Denunciada tortura contra detentos da Custódia

Parentes e esposas de presos que estão recolhidos na Casa de Custódia de Curitiba (CCC) – cadeia recém-inaugurada na Cidade Industrial – promoveram esta semana uma verdadeira enxurrada de reclamações e denúncias contra os agentes de segurança da unidade. Revoltados, os familiares asseguram que os detentos estão sendo espancados sistematicamente, sem que exista qualquer motivo para tal violência. As reclamações motivaram uma visita do presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil – sessão Paraná – advogado Dálio Zippin Filho à cadeia, na manhã de terça-feira

“Os presos estão amedrontados e verifiquei que alguns foram realmente espancados”, afirmou Zippin Filho, que conversou com vários deles, após obter autorização do juiz da Vara de Execuções Penais, Roberto Massaro. “Também confirmei que eles estão sendo alvo de castigos coletivos, o que é completamente irregular”, comentou o advogado, que agora pretende enviar um relatório à VEP, solicitando que providências sejam tomadas e responsabilidades apuradas.

Outras denúncias, dando conta de que os presos estariam passando fome, não foram confirmadas. “Eles recebem comida de qualidade e em quantidade. São três refeições por dia”, disse o representante da OAB. Apesar de terem conseguido conversar com o advogado sem a presença de seguranças, os presos se negaram a fornecer nomes dos supostos agressores. “Cadeia é assim mesmo, a gente apanha e tem que ficar quieto”, disseram alguns, enquanto outros afirmaram que foram avisados de que “quem fala demais acaba falando com cavalo”. Zippin Filho também pedirá que alguns presos sejam removidos da CCC para outro local, já que eles demonstraram muito medo em continuar naquela unidade.

Rebelião

O diretor da CCC, coronel reformado da Polícia Militar Justino Sampaio, negou ontem que existam procedimentos violentos contra os presos. Segundo ele a revolta dos familiares ainda se prende às medidas disciplinares adotadas no mês passado, logo após a rebelião promovida pelos detentos da ala A – no dia 22 de setembro -, que se recusaram a retornar para as celas após o domingo de visita e quebraram janelas, portas e até o televisor instalado para distraí-los. Também espancaram dois presos que ficaram gravemente feridos e foram encaminhados para o Complexo Médico Penal.

Depois do motim tomamos as medidas disciplinares necessárias e no fim de semana seguinte o grupo da ala A ficou sem visita. Mas agora tudo está normal”, afirmou Sampaio, que tem demonstrado grande interesse em manter a cadeia em rigorosa disciplina, mas sem violência. “Nós já afastamos três agentes de segurança que não se adaptaram ao trabalho e podemos afastar outros que não estejam correspondendo às atividades, porém os detentos precisam citar os nomes de quem os agride, se é que isso está acontecendo”, afirmou o oficial. Por outro lado, os parentes dos presos dizem que eles se negam a fornecer os nomes porque temem apanhar ainda mais.

Os familiares também reclamam das revistas feitas na portaria em dias de visitas. Dizem que os agentes de segurança são grosseiros e os tratam sem qualquer consideração. “A gente fica horas na fila, esperando para entrar e aí o tempo de visita escoa e podemos ficar só alguns minutos com o preso”, reclamou uma mulher que toda semana vai à CCC para conversar com o filho.

Muita segurança e boa comida

Cada preso recolhido na Casa de Custódia de Curitiba custa ao Estado cerca de R$ 1.300,00 por mês. Todo o serviço de guarda e segurança dos detentos é terceirizado e fica a cargo do Instituto Nacional de Administração Prisional – Inap -, um braço da empresa de segurança Metropolitana. A comida é fornecida por uma empresa de Guarapuava, que montou uma cozinha na própria unidade. São três refeições diárias – café da manhã, almoço e jantar – servidos em marmitex. Além de uma carne, feijão, arroz, macarrão e legumes, ainda há vários tipos de saladas no cardápio. A refeição dá inveja a qualquer trabalhador.

A segurança é grande. Várias câmaras de TV monitoram as alas e todo o prédio parece estar embrulhado em uma grande laço de arames pontiagudos. Para reforço, viaturas da Polícia Militar e às vezes da Civil, fazem rondas nas ruas próximas, durante todo o dia e principalmente à noite. Qualquer movimentação estranha na área é comunicada às autoridades e em poucos minutos a região fica completamente policiada. “Fugir daqui é muito difícil”, salienta Justino Sampaio Filho, lembrando que se trata de um novo conceito de cadeia: “As pessoas estranham um pouco mas vão acabar se acostumando. Aqui todos são tratados com dignidade e também com limites. Não há favores nem favorecimentos”, finaliza o diretor.

Objetivo é a recuperação

Uma característica da cadeia provisória é a faixa etária dos detentos. Metade dos 400 reclusos tem menos de 25 anos e cerca de 80% têm menos de 30. Apenas meia dúzia tem mais de 40 anos. A maioria está envolvida com tráfico de drogas e roubos. Quando chegam na nova unidade, eles são colocados na área de triagem, recebem uniformes e uma classificação pelo delito e grau de periculosidade. Depois passam por exames médicos, odontológicos, psicológicos, conversam com assistentes sociais e só então, quando estão adaptados, são levados para suas celas.

“A idéia é não misturar presos perigosos com outros, de menor poder ofensivo. Assim evitamos a tal escola do crime, pois a meta é já tentar ressocializá-los ou pelo menos impedir que aprendam mais coisas erradas”, explica o oficial.

Criatividade

Da mesma forma em que passam o tempo pensando em um meio de se armar, para se tornarem mais poderosos que os demais, os presos também usam da criatividade para quebrar a monotonia. Como é proibido fumar, guardar objetos de uso pessoal, ter TV ou rádio na cela, eles buscam meios de se distrair. Chegam a remover fios dos cobertores que lhes são entregues pela direção, para através deles fazer correr bilhetinhos escritos em papel higiênico que são passados de uma cela para outra. “Mesmo existindo três alas distintas, todos sabem o que acontece na cadeia. Eles montam um sistema de comunicação incrível”, salienta Justino.

Um detento chegou e esculpir em sabonete um jogo completo de dominó, para se distrair com os colegas. Outro, também em sabonete, fez a miniatura de um navio. Os objetos foram apreendidos, para não dar confusão entre eles.

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