O relógio anda mais devagar em Arraial d?Ajuda

1989. Sylvie Semon saiu de Paris, sua cidade-natal, para passar uns dias de férias no Brasil. Na bela região do extremo sul da Bahia conheceu um pequeno distrito chamado Arraial d?Ajuda. Lá foi fácil descobrir duas das características mais genuínas do País: suas belas praias e a alegria dos seus moradores. Bastou isso para a francesa escolher o local para viver para o resto da vida. Lá casou com um argentino, de história semelhante, e teve dois filhos ?baianos louros?, como ela mesmo se refere. Hoje, a moça, de olhos claros e pele bronzeada do sol, sobrevive vendendo chapéus nas praias. Não visita Paris há cinco anos – a valorização do euro não a permite -, mas assegura ter feito a escolha certa: ?O Brasil é a alegria dos brasileiros; em Paris, o povo é frio. Sou feliz aqui e me sinto baiana?, diz ela.

Mesmo tendo feito exatamente o contrário do que muitos brasileiros sonhariam – principalmente em se tratando de Paris -, Sylvie tem uma história bem comum na região, que fica a 430 quilômetros de Salvador. Muitos são os estrangeiros que estão fazendo a vida por lá. Nas ruas se ouvem sotaques de diversas partes, principalmente da Europa. Em sua principal via gastronômica, a Rua do Mucugê, Arraial mostra que virou uma pequena Torre de Babel. Lá tem restaurante de argentino, japonês, italiano e até um tailandês, este de propriedade de brasileiros que moraram na Tailândia.

A francesa Sylvie Semon:
?Sou feliz aqui, me sinto baiana?.

Não dá para negar que a presença dos estrangeiros em Arraial confere um charme todo especial a esse pedaço da Bahia, situado na latitude 17, a mesma Bali, fato de atração de místicos, esotéricos e alternativos. Charme este que não existe na parte central do município de Porto Seguro, do qual faz parte.

Água e vinho

Arraial d?Ajuda e Porto Seguro são como água e vinho: não tem como, juntas, agradar o mesmo público. O Rio Buranhém divide dois mundos bem diferentes. Porto vive no ritmo do axé. Suas praias parecem viver sempre em pleno Carnaval, são tomadas por música alta e a ordem é sacudir o esqueleto ?obedecendo? o que ?mandam? as letras das músicas baianas. Em Arraial, a proposta é exatamente o contrário. Lá até o relógio parece andar num ritmo mais lento. Aliás, na região, como em toda a Bahia, não foi adotado o horário de verão, o que, para os turistas do Sul, por exemplo, dá a sensação de ganhar uma hora todos os dias.

Guaiúba na Telha é servida
só na Barraca Maré, em Pitinga.

A música vai no ritmo do tempo. Como se tivessem firmado uma espécie de pacto, hoteleiros e donos de bares e restaurantes não tocam axé em seus empreendimentos. As praias também não são lugar de agito. ?Alguns turistas nos perguntam por que nós não tocamos música baiana e eu respondo que nós tocamos sim: Caetano, Gil, Gal?, diz o paulista Eduardo Oberlaender, que também deixou a vida agitada de São Paulo e hoje é proprietário de uma barraca/restaurante, a Maré, situada nas areias da Praia de Pitinga, em Arraial.

Mas esses que perguntam são minoria. Quem vai para Arraial geralmente quer exatamente o que tem lá: tranqüilidade, boa música, gastronomia variada e muita natureza.

Vôos oferecidos nas areias de Taípe apresentam ao turista uma vista bem diferente das belas praias.

Eduardo, que já morou também em Israel, França e Tunísia, sempre trabalhando em uma grande rede de hotéis, preteriu a cidade grande para ter mais qualidade de vida. Hoje, em Arraial, segue a ?filosofia? dos que lá têm estabelecimento comercial: não quer atrair o turismo de massa, prefere oferecer um serviço mais personalizado. Por isso, na Maré, o turista vai provar algumas receitas exclusivas, como a Guaiúba na Telha, um peixe assado típico da região, servido com azeite de oliva, shoyo e ervas finas, acompanhando arroz, batata assada, farofa e salada. Um prato que, além de delicioso, é bem leve, o que permite continuar curtindo a praia durante todo o resto de tarde.

O preço do prato depende do peso do peixe – R$ 45 por quilo, o que serve bem três pessoas.

Agora se a intenção é só beliscar, a dica é pedir uma porção de pastel de aratu, um caranguejo pequeno e vermelho achado no mangue. Isso, o turista também só encontra na Maré. A porção com seis pastéis custa R$ 12. Para acompanhar, pode-se escolher entre diversos drinques alcoólicos (o dono foi barman por alguns anos na Europa); sucos de frutas típicas ou um dos doze tipos de cerveja oferecidos na barraca, incluindo dois sem álcool.

Depois, o merecido descanso, na sombra ou sob o sol, até o próximo mergulho. E a paisagem convida mesmo a um banho refrescante, seja no mar de águas cristalinas ou na lagoa azul, que surpreende os turistas que caminham pelas areias de Pitinga. Além de águas mornas e muito claras, a pequena lagoa tem um depósito de argila branca, que dizem ter propriedades medicinais, o que costuma atrair muitos banhistas. Crendo ou não, impossível não se render a um mergulho.

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