Chile revela a incrível Patagônia-Aysén

Os destinos chilenos estão em alta. Desde o Deserto de Atacama até a Patagônia Sul, na orla do Estreito de Magalhães e quase caindo do mapa, as belezas deste país são cada dia mais procuradas por brasileiros.

Mas há ainda um pedaço deste país que poucos conhecem, inclusive os próprios chilenos. É a chamada Patagônia-Aysén que é cruzada de lado a lado pela Carretera Austral, mais de 700 quilômetros onde há regiões que o Chile chega a ter exíguos 40 quilômetros de comprimento, comprimidos entre os Andes e o Pacífico, com a cordilheira praticamente beijando o oceano.

Ela só pode ser descoberta de carro ou em programas pré-organizados. Não há ainda ônibus nem outro meio que faça um recorrido por estas paisagens incríveis. Mochila e carona? Esqueça.

Os veículos que por dia passam aí se contam nos dedos de uma mão, com sorte das duas, salvo no verão. Percorrê-la é um bom desafio, não porque a estrada seja perigosa ou ruim, mas porque a logística precisa ser muito bem planejada e o piloto, bom e experiente em estradas de terra e cascalho.

É uma espécie de rali pessoal, em que os tempos entre povoado e povoado, e claro as paradas para admirar a paisagem, devem calçar perfeitamente. Caso contrário vai dormir no carro e, é bom avisar: as noites podem ter temperaturas abaixo de zero.

“Mas ir fazer o que lá?”, se perguntará o caro leitor. Bem, a resposta pode ser como a do sir Edmund Hillary, quando lhe perguntaram sua razão de subir o Everest: porque está lá…

A Patagônia-Aysén tem muito mais atrativos que subir nessa mítica montanha. É uma sinfonia de paisagens das mais diversas e espetaculares: montanhas nevadas, pampas, cachoeiras, milhares de ilhas, lagos, rios, geleiras, vales profundos, matas impenetráveis e uma enorme diversidade de animais.

Amantes da pesca esportiva vão se divertir nos lagos da Patagônia-Aysén e sua profusão de peixes de tamanhos inacreditáveis.

Patagônia-Aysén, guarde bem este nome, pois logo será tão conhecido e incitante como é Atacama e a própria Patagônia Sul. Nossa intenção não é escrever um guia detalhado da viagem, até porque estamos numa das regiões mais extensas e vastas do Chile.

Se deseja isso, há o excelente Guia Turistel Sur de Chile, algo que todo viajante deve comprar assim que pisar em Santiago. Será de grande ajuda. Queremos só traspassar as impressões e dar dicas do que achamos mais interessante no caminho, deixando muitos quilômetros para você mesmo descobrir e se surpreender.

O melhor é optar por programa de operadoras locais

O vôo de Santiago até o Aeroporto de Balmaceda, no coração da Patagônia-Aysén, se faz em pouco mais de duas horas. Depois de várias viagens feitas à região descobrimos que a melhor forma de conhecê-la é optar pelos programas organizados por operadores de turismo locais.

A outra é alugando uma caminhonete, com um bom mapa na mão e dinheiro vivo para gastar em muita gasolina. E, claro, sempre viajar com um latão cheio amarrado na caçamba, porque postos de gasolina são raros na estrada e, nos povoados onde se pode achar o combustível, cartão de crédito nem se cogita.
A cidade de Coyhaique, a meia hora do Aeroporto de Balmaceda, é o pólo distribuidor do turismo regional e sua capital.

Ela tem bancos, restaurantes, um pequeno centro de artesanato e um bulevar com lojas de todo tipo. Vale uma recorrida. Se perceber que a roupa da mala não está de acordo com o clima, esta é praticamente a ,única oportunidade que o turista terá de comprar o necessário para sentir-se seguro para encarar as temperaturas que pode achar nestas latitudes, ou aos sapatos que mais podem se adequar às caminhadas e excursões.

Norte ou sul?

Depois disto, a decisão a se tomar é: rumo ao norte ou rumo ao sul? Se optar pelo sul, recomendamos uma visita ao povoado de Cerro Castillo para conhecer a Roca das Mãos, lugar declarado Monumento Nacional.

São figuras feitas por nativos, que deixaram suas mãos pintadas como com aerógrafo, milhares de anos atrás. Aqui há uma prova irrefutável da adaptabilidade humana aos elementos e climas hostis. As forças da natureza estão presentes em todo o trajeto.

Se deseja maior emoção, adrenalina e convívio com a natureza, faça uma excursão que está se transformando no destino mais procurado pelos amantes do trekking: o circuito Cerro Las Horquetas-Villa Cerro Castillo.

São seis dias e cinco noites de caminhada por uma reserva nacional de paisagens incríveis e variadas, rios, bosques de carvalho, altas geleiras, extensos campos praticamente virgens, cachoeiras e lagoas, além de estar sempre cruzando com raposas, coelhos, condores, íbis e dezenas de outras aves. Não é por acaso que esta região é muito prezada pelos amantes do bird watching (observação de aves).

Depois do povoado de Cerro Castillo, ao sul, aparece o Rio Ibañez num largo e formoso vale. Se prestar atenção verá nas encostas do caminho só as pontas das cercas, além de muitas árvores mortas no caminho e no meio do rio.

