Polícia Federal põe fim a esquema bilionário

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Michel Saliba é o mais
conhecido entre os detidos.

Seis pessoas foram presas ontem pela Polícia Federal suspeitas de fraudarem documentos para obter pagamentos de títulos da dívida pública da Petrobras e da Eletrobrás. Cinco prisões foram feitas em Curitiba e uma em Recife. Entre eles está o presidente da subseção da Ordem dos Advogados do Brasil de Curitiba, Michel Saliba Oliveira. Os presos são acusados de formação de quadrilha, tentativa de estelionato, corrupção ativa, tráfico de influência e crimes contra o sistema financeiro nacional.

Durante a operação, batizada de Big Brother, a PF cumpriu seis mandados de prisão preventiva contra os advogados Michel Saliba, José Lagana, Sílvio Carlos Cavagnali e João Bosco de Souza Coutinho – preso no aeroporto de Recife e encaminhado a Curitiba. Ele é considerado o mentor da quadrilha. Também foi preso João Marciano Odppis, funcionário e cunhado de Michel Saliba. No começo da tarde de ontem foi detido, no aeroporto Afonso Pena, Paulo Sampaio, que mora em Recife e estava na cidade desde domingo.

Os policiais cumpriram ainda 14 mandados de busca e apreensão em escritórios e residências dos indiciados e de outros envolvidos, recolhendo computadores e documentos como petições, minutas ou decisões judiciais referentes às instituições federais lesadas. Na residência de Coutinho foram apreendidos 50 mil dólares e armas de fogo.

As operações ilegais estariam acontecendo desde 2002. Segundo o delegado Omar Gabriel Haj Mussi, responsável pelas investigações, os acusados propunham ações contra a Petrobras e a Eletrobrás com base em supostos créditos de pessoas físicas ou jurídicas ou através de títulos prescritos, sempre solicitando a antecipação de tutela. "Ainda não sabemos como eles obtinham esses documentos e nem mesmo se são autênticos", afirma Mussi.

O pedido era encaminhado a tribunais estaduais que, segundo o delegado, não têm competência para julgar esse tipo de ação. A PF não sabe ainda se há o envolvimento direto de juízes, mas o fato é que houve ordens judiciais para a liberação do dinheiro em todas as tentativas da quadrilha. "Estamos investigando as circunstâncias em que esses magistrados se envolveram. Não quer dizer que eles eram cooptados. As ações eram muito bem forjadas", explica Mussi.

O passo seguinte era tentar subornar gerentes do Banco do Brasil para participar do esquema. Segundo Mussi, eles realizariam o bloqueio e a transferência eletrônica dos valores visados sem avisar o departamento jurídico da instituição. "Em Curitiba, dois gerentes receberam propostas de 1 milhão de dólares para participar e recusaram", diz o delegado. Caso sacado, o dinheiro seria pulverizado em diversas contas correntes em nome de "laranjas", que não tinham como comprovar condição financeira dessa natureza.

Acusado contesta ação

Ao chegar algemado na sede da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, o presidente da subseção da OAB, Michel Saliba Oliveira, disse que a ação da polícia era arbitrária, e que ele não tinha nenhum envolvimento no caso. "Estava dentro da prerrogativa profissional, exercendo a advocacia", afirmou, acrescentando que foi preso em casa durante o mandado de busca e apreensão de documentos.

O advogado de Saliba, René Ariel Dotti, disse que foi chamado pelo cliente por telefone, enquanto a PF fazia a busca dos documentos. Depois de uma rápida conversa com Saliba, já na sede da PF, Dotti afirmou que ele foi procurado em maio de 2004 pelo advogado João Bosco de Souza Coutinho, que propôs a ele ingressar com uma ação de tutela antecipada para o recebimento de títulos precatórios. O procedimento parecia não ser ilícito, mesmo assim Saliba recusou. No entanto, teria passado a ação para José Lagana. "Pelo que levantei, a ação nem chegou a ser proposta, então trata-se de um crime invisível", falou Dotti, acrescentando que, a princípio, a prisão foi ilegal.

Golpes propostos em 7 estados

Como não houve participação dos gerentes do BB, quando as ações chegavam no Ministério Público Federal, a quadrilha simplesmente desistia do golpe, retirando a ação. Mussi diz que o único golpe onde a quadrilha chegou a retirar o dinheiro foi em Goiânia, em 2002. Foram sacados R$ 90 milhões, mas o BB descobriu a fraude e conseguiu reaver o dinheiro. O único dos envolvido preso ontem que tinha ligação com esse caso era Coutinho.

Os golpes foram tentados no Paraná, Goiás, Alagoas, Pernambuco, Maranhão, Pará e Amazonas. Somente no Paraná, a Eletrobrás descobriu ser ré em 49 ações judiciais semelhantes, todas com valores milionários. Em Curitiba, a quadrilha tentou aplicar o golpe em duas ocasiões, sendo a última em novembro de 2004, contra a empresa de energia. "Há indícios que eles tentariam mais uma vez esta semana", afirma Mussi.

As investigações começaram a ser realizadas em novembro de 2003, quando a gerência de segurança e inteligência do Banco do Brasil procurou a PF do Paraná para informar que um gerente geral de uma das agências em Curitiba havia recebido uma proposta milionária para cumprir ordem judicial sem comunicar o departamento jurídico do banco. O golpe, que não chegou a ser realizado, envolvia uma quantia de US$ 90 milhões. O superintendente da PF no Paraná, Jaber Makul Hanna Saadi, diz que as investigações sobre o caso continuam e podem ocorrer mais prisões. "O montante que a quadrilha tentou liberar, se somadas todas as tentativas, ultrapassa os R$ 2 bilhões", afirma.

Nem a Petrobras, nem a Eletrobrás quiseram comentar o caso. Em nota, a OAB, Seção do Paraná, afirma que não é e nem será corporativista no episódio, e que se eventuais comprometimentos por parte dos advogados e suas atuações caracterizarem qualquer mácula à ética ou à disciplina profissionais, a entidade defende medidas enérgicas, apuração rigorosa e responsabilização dos infratores.

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