Crime sem Castigo

Homicídios em Curitiba têm locais e datas para ocorrer

Rosana Félix, Bruna Maestri Walter, José Marcos Lopes e Rogerio Galindo

Os homicídios em Curitiba têm locais e datas para ocorrer. Levantamento da Gazeta do Povo com base nos inquéritos de mil assassinatos da capital entre 2010 e 2013 mostra que os crimes estão concentrados em cerca de 180 das mais de 8 mil ruas da capital e acontecem com maior frequência em áreas de ocupação irregular, localidades pobres e à beira dos rios e da linha do trem. O horário também segue o mesmo padrão: a maioria ocorre entre sexta-feira e domingo.

Das mil ocorrências analisadas, quase metade (447) ocorreu em 176 ruas ou adjacências. A que tem mais ocorrências é a Avenida Juscelino Kubitschek, na Cidade Industrial de Curitiba (CIC) com 11 assassinatos, com maior concentração nas imediações da ocupação Vila Nova Barigui. Outro local com o mesmo número de ocorrências é a área em torno do Zoológico de Curitiba e da Rua João Miqueletto.

Em seguida aparece a Avenida Nicola Pellanda (que atravessa os bairros Pinheirinho, Sítio Cercado e Umbará) e suas imediações, com sete assassinatos. Outras quatro vias registraram quatro mortes cada: Avenida Comendador Franco (a Avenida das Torres); Rua da Trindade (Cajuru); e Rua Desembargador Cid Campelo (CIC).

Invasões

Do total de crimes, aproximadamente 380 ocorreram dentro ou ao lado das áreas de ocupação irregular. Nessas áreas, a infraestrutura é precária e há poucos equipamentos públicos. O maior número de ocorrências, além da Vila Nova Barigui, está no entorno da Vila Sandra, na CIC; Terra Santa (Tatuquara); Xapinhal, Campo Cerrado e Osternack (Sítio Cercado); 23 de Agosto (Ganchinho), Vila União e Jardim Icaraí (Uberaba); Vila Acrópole e Vila Autódromo (Cajuru).

Segundo o sociólogo Pedro Bodê, coordenador do Centro de Estudos em Segurança Pública e Direitos Humanos da Universidade Federal do Paraná, as áreas de crimes coincidem com as regiões abandonadas pelo poder público. “Não há serviços públicos básicos suficientes, como escolas, creches, áreas de lazer, e muito menos segurança. Como há uma demanda muito grande, a polícia acaba se voltando para áreas com maior visibilidade e pressão midiática.”

Padrão

“A polícia não pode falar em imprevisibilidade”, afirma o pesquisador Luís Felipe Zilli do Nascimento, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. “O homicídio ocorre sempre nas mesmas áreas, nos mesmos horários. Isso é padrão nas capitais. Com um pouco mais de direcionamento e inteligência é possível resolver e diminuir o número de ocorrências”, avalia. Segundo os inquéritos das mil mortes analisados pela reportagem, 55% dos homicídios ocorreram entre sexta-feira e domingo.

Segundo os pesquisadores, é essencial resolver os crimes nas áreas mais pobres. “Em um cenário de escassez de recursos, em que é necessário priorizar casos, estes são os mais importantes. A maior parte dos crimes ocorre em favelas, mas são cometidos por poucas pessoas, homicidas contumazes. Se focalizar os recursos nessas áreas, a redução no número de homicídios será drástica”, diz Zili. Para Bodê, além de preservar vidas, essa medida traria sensação de segurança para toda a sociedade.