Surto anticrime

Há um surto de ações anticrime, ao mesmo tempo em que se desenvolve uma epidemia criminosa. O noticiário revela todos os dias com detalhes a onda de criminalidade que já não encontra barreiras nem nas megalópoles nem nas grandes ou pequenas cidades. O sentimento geral é de medo. Pessoas de bem, sejam das favelas ou da zona sul do Rio, sejam comerciantes, operários ou policiais paulistanos ou de qualquer outra parte do País, trancando-se em casa, protestando quando possível, fazendo passeatas comoventes, mas improfícuas, esperando a paz que lhes deveria ser assegurada pelas autoridades, prevenindo, investigando e condenando. Se há um surto anticrime, há uma epidemia de criminalidade.

A mesma sociedade que o governo diz que vai bem e que vive um momento milagroso de desenvolvimento econômico e social tranca-se amedrontada enquanto os bandidos tomam conta das ruas e também de setores dos poderes da República. Interessa agora, quando se repetem as ações da polícia, notadamente da Polícia Federal e do Ministério Público, detendo dezenas de pessoas em operações em vários estados, principalmente no Rio e em São Paulo, falar do surto anticrime, o surto ético, que, se por um lado revela que há autoridades preocupadas em pôr na cadeia as quadrilhas, mesmo quando integradas por pessoas poderosas, de outro desnuda as grandes operações criminosas e espanta a opinião pública mostrando que nem mesmo o Judiciário, em suas instâncias superiores, está acima de suspeitas.

Nos últimos dias, a Polícia Federal tem feito batidas e detenções por diversos motivos, sempre relacionado com crimes que envolvem milhões e o mar de lama de corrupção.

Talvez o melhor exemplo ainda seja o da chamada Operação Hurricane, desencadeada pela PF. Essa operação, preparada há dois anos, teve como objetivo declarado combater a prática da contravenção do jogo através dos caça-níqueis.

No último dia 13, a nação foi surpreendida com a notícia e as imagens da prisão de 25 pessoas e revelação de indícios de participação nessa armação criminosa de mais uma: um ministro do STF. Foram parar na cadeia, com prisão provisória de cinco dias, depois prorrogada por mais cinco, policiais federais, altos funcionários públicos, bicheiros e comandantes de escolas de samba, advogados e magistrados. O ministro do STF envolvido, Paulo Medina, que teria recebido um milhão de reais para dar uma liminar liberando os bingos, não foi preso. É gente grande demais para tanto. No dia 20, pediu afastamento do tribunal alegando problemas de saúde. Com isso, tirou uma folga remunerada. Mas o irmão dele, Virgílio Medina, que seria intermediário dos interesses das casas de bingo com as autoridades judiciárias e advogados, foi para a cadeia.

Agora o ministro César Peluso, do Supremo Tribunal Federal, apreciando pedido da Procuradoria Geral da República, acaba de decretar a prisão preventiva de 21 dos 26 acusados. Escaparam o membro do STF e os demais magistrados envolvidos. Tudo indica que é um surto anticrime e não uma epidemia, como a da criminalidade. Salvo melhor juízo, o espírito corporativo funcionou e a soltura da turma da Justiça põe em dúvida a efetividade dessas medidas que, à primeira vista, pareceram uma ação enérgica e à altura de enfrentar a epidemia nas altas esferas.

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