Downloads musicais dentro da lei

Aos poucos, a indústria musical brasileira vai acordando para o fenômeno do download. Ainda longe de decisões como a do mês passado, quando a Universal divulgou um ambicioso plano de disponibilizar todo o seu catálogo de graça para o mercado americano (leia texto ao lado), neste ano o Brasil ganhou suas primeiras lojas de músicas virtuais. Nada de iTunes por enquanto, mas o iMusica e o UOL Megastore já disponibilizam boas opções para quem quer fazer downloads e estar dentro da lei.

A gigante da telefonia Nokia e o portal Terra também devem entrar logo nesse mercado. Estão preparando o Sonora, que deve ser o primeiro canal de música do mercado nacional a oferecer assinatura on-line. O novo site vai permitir ouvir um acervo de músicas em qualquer computador ou dispositivo móvel, como os celulares. Além da assinatura, o Sonora também oferece a venda de downloads de músicas.

O porém é que o preço das opções nacionais, por enquanto, não compensam, o que compromete a legalização do download. O cálculo é simples: uma faixa do disco A Bigger Bang, dos Rol-ling Stones, custa na UOL Megastore R$ 2,49. O disco todo tem 16 músicas. Ou seja, o álbum ?virtual? custa R$ 39,84. No site de compras Submarino, o disco propriamente dito é vendido por R$ 24,90 (e ainda deve ser levado em consideração que o mp3 não tem custo de distribuição, não tem mídia e nem encarte).

Para criar bases para essa discussão, a ABPD – Associação Brasileira dos Produtores de Discos -, divulgou, na semana passada, uma pesquisa de mercado sobre o universo musical na internet. O estudo apresenta algumas conclusões questionáveis, mas a grosso modo, mostra um panorama onde a venda on-line de música tem campo fértil para crescer.

A pesquisa ficou a cargo da Ipsos Insight, e constatou que 8,2% da população pesquisada baixou arquivos das redes de compartilhamento de arquivos (Peer to Peer). Segundo o estudo, aproximadamente 1,1 bilhão de arquivos musicais foram baixados no Brasil no ano passado. Para chegar a esse dígito, cerca de 3 milhões de pessoas fizeram downloads de música no país, a maioria deles ilegal, diz a ABPD.

O estudo diz que se esses downloads fossem feitos de forma legalizada, o setor teria arrecadado mais de R$ 2 bilhões, ou seja, 3 vezes mais do que o montante faturado pelo mercado oficial no ano passado com a venda de CDs e DVDs originais, que foi de R$ 615,2 milhões. Mas como a pesquisa não revela se o número total de downloads contempla possíveis faixas repetidas e como o Brasil não tem um mercado sólido de singles, provavelmente a cifra não teria sido a mesma se o consumidor tivesse ido às lojas.

Também é preciso levar em conta os gêneros musicais mais procurados pelos brasileiros na rede mundial de computadores segundo o estudo. O dado aponta que o rock internacional aparece no topo da lista, com 51%, seguido da MPB, com 47%, e do rock nacional, com 46%. Como muito do material do primeiro gênero é inédito no Brasil, mesmo nas lojas on-line, estando somente disponível através das redes de troca de arquivos, fica difícil uma comparação com a venda de discos da indústria brasileira.

?Um número assustador e de prejuízos incalculáveis para o setor fonográfico como um todo: gravadoras, artistas, compositores, músicos, etc?, diz o diretor geral da ABPD, Paulo Rosa. Mas o executivo também consegue ver um lado bom nesses números. ?É a confirmação de que o potencial do mercado brasileiro para a venda de música on-line é imenso. De fato, esse mercado, seguindo tendências dos países e mercados mais desenvolvidos, dá sinais claros de alavancagem em 2006, como por exemplo o expressivo aumento de repertório disponível para downloads legítimos para público através de websites e a entrada em operação das lojas virtuais?.

Independentes aprovam o processo

Divulgação
A banda Instituto acha positivo o uso do download de músicas.

?A distribuição indiscriminada de arquivos pela internet ajudou toda uma geração de músicos brasileiros. E não só fenômenos independentes, como os paulistas do Cansei de Ser Sexy e os curitibanos do Bonde do Rolê, que fazem turnês internacionais porque as pessoas descobriram seu trabalho baixando as músicas, mas também gente mais pop, como o Marcelo D2?. Para o produtor e músico Daniel Ganja Man, um dos donos do selo Instituto, que também é uma banda, o download musical é um aliado.

Segundo o produtor, o setor industrial demorou para acordar para a revolução que acontecia à sua volta. ?É curioso ver essa gente esperneando depois de tantos avisos do que estava acontecendo. Mas acho que a abertura das lojas virtuais vai dar um alento para as grandes gravadoras?, analisa. Mas na ótica dos independentes, Ganja Man diz que da maneira como está, a única coisa ?ruim? que acontece é as pessoas terem mais opções de artistas.

?Fica mais fácil de nos conectar com o público, mostrar coisas novas e nos economiza em logística, já que não precisamos nos preocupar com fabricação, transporte ou distribuição. Além disso, some a figura do atravesador, normalmente feita pelas gravadoras. Eu posso vender diretamente meus discos, por um preço bem mais baixo, o lucro vai todo para o meu bolso?.

Na Grã-Bretanha, durante todo o ano de 2005, a banda Arctic Monkeys aproveitou o efeito internet para tornar-se popular. Antes de seu disco chegar às lojas, suas músicas já faziam sucesso na internet. Quando o álbum começou a ser comercializado, vendeu 400 mil cópias na primeira semana. Nick McCarthy, guitarrista do Franz, que vendeu mais de dois milhões de cópias só nos Estados Unidos, sempre comenta que sua banda foi ?muitíssimo favorecida? pelo vazamento de faixas de seu primeiro álbum na web.

Universal: catálogo gratuito

Uma idéia audaciosa pode mudar o rumo do mercado fonográfico mundial. Incapaz de competir com o MP3 baixado ilegalmente ou por serviços como o iTunes, o conglomerado francês Vivendi Universal assinou, na primeira semana de setembro, um contrato que vai tornar seu catálogo musical disponível para downloads gratuitos e legais nos Estados Unidos e no Canadá a partir de dezembro.

O maior selo musical do mundo, gravadora de músicos como U2, 50 Cent, Black Eye Peas, B.B. King, The Killers e The Cure, aliou-se ao recém-criado serviço SpiralFrog, que não vai cobrar para as pessoas baixarem a música. A receita dependerá da publicidade. Apesar de reconhecer que essa nova forma de distribuição será, ao menos no início, bem menos lucrativa que a venda de discos, os executivos da Universal decidiram apostar no crescimento da distribuição digital de música, ainda dominada pelos downloads ilegais. Warner, EMI e Sony BMG, também já iniciaram as conversas com o SpiralFrog. Pode ser o início do fim dos CDs.

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