Topo da pirâmide

Dentre todas as operações realizadas ultimamente com espantosa freqüência pela Polícia Federal (PF), abstraída a criatividade dos encarregados de arranjar nomes emblemáticos para dar maior realismo à ação das equipes selecionadas para as investigações, nenhuma causou tanto impacto quanto a Satiagraha, expressão que ganhou notoriedade ao ser utilizada pelo grande líder indiano, Mahatma Gandhi, que a invocava para realçar a necessidade de reivindicar ?firmeza na verdade?.

Destarte, a sociedade brasileira ainda acompanha com desmedida atenção os desdobramentos das prisões do banqueiro Daniel Dantas, dono do Grupo Opportunity, do megainvestidor Naji Nahas, e do economista Celso Pitta, ex-prefeito de São Paulo. Mais 14 pessoas (doleiros e funcionários das empresas de Dantas ou Nahas) também foram presas no desfecho da operação chefiada pelo delegado Protógenes Queiroz, que recentemente investigou o caso MSI-Corinthians.

As prisões foram efetuadas depois de longo trabalho de investigação de acusações de desvio de recursos públicos, corrupção, fraude no mercado de ações, gestão fraudulenta de instituição financeira, evasão de divisas, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. O trabalho da PF, que contou com o respaldo de escutas telefônicas feitas com aprovação prévia do Poder Judiciário, requereu o concurso de 300 agentes que efetuaram 56 mandados de busca e apreensão e 24 mandados de prisão. Com esse evento retumbante, por todos os títulos, a operação de maior envergadura realizada até aqui pela PF, a instituição se credencia a receber o irrestrito aplauso popular pela competência com que tem combatido o chamado crime do colarinho branco.

Com efeito, a sociedade brasileira está coberta de razões para se estarrecer diante das ilicitudes cometidas por um dos mais destacados gestores de recursos do País, Daniel Dantas, que administra a não desprezível importância de R$ 20 bilhões a ele entregues certamente em absoluta confiança por agora apavorados investidores. O mesmo se pode dizer a respeito de Naji Nahas e Celso Pitta, conhecidas personalidades do mundo financeiro e político, também marcados nos últimos tempos por acusações de conduta fraudulenta, sobretudo o ex-secretário de Finanças da última passagem de Paulo Maluf pela Prefeitura de São Paulo, ocasião em que se detectou superfaturamento das obras do complexo viário Ayrton Senna e da Avenida Águas Espraiadas.

Ao suceder Maluf na prefeitura, o até então desconhecido Celso Pitta teria a oportunidade de adubar a aura de péssimo administrador notabilizando-se por uma seqüência de escândalos, tais como a emissão de títulos municipais em valores acima do permitido e abusivo desvio de recursos na construção do fura-fila, sistema de transporte urbano orçado em R$ 146 milhões que torrou mais de R$ 800 milhões e permanece inacabado. O ex-prefeito, preso de pijama à porta de seu apartamento, pagou o preço de ter se juntado ao investidor Naji Nahas, a quem delegou a função de intermediário na movimentação da conta aberta em banco sediado em Nova York.

Apontado pelo relatório da CPMI dos Correios como fornecedor de recursos para o esquema fraudulento da compra de votos no Congresso, manipulado pelo empresário mineiro Marcos Valério Fernandes de Souza, Dantas teve então seu indiciamento pedido pelo relator Osmar Serraglio (PMDB-PR), por suspeita de tráfico de influência, sonegação fiscal e corrupção ativa. Dantas transferia recursos para o valerioduto, usando como canais a Brasil Telecom e a Telemig Celular, empresas resultantes da privatização do sistema público de telecomunicações, controladas pelo Opportunity.

A última ação de Dantas foi viabilizar a compra da Brasil Telecom pela Oi, antiga Telemar, negociação que se estendeu por nove anos. Como se percebe, a PF parece ter chegado ao topo da pirâmide criminal.

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