Sem confiscos

A invenção argentina chamada “corralito” é um confisco, embora temporário, do dinheiro da população. Em dólares, em pesos, de depósitos à vista e a prazo, levou ao desespero milhões de argentinos, castigados pela depressão econômica, o desemprego, o rompimento da ordem constitucional, a fome e a desesperança. Tentáculos da crise argentina atingiram em cheio o Uruguai e hoje vemos, no pequeno país do Prata, um “corralito” mais comportado, mas ainda assim desesperador. O confisco atinge apenas depósitos a prazo e em dólares, mas a insegurança e o desemprego garantem um clima contristador.

O ataque especulativo sofrido pelo Brasil, e que ainda não acabou, apesar do vantajoso acordo obtido com o FMI e a assistência do Bird e do Banco Mundial, levou à preocupação de que aqui também possa ser implantado um tipo de confisco pelo atual ou pelo futuro governo. O fato de no passado já ter acontecido com a ministra Zélia, no governo Collor, e ainda porque algumas colocações de Ciro Gomes, apoiado por Collor, foram interpretadas como intenção de implantar uma medida dessa gravidade, subtraindo dos depositantes parte de seus ativos, fez com que uma onda de temores corresse pelas nossas espinhas.

Na edição do último domingo, O Estado do Paraná publicou, em sua seção de economia, matéria sob o título “Novo presidente não vai poder realizar confiscos”. Nela, revela que uma emenda constitucional impede calote como o feito pelo governo Collor. A matéria mostra que, em 11 de setembro do ano passado, o Congresso Nacional aprovou e foi promulgada emenda constitucional proibindo o governo de fazer confiscos financeiros de qualquer natureza por medidas provisórias. Essa emenda tem o número 32 e estabelece que o Poder Executivo não pode decidir unilateralmente por um confisco.

É o quanto basta, pois outra forma de realizar um confisco seria através de providência votada e aprovada pelo Congresso Nacional. Só que, se tal medida fosse proposta ao Congresso, nele tramitaria por longo tempo e certamente seria rejeitada. E, na hipótese absurda de aprovação, haveria tempo suficiente para os depositantes promoverem uma corrida aos bancos, sacando seus recursos financeiros neles depositados e aplicados. Nesta hipótese, três conseqüências: muitos pegariam de volta o seu dinheiro, outros não achariam dinheiro em caixa para sacar e muitos bancos, se não todos, quebrariam.

Assim, não há o que temer, salvo a quebra de bancos, o que é indesejável, mas às vezes inevitável. Bancos podem quebrar aqui, na Argentina, nos Estados Unidos ou na Suíça, sempre que se tornem incapazes de honrar seus compromissos. Aliás, a loja da esquina, a padaria e o supermercado também.

Com a auspiciosa revelação de que o confisco está proibido pela Constituição e só pode acontecer com o rompimento do sistema democrático, resta a ameaçar-nos o perigoso mercado e os especuladores que nele pululam.

Neste mundo global, somos reféns do mercado, que em tudo e em todos manda. E o mercado, em última análise, é a soma dos cidadãos, investidores e tomadores, vendedores e compradores. Sua estabilidade depende, antes de mais nada, de confiança. Também, é óbvio, de sadias políticas econômicas.

O nosso maior inimigo é, pois, o desastrocismo. Descrer no Brasil é crime de lesa-pátria. Aqui não haverá confisco, as bases de nossa economia são sólidas. Por que dar chance aos especuladores?

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