Roteiro básico para entender a reforma sindical (2)

Neste segundo texto sobre a reforma sindical, apresentamos (a) um esboço da proposta do Fórum Nacional do Trabalho, ainda não remetida à Câmara dos Deputados em forma de emenda constitucional e lei complementar e, por isso mesmo, é prudente esperar a remessa para, então, ser possível análise mais detalhada (b) a proposta do Fórum Sindical dos Trabalhadores, que já está tramitando, possibilitando a indicação resumida de seus itens principais.

VIII. Proposta do Fórum Nacional do Trabalho-MTE

Governo federal encaminhará à Câmara dos Deputados proposta da emenda constitucional eliminando o sistema de unicidade sindical, o conceito de categoria profissional e econômica, a contribuição sindical obrigatória de todos os trabalhadores substituindo-a pela contribuição de negociação coletiva. Também enviará o projeto de lei sobre as relações sindicais, redigido em 238 artigos, incluindo pontos sobre (a) organização sindical (b) das entidades sindicais de trabalhadores e empregadores (c) do custeio (d) da representação dos trabalhadores no local de trabalho (e) negociação coletiva (f) direito de greve (g) criação do conselho nacional de relações do trabalho (h) das ações coletivas em geral (i) dos dissídios coletivos de trabalho, mediação e arbitragem. Eis os destaques do ministro do Trabalho e Emprego Ricardo Berzoini quanto aos trabalhos do FNT:

1. Esforço de negociação – "O projeto de reforma sindical que chegará ao Congresso Nacional é resultado do esforço de negociação de representantes dos trabalhadores, dos empregadores e do governo para assegurar uma convivência equilibrada. Alcançar esse objetivo, aliás, foi um dos objetivos iniciais de toda a luta política do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e grande parte dos integrantes do governo. Juntos, no Fórum Nacional do Trabalho (FNT), definimos novas bases para a relação entre capital e trabalho. O reconhecimento de conflitos existentes foi o primeiro passo para construir formas de solução.

2. Fortalecer o sindicalismo – Os resultados visam fortalecer as entidades sindicais e a negociação coletiva. O objetivo é solucionar conflitos trabalhistas de modo ágil, beneficiando o maior número possível de cidadãos. A nossa certeza é que somente instituições fortes e verdadeiramente representativas têm condições de promover o entendimento e o equilíbrio de forças garantido pela legislação. É por acreditarmos nisso que nos comprometemos, todos os negociadores, com a defesa, no Congresso Nacional, dos resultados do FNT, expresso na Proposta de Emenda Constitucional, que será entregue ao Parlamento, e no anteprojeto de lei, que será divulgado aos parlamentares e à opinião pública como compromisso político do Fