Terror em casa

Chegou a hora de construirmos um novo poder popular, digno, soberano, honesto e democrático, e devemos começar ignorando as velhas instituições e os representantes do Estado burguês latifundiário. Assim quer o grupo guerrilheiro Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia – Farc, ao ameaçar de captura ou execução todos os 1097 prefeitos democraticamente eleitos do vizinho país que ousarem continuar em seus cargos. Muitos deles já renunciaram, com medo de que eles ou suas famílias sejam alvos dos guerrilheiros.

Desde 1998, mais de cinqüenta prefeitos foram assassinados, vítimas tanto das Farc quanto do Exército de Libertação Nacional ou do grupo paramilitar Autodefesas Unidas da Colômbia. As ameaças atuais, segundo um dos líderes das Farc, se estendem também a vereadores, juízes, promotores e simples funcionários do poder político local. A idéia da guerrilha é, desmontando completamente o poder político local, minar irremediavelmente todas as instituições colombianas. E “se os prefeitos se mudarem para as capitais, para lá exercerem seus cargos, nós também chegaremos lá para impedir que isso se cumpra”, advertem as forças paralelas que, assim, decididamente disputam o governo do país.

Atônito, o governo oficial não sabe bem o que faz. Promete proteção, mas sabe que será praticamente impossível cumprir a promessa. A distribuição de coletes a prova de balas, carros blindados, o fornecimento de guardas pessoais ou a instalação de sistemas eletrônicos nas prefeituras e residências dos prefeitos, com blindagem de portas e outras medidas do gênero – nada disso é capaz de conferir segurança e tranqüilidade a ninguém. Pelo contrário, cada vez mais contribui para aumentar o clima de um terror que passa a morar junto com os colombianos, na mesma casa. O governo central pode até proteger a vida do prefeito, mas conseguirá fazer isso com seus assessores? Com os auxiliares dos assessores? Com todo o funcionalismo de uma prefeitura que continuasse em funcionamento?

Esta não é a primeira, mas certamente constitui a mais grave ameaça às autoridades e ao poder constituído na Colômbia cujos confrontos com a guerrilha e o crime organizado geraram, nos últimos dez anos, mais de 40 mil mortos.

Se a ameaça da guerrilha colombiana passou de todos os limites imagináveis e generaliza de tal forma a distribuição do medo, a cifra não faz susto aos brasileiros. Aqui, mais que 40 mil tombam, não por década, mas por ano, vítimas de armas leves, segundo a organização não-governamental Small Arms Survey, com sede em Genebra. Nossa situação, embora ainda distante daquela colombiana, mostra-nos que seguimos pelas mesmas trilhas.

Outro dia o presidente Fernando Henrique Cardoso esteve no Rio de Janeiro para dizer que a ousadia dos comandantes do crime organizado passou de todos os limites. De fato, passou. Mas as medidas anunciadas pelo governo, a seguir, são pálidas demais para o tamanho do problema que já temos. Se não agir com rigor agora – e tolerância zero é apenas um discurso – o governo poderá não ter mais como manter o controle amanhã. O exemplo da Colômbia precisa ser levado em conta.

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