PM morto no ‘Papelão’ é enterrado 18 dias depois

O lençol que cobriu um corpo na favela do Papelão, no Capão Raso, no início do mês, também encobriu por 17 dias uma história de bons serviços prestados à população, marcada por lutas perdidas contra as drogas. O corpo era do soldado da Polícia Militar Emerson Cauvilla, 35 anos. Apesar de o crime ter ocorrido em 7 de janeiro, apenas na sexta-feira (24) o cadáver foi reconhecido por familiares no Instituto Médico-Legal (IML). A autoria do crime já era conhecida desde o dia do assassinato: uma família que disputa o ponto de venda de drogas na região e que, desde o homicídio, está sumida. Volta ao local apenas para matar rivais e devedores e tentar retomar o poder.

O soldado Cauvilla, como era conhecido na corporação, entrou na PM em 1997 e, há cinco anos, atuava no policiamento ostensivo do 17.º Batalhão, responsável por parte da região metropolitana. Apesar de não constar em seu histórico policial feitos heróicos ou afastamentos e confusões, alguns de seus colegas ressaltaram que por muitos anos Cauvilla foi um ótimo policial, até a época em que entrou para as drogas, há alguns anos. “A feição dele mudou. Até o corpo ficou diferente. Já não era mais o mesmo”, lamentou um colega de trabalho, que preferiu não se identificar.

Shopping

Depois que se separou da mulher, Cauvilla um dia foi atrás dela dentro de um shopping no Hauer, no fim de 2012. Causou confusão usando a pistola da corporação e policiais do serviço reservado tiveram que interceder para desarmá-lo. Depois disto, contou um dos policiais que acompanhou de perto a situação, o soldado permaneceu por três dias sumido, procurado pelos colegas.

Quando foi reencontrado, precisou ser encaminhado a tratamento psicológico. Não se descarta que ele estivesse fora de si pelo uso de drogas. A ex-mulher nem quis dar queixa contra ele, dizem os colegas, que ainda contaram que o policial chegou a ser internado algumas vezes depois disto.

Apesar de a assessoria de imprensa informar que o policial só foi afastado para tratamento clínico, por conta das drogas, no ano passado, os colegas dizem que desde a confusão com a ex-mulher é que o soldado já estava afastado do serviço de rua, realizando apenas serviços internos.

Desertor

Desde o dia anterior a seu assassinato, Cauvilla estava sumido do trabalho. Segundo a PM, nove dias após ele não se apresentar no quartel sem justificativa, o policial é tido como desertor e procedimento interno é aberto. Os policiais estiveram primeiro na casa do soldado e localizaram o colete e as algemas da corporação (a arma ele já não portava desde a confusão no shopping).

Em seguida, buscaram informações com a família, que mora em Jacarezinho, no Norte Pioneiro, e orientaram os parentes a verificar o IML de Curitiba. Os policiais já tinham ido ao IML, mas não tiveram acesso ao cadáver para reconhecimento. Na sexta-feira, o irmão do soldado o reconheceu no IML. As investigações da PM sobre a deserção devem subsidiar o inquérito do crime, no 8.º Distrito Policial (Portão).

Suspeitos do assassinato são procurados

No dia do assassinato do soldado Emerson Cauvilla, a Delegacia de Homicídios (DH) foi até o local, a Rua Auton Tchekow, e descobriu a autoria do crime. As suspeitas apontam para mãe e um casal de filhos (Ezilda Aparecida Rodrigues, 50 anos, André Juliano Borges, 20 e Camila Francielle Borges, 33), que moravam na favela do Papelão e eram “donos” do ponto de tráfico.

De acordo com o que falou o delegado Danilo Zarlenga, da DH, logo depois da morte de Cauvilla, os três suspeitos eram investigados por outros homicídios e pelo tráfico e fugiram quando souberam que estavam com prisões decretadas. Como a autoria do crime foi identificada, a DH passou o inquérito ao 8.º Distrito Policial (Portão). O distrito, já fazia investigações sobre o tráfico de drogas no local e as informações que as duas delegacias tinham sempre convergiam para a família Borges. A investigação ainda não esclareceu se o soldado Cauvilla foi morto por ser um viciado devedor ou se estava envolvido na disputa pelo ponto de venda de drogas.

Confronto

Na sexta-feira passada, mesmo dia em que o soldado Cauvilla foi reconhecido no IML, policiais militares do 13.º Batalhão trocaram tiros com três jovens na favela do Papelão. Ariel Mesquita, 18 anos, foi baleado e preso depois de receber cuidados no Hospital do Trabalhador. Wellington de Oliveira, 28, foi preso na hora e o terceiro, um adolescente, conseguiu escapar. Segundo informações do setor de investigação do 8.º DP, os três jovens eram rivais da família Borges e foi o adolescente que escapou da polícia que assumiu o tráfico de drogas na favela. Não se descarta a possibilidade de que este jovem (ou algum outro comparsa) também estivesse armado no tiroteio. Além dos buracos feitos com revólver calibre 38 (arma apreendida com Ariel), a viatura também tinha tiros de pistola calibre 40. Moradores ficaram revoltados e, além de apedrejar a viatura, também depredaram e incendiaram a casa da família Borges.

Quem tiver informações sobre o paradeiro da família Borges deve informar, gratuita e anonimamente, a Delegacia de Homicídios, pelo telefone 0800-643-1121.