comida de risco

Obesidade aumenta casos de câncer em 15% no Brasil

Os principais vilões são, em geral, os produtios mais baratos e com altos índices de açucar, sal e gordura, diz o estudo. Foto: Daniel Castellano
Os principais vilões são, em geral, os produtios mais baratos e com altos índices de açucar, sal e gordura, diz o estudo. Foto: Daniel Castellano

Uma pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) constatou que cerca de 15 mil casos de câncer poderiam ser evitados no Brasil com medidas de combate à obesidade. Em artigo publicado na revista Cancer Epidemiology, o estudo aponta que o aumento do poder econômico nos últimos anos no país levou a um maior consumo, porém, no caso da alimentação, o fenômeno ficou atrelado principalmente aos alimentos ultraprocessados.

Contando com colaboração da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, a pesquisa aponta que são 14 tipos da doença com fatores de risco associados à obesidade e ao sobrepeso, como o câncer de mama (pós-menopausa), de cólon, de reto, entre outros, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, a incidência desses tipos de câncer corresponde à metade do total de casos da doença diagnosticados por ano, ou seja, cerca de 200 mil diagnósticos.

Para o doutorando da FMUSP, Leandro Rezende, um dos autores da pesquisa, alguns ingredientes dos alimentos que hoje são mais consumidos influenciam diretamente nos números apontados. “O estudo mostra essa fase de transição nutricional epidemiológica. São justamente esses alimentos altamente calóricos, com quantidade elevada de açúcar, sal e gordura, que são os produtos mais baratos”, disse.

O estudo feito por Rezende, em colaboração com pesquisadores brasileiros e norte-americanos, calculou a fração atribuível populacional (FAP) do câncer relacionado ao índice de massa corporal (IMC) elevado. A FAP é uma métrica para estimar a proporção da doença possível de prevenir na população caso o fator de risco (nesse caso o sobrepeso e a obesidade) fosse eliminado, mantendo os demais fatores/causas estáveis.

Para estimar o excesso de peso e a obesidade na população brasileira, os pesquisadores usaram dados sobre IMC no Brasil em 2002 e 2013 da Pesquisa de Orçamentos Familiares e da Pesquisa Nacional de Saúde, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). De acordo com os dados, 40% da população brasileira tinha sobrepeso ou obesidade em 2002. Em 2013, o total subiu para aproximadamente 60%.

Nas mulheres

De acordo com o estudo, 3,8% dos mais de 400 mil casos de câncer diagnosticados anualmente são atribuíveis ao IMC elevado. Verificou-se também que esses casos são mais comuns em mulheres (5,2%) do que em homens. Isso se dá não apenas pelo fato de a média do IMC ser mais elevada nas mulheres, mas, principalmente, porque três tipos de câncer atribuíveis à obesidade e sobrepeso – ovário, útero e câncer de mama – afetam quase exclusivamente a população feminina.

Abordagem regional

O trabalho é um dos primeiros a fazer comparações regionais sobre a relação entre obesidade e câncer. De acordo com o estudo, as maiores FAPs, para todos os tipos de câncer, foram encontradas nos estados das regiões Sul (3,4% de mulheres para 1,5% de homens) e Sudeste (3,3% de mulheres para 1,5% de homens).

Nas mulheres, as maiores FAPs foram encontradas nos estados de Rio Grande do Sul (3,8%), Rio de Janeiro e São Paulo (ambos 3,4%). Nos homens, as FAPs mais altas foram em Mato Grosso do Sul e São Paulo (ambos 1,7%).

Alimentos ultraprocessados

De acordo com o artigo, as vendas de produtos ultraprocessados cresceram 103% em toda a América Latina entre os anos de 2000 e 2013, acompanhadas de um consequente aumento no IMC nos países da região. Para os autores, reverter esse quadro exige políticas públicas como a regulamentação de imposto, rotulagem nutricional e restrição de marketing de alimentos ultraprocessados.

“Esse crescimento de vendas na América Latina retrata uma estratégia da indústria de alimentos, assim como foi, ou tem sido, a da indústria de tabaco. Quando alguns países começam a regular minimamente a venda e publicidade desses alimentos, eles partem para regiões em que as leis ainda não foram estruturadas para promover a saúde da população”, analisa Rezende.