Policiais civis trabalham mesmo sendo processados

Responder a um processo criminal na Justiça não impede um policial civil de trabalhar, inclusive na função na qual ele cometeu a infração – ou existe a suspeita para isto – que originou a ação penal. É o caso de um delegado preso na Operação Remédio Amargo, em agosto de 2007, realizada pelo Centro de Operações Policiais Especiais (Cope).

Na época, ele foi acusado de envolvimento com roubo de cargas de remédios. O delegado está sendo processado por formação de quadrilha e atua no mesmo cargo em uma pequena cidade da região sudoeste do Paraná. Enquanto não sai a decisão na Justiça, ele segue trabalhando.

O delegado-geral da Polícia Civil do Paraná, Jorge Azôr Pinto, lembra que, como qualquer cidadão que responde aos fatos em liberdade, o policial civil – independentemente da categoria – também tem o direito do mesmo.

Quando questionado se isto seria uma situação conflitante, o chefe maior da Polícia Civil comentou que, em casos mais graves, existe a possibilidade de o delegado ficar na secretaria executiva do órgão, sem exercer a função, apenas assinando ponto.

“O Conselho da Polícia Civil analisa caso a caso. Nós estamos imaginando o pior, que isto realmente ocorreu e que realmente ele seja condenado por isto. Mas se ele for absolvido?”, pergunta Azôr.

Quando um policial civil é acusado de algo que esteja fora de suas funções, ele pode responder em três instâncias: na administrativa, na área cível (caso tenha que reparar danos) e no âmbito criminal.

Pode haver situações em que um fato praticado por um policial pode ser, ao mesmo tempo, um ilícito administrativo, cível e penal. “Ele responde de uma forma superior a um cidadão comum”, comenta o delegado-geral.

Internamente, tudo começa com uma investigação preliminar, quando ainda não existe certeza da autoria ou do fato. Após a apuração, o caso pode ser arquivado ou derivar uma sindicância ou um processo administrativo disciplinar, dependendo da punição prevista no Estatuto da Polícia Civil para aquela determinada infração.

Azôr explica que o policial civil pode ainda ser afastado pela Corregedoria, por um período máximo de 150 dias. “Depois disso, o processo dele continua e ele voltará e trabalhará em um outro local, até o desfecho da situação”, conta. De acordo com ele, os casos são definidos na esfera administrativa.

No entanto, quando existe pendência na área criminal, a decisão interna pode ser revista se acontecer uma definição diferente no tribunal. “Esta possibilidade existe, mas enquanto não for decidido lá (na Justiça) a situação dele aqui é provisória”, esclarece.

O Conselho da Polícia Civil pode recomendar a demissão, que só pode ser definida pelo governador do Estado. O juiz também pode decretar a perda do cargo em sua decisão.

Azôr garante que as apurações de sindicâncias e processos administrativos disciplinares são transparentes, com direito a ampla defesa do policial civil e julgamentos abertos.

Números

De janeiro a novembro de 2008, 19 delegados responderam a processos administrativos. O mesmo aconteceu com 16 escrivães, 69 investigadores, 3 papiloscopistas e 6 agentes. Neste período, foram demitidos 2 delegados, 4 escrivães, 28 investigadores, 2 papiloscopistas, 4 agentes e 1 funcionário administrativo.

Vida deve ser compatível

Todo servidor público deve manter uma vida particular compatível com a sua vida pública. A afirmação é do advogado Daniel Ferreira, professor e coordenador do curso de mestrado do Centro Universitário Curitiba (Unicuritiba).

De acordo com ele, o servidor deve dar exemplo para a sociedade. Mas, quando acontece de o funcionário público ser acusado de algo e responder por isso criminalmente, deve-se, levar em conta a presunção da inocência, conforme prevê a Constituição Brasileira.

“Existe a possibilidade de o sujeito ser afastado do serviço para, por exemplo, funções burocráticas. Isto pode ser feito de maneira sigilosa ou sutil, porque pode prejudicar o servidor. Deve-se procurar uma solução satisfatória para todos os lados. Mas, dependendo da situação, se tivesse que colocar o direito coletivo diante do direito individual, preferiria o coletivo”, esclarece.

O advogado Egon Bockmann Moreira, professor de Direito Constitucional da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR), também lembra que a existência de um processo não implica em culpa.