Em 13 de agosto de 1991, o Vulcão Hudson teve uma erupção com violência inusitada, cobrindo com até um metro de cinzas grande parte da região. A fúria do Hudson durou três dias, que se transformaram em noites, tal a escuridão produzida
pelo fenômeno.

Dando uma parada na estrada poderá ver que o Rio Ibañez se encontra com bancos de cinza e as cercas antigas cobertas quase integralmente por elas. Aliás, a estrada pela qual estará trafegando está feita de cinza compactada. Parece asfalto, vai se surpreender.

Continuando a viagem chega-se a Puerto Tranquilo. Desde aqui saem os passeios até as catedrais de mármore do Lago General Carrera, o segundo maior da América Latina, depois do Titicaca. Entrar nas cavernas construídas pelo constante golpe das águas e da erosão produzida pelo vento é um espetáculo.

Mais emoção? Faça o passeio até a geleira Exploradores e tenha a rara experiência de caminhar por esta formação que data dos tempos da última glaciação do planeta. Este tour não requer nenhum treino especial e pode ser feito perfeitamente por toda a família.

Adrenalina nas quedas do Baker

No Parque Nacional Queulat, a noção do impacto do efeito estufa sobre o planeta.

Uma parada obrigatória deve ser feita no ponto onde se juntam os Rios Nef e Baker. Este último é o que tem a maior correnteza de todos os rios do Chile. A paisagem, a força das águas e o som que produz a violenta queda e o encontro destes rios são impressionantes. Aqui há possibilidade de gastar toda a adrenalina fazendo rafting pelo Rio Baker. O volume de água que se encara em certos trechos é de arrepiar…

Na desembocadura do Baker há um povoado de pescadores que você jamais esquecerá, chama-se Caleta Tortel. A ele só é possível chegar de barquinho, não tem ruas nem veículos e toda a comunidade vai de um ponto a outro caminhando por passarelas de madeira, fincadas em mangues e rochedos. Um espetáculo único. Aqui verá até onde o homem pode chegar ao afã de descobrir e habitar a Terra.

Cenários de solitude

Quanto mais ao sul descemos, maior será a solitude dos cenários. No setor do povoado de Cochrane está a Reserva Nacional Tamango. Um dos atrativos é o Rio Cochrane, de tal transparência que é possível ver com facilidade uma profusão de trutas.

Depois, logo volta,r caminhando pela montanha, com grandes possibilidades de ver o maior veado andino, o huemul, símbolo do emblema pátrio chileno. Se já visitou algum dia a geleira San Rafael, saiba que está exatamente nas costas dela.

Desafio até O’Higgins

Continuar até Villa O’Higgins é o desafio. Estamos na parte final da estrada. Cuidado redobrado neste tramo, que corre pela borda do Rio Bravo. Os precipícios de rocha que há nesta estrada são de arrepiar. Não faça este trajeto de noite por motivo algum, nem o encare com chuvas fortes.

Para chegar a O’Higgins terá que pegar uma balsa. O povoado tem serviços básicos e hospedagem. Aqui, se está a poucos quarteirões da fronteira com Argentina e, embora não tenha percebido, também se está a vários quilômetros do nascimento do Campo de Gelo Norte.

Ele tem mais de 300 quilômetros de comprimento, nasce à altura de Torres del Paine, na Patagônia Sul. Para se chegar de uma a outra Patagônia só passando pelo lado argentino.

Norte denuncia o efeito estufa

De Coyhaique ao norte também há lugares que o deixarão fascinado. No Parque Nacional Queulat pode-se ter uma clara e impactante idéia da mudança que está sofrendo o planeta por causa do efeito estufa.

A geleira pendurada Quelat se distingue no alto da montanha e a monumental cascata mostra sua rápida desintegração pelo calor. No pequeno salão de visitas do lugar há fotos dos anos 60s que mostram a geleira ainda no lago ou leito do glacial.

A Patagônia-Aysén é cruzada de lado a lado pela Carretera Austral.

Ou seja, você está pisando um solo que, há poucos anos, estava coberto pelo gelo da última glaciação do planeta e a vegetação que observa é primitivíssima. Uns cinco centímetros de capa vegetal e embaixo, roca pura.

Continuando em direção ao norte, há vários pontos que merecem visita, como o Lago Risopatrón, o povoado de Puyuhuapi, famoso por sua fábrica artesanal de alfombras e, mais adiante, a cidadezinha de La Junta.

Aqui é oferecida uma série de atividades, cavalgadas, caminhadas por bosques quase virgens e a excelente pesca no belíssimo Lago Rosselot, dentro da reserva do mesmo nome.

Uma semana de viagem por terras da Patagônia-Aysen não será suficiente para conhecer tudo, mas deixará a vontade de voltar um dia. Desbravar a mítica Carretera Austral, aqui na Patagônia-Aysén é, além de tudo, um grande desafio.

Serviço: para saber mais acesse o site www.sernatur.cl/internacional. Mais sobre esta e outras viagens, acesse www.viajando comjaimeborquez.blogspot.com. (JB)