De acordo com a psiquiatra Alessandra Diehl, coordenadora do setor de dependência química da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas da Universidade Federal de São Paulo e autora da pesquisa, o número é representativo e pode sim ser confrontado com a população geral. Entre os principais problemas relatados pelos entrevistados, a ejaculação precoce lidera, atingindo 39% deles, seguido pelo desejo sexual diminuído (19%), dificuldade de ereção (12%), retardo na ejaculação (8%) e dor durante a relação sexual (4%).

A especialista explica que o tabagismo, o alcoolismo e a dependência de drogas como maconha, cocaína e crack, são importantes fatores de risco para o desenvolvimento de disfunções sexuais, principalmente disfunção erétil nos homens.

“O álcool e a nicotina, por exemplo, promovem alterações na arquitetura vascular de forma generalizada, atingindo órgãos vitais para o bom desempenho sexual”, afirma, salientando que, por seu lado, a cocaína, apesar de aumentar a libido, acaba, com seu uso crônico, fazendo o efeito contrário.

Comportamento sexual

Outras drogas de abuso, como o ecstasy, o crystal e o ácido gama-hidroxibutírico (GHB), também conhecido como “Boa noite, Cinderela”, aumentam a libido e, por esse motivo, são muito procuradas.

No entanto, a médica alerta que o uso crônico acaba por prejudicar o desejo sexual e a busca por essas drogas passa a ser mais para aliviar sintomas de abstinência do que pelo prazer propriamente dito.

Um dado que também chamou a atenção dos pesquisadores foi o comportamento sexual de risco entre os entrevistados. Além de 41% deles não usarem preservativos durante a relação sexual e 27% usarem esporadicamente, a média de parcerias sexuais relatada foi de cinco ao ano.

Quase duas vezes maior que a média recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que é de três ao ano, para se identificar um comportamento “não promíscuo”. Na população geral brasileira a média encontrada no Estudo da Vida Sexual do Brasileiro foi de 1,47 parceiras entre as mulheres; e 2,96, entre os homens.

Segundo Alessandra Diehl, um dos principais motivos da busca por novas ou várias parcerias afetivas e sexuais nesta população tem relação com as características de poliusuários de drogas e ou usuários de crack, que demonstram extrema impulsividade e pobre avaliação de riscos, com necessidade urgente de satisfação imediata.

“Uma das hipóteses também é que a grande maioria destes indivíduos apresente algum grau de lesão no lobo pré-frontal do cérebro, responsável pela capacidade de organizar e tomar decisões”, avalia.

Para a pesquisadora, o não uso do preservativo ou uso esporádico é outro comportamento que se mostra preocupante, pois temos, ao todo, 68% de pessoas que precisam de intervenção e orientação profissional para diminuir riscos.

Conhecimento escasso

Apesar de perceberem que algo “não vai bem” em sua vida sexual, apenas 12% dos usuários de drogas procuram ajuda médica e outros 12% atribuem o problema ao uso de substâncias psicoativas.

Para a psiquiatra, é primordial unir esforços para a intervenção precoce nestes indivíduos a fim de minimizar os danos. Entretanto, de acordo com ela, uma maior parcela dos serviços destinados a dependentes químicos não tem, em sua grade de intervenções terapêuticas, “a proposta de educação em saúde sexual de forma sistemática.”

O conhecimento do efeito que produzem as drogas sobre a sexualidade ainda é escasso, já que não é fácil distinguir entre as consequênc,ias das substâncias em si e os efeitos de toda a parafernália, expectativas e atribuições que as acompanham.

Na resposta sexual existem muitos aspectos implicados e não devemos separar os físicos dos restantes. A psiquiatra lembra, também, que não se pode esquecer que muitos medicamentos atuam sobre o sistema nervoso e podem afetar a resposta sexual tanto inibindo-a como ativando-a.

Perfil do comportamento sexual

* 47% relataram alguma dificuldade sexual
* Cinco parcerias sexuais é a média no último ano
* Três relações sexuais é a média por semana
* 87% tiveram atividade sexual nos últimos 12 meses
* 90% são heterossexuais
* 36% tiveram experiências homossexuais
* 15% tiveram experiências homossexuais relacionada à aquisição ou troca por droga
* 41% não usam preservativos e, 23%, usam esporadicamente
* 49% avaliam como bom o seu desempenho sexual
* 31% já tiveram alguma DST (doença sexualmente transmissível)
* 56% são solteiros

Inimigas do sexo

Maconha – No campo psicológico, a perda de noção de tempo que o usuário é acometido faz com que acredite e sinta que o seu desempenho sexual tenha sido melhor e mais prolongado, até que consolidem os resultados negativos, com a baixa no nível de testosterona e do número de espermatozóides.

Cocaína – Com o tempo, acaba com o desejo sexual nas mulheres e compromete a fase do orgasmo. Nos homens, afeta a manutenção da ereção. Pode ocorrer também um efeito contrário, com uma ereção prolongada e muito dolorosa.

Crack – É a droga que destrói com mais rapidez o usuário. Quando não repetida, acaba gerando imenso cansaço e depressão, sendo que neste último estado, nada mais importará para o seu usuário, muito menos sexo.

Ectasy – Os efeitos do seu uso contínuo ainda são desconhecidos. O perigo maior se instala quando o efeito termina, pois a temperatura corporal se eleva demasiadamente. Apesar da sensação de excitação, pode perturbar o desempenho sexual.

Álcool – Com o uso por tempo prolongado, provoca diminuição no desejo, rebaixamento do nível do hormônio testosterona e bloqueio ejacultório. Seu uso frequente pode inibir todas as fases da resposta sexual, podendo inclusive provocar impotência sexual.

Fumo – O fumante inveterado apresenta uma redução na contagem de espermatozóides, fato que pode levar à infertilidade. Estudos mostram que existem associações entre o fumo e o início precoce da menopausa, além da redução do impulso sexual.