SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA – Da motivação dos efeitos da sentença

Os efeitos principais da sentença (imposição das penas: privativa de liberdade, restritiva de direitos, multa e medida de segurança), conforme repetidamente demonstado neste trabalho, devem ser fundamentados.

Quanto aos efeitos secundários, especialmente em relação aos extrapenais genéricos, há discordância na doutrina e jurisprudência quanto à necessidade de sua fundamentação, especialmente, porque, numa leitura mais desapercebida dos arts. 91 c.c. 92 do Código Penal, esta norma estaria a dispensar a motivação. Temos que é indispensável a motivação do julgado neste particular, com a exceção da obrigação de reparar o dano, conforme adiante demonstraremos.

Já com relação aos efeitos secundários extrapenais específicos, não há discordância quanto à necessidade de fundamentação do julgado, especialmente porque o parágrafo único do art. 92 é expresso neste sentido, não deixando, por isso, qualquer margem de dúvida.

Motivação dos efeitos extrapenais genéricos

A decisão que decreta a perda em favor da União de instrumentos do crime não precisa ser fundamentada, sendo inclusive dispensável a expressa referência no decisum a este respeito, tratando-se de conseqüência automática da condenação.

O mesmo não se pode dizer quando se trata de bens, objetos ou valores produto do crime. Neste caso, para que haja a decretação do perdimento é indispensável que o julgador motivadamente indique as razões do seu convencimento, segundo as provas dos autos, quanto forem os bens, objetos ou valores originários das condições previstas no art. 91, inc. II, letra, “b”, do Código Penal. Aplica-se neste caso também a previsão do art. 48, caput, da nova Lei de Tóxico.

Assim, é equivocada, em termos, a afirmação da maioria da doutrina quando diz que as hipóteses ora em comentário não necessitam de fundamentação. É dispensável a fundamentação quanto ao perdimento dos bens instrumento do crime, por tratar-se de conseqüência automática da sentença condenatória.

Mesmo assim, é indispensável que o julgador demonstre de forma objetiva, segundo as provas dos autos, enquadrarem-se os bens constritos, tanto em relação aos instrumentos quanto aos produtos do crime, nas hipóteses previstas no art. 91, inc. II, que prevê o perdimento em favor da União Federal. Neste aspecto a motivação é efetivamente indispensável, sob pena de a decisão ser nula neste particular.

A decisão deve enfrentar também as questões relacionadas com a ocasionalidade/eventualidade da utilização do bem considerado instrumento do crime. No caso de decidir-se pela decretação do seu perdimento, deverá indicar as razões desse convencimento, sob pena de nulidade do julgado, porque nesta hipótese, quando tratar-se de crime de tóxico, não incide nem mesmo a regra reguladora da perda automática do bem, prevista no art. 34 da Lei 6.368/76, reproduzida no art. 46 da nova Lei Antitóxicos.

Também há a necessidade de que a decisão indique tratar-se de instrumento ou produto originários de condutas infracionais tipificadas como crime, porque não é possível a aplicação deste perdimento nos casos de condenação pelo ilícito de contravenção.

Esta fundamentação ou mesmo a decretação do perdimento ora em comentário, quando tratar-se de produto de crime, obrigatoriamente terá que estar embutida na sentença penal condenatória, sendo que os instrumentos do crime podem ser objeto de decisão posterior.

Portanto, não há nulidade do julgado, quando tratar-se de instrumento do crime, a falta de análise destas condições na sentença, podendo a matéria ser analisada em momento posterior pelo juízo do processo.

Assim, conclui-se que é dispensável a motivação para a decretação do perdimento dos instrumentos do crime, cuidando-se de conseqüência automática da sentença penal condenatória.

Entretanto, isto não desobriga o juiz de motivar através das provas dos autos que tais bens, objetos ou valores, são instrumentos do crime, ainda que tenha que fazer isso em momento posterior à sentença.

Com relação ao patrimônio constrito sobre o fundamento de tratar-se de produto do crime em geral, e inclusive de tóxico, e neste nos termos do art. 48, caput, da nova Lei de Tóxico, o juiz, ao proferir decisão de mérito, decidirá sobre a decretação ou não do perdimento deste patrimônio. Em qualquer hipótese, além de motivar o perdimento, o julgador ainda terá que demonstrar as razões que o levaram a concluir tratar-se o patrimônio constrito, de produto do crime.

A necessidade de fundamentação, além de encontrar guarida no art. 381, inc. III, do Código de Processo Penal, que obriga a fundamentação da sentença a fim de possibilitar aos acusados terem ciência dos motivos da decisão, conferindo-lhes a oportunidade para valerem-se do contraditório, para agasalharem seus direitos à ampla defesa, também é contemplada na nossa Lei Maior, que, segundo o magistério de Vicente Paula Santos, “diante da nova ordem constitucional vigente, esta perda não mais pode ser aceita como efeito automático da sentença penal condenatória. Em se admitindo que o art. 91, inc. II, alíneas “a” e “b”, do Código Penal foi recepcionado pela Carta Magna de 1988, deve-se reinterpretá-lo conforme a Constituição. Nesse sentido, exige-se que a decretação da perda de bens em favor da União seja, pelo menos, motivada, sob pena de nulidade da sentença penal quanto a este efeito, pois inexiste condenação implícita. Não parece correto sustentar, relendo o caput do art. 91 do Código Penal, bem como seu inc. II, alínea “a” e “b”, à luz da Constituição Federal, com sua nova carga valorativa a exigir contraditório e ampla defesa, que ela o tenha recepcionado no ponto em que autoriza o decreto de perdimento automático de bens, sem fundamentação e contraditório.”.

Nesta decisão não se pode postergar a fundamentação para outro momento processual, por isso, no caso de omissão no julgado, o Ministério Público terá que saná-lo através de embargos de declaração ou através de recurso de apelação. Se assim não o fizer, haverá coisa julgada, e tais bens terão que ser restituídos aos seus respectivos proprietários.

Motivação dos efeitos extrapenais específicos

Os efeitos da condenação previstos no art. 92 e seus incisos, “não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença”, conforme estabelece o parágrafo único da citada norma legal.

Portanto, todas as hipóteses de efeitos secundários da sentença penal condenatória previstos no referido dispositivo legal, para serem aplicados, devem obrigatoriamente ocorrer mediante motivação, onde o julgador deverá demonstrar, através de provas contidas nos autos, a necessidade da aplicação destes efeitos.

Tais efeitos não devem ser aplicados indistintamente, principalmente porque eles não são provisórios ou temporários, mas sim, permanentes, circunstância esta que exige maior cautela do juiz ao declará-los. Eles são reservados àqueles “casos de maior gravidade, em que resulte do crime incompatibilidade” com o exercício do cargo, função pública, mandato eletivo, pátrio poder, tutela, curatela, permissão ou habilitação para dirigir veículo.

No caso de a sentença ou acórdão não declarar motivadamente a aplicação destes efeitos secundários da condenação, a nulidade atingirá apenas esta parte do julgado, prevalecendo os demais termos da decisão.

Jorge Vicente Silva

é pós-graduado em Pedagogia a nível superior e Especialista em Direito Processual Penal pela PUC/PR, autor de diversos livros publicados pela Editora Juruá, dentre eles, Tóxicos, análise da nova lei, estando no prelo, Sentença Penal Condenatória, JÁ NAS LIVRARIAS. E-mail: jorgevicentesilva@hotmail.com  e
jorgevicentesilva@swi.com.br

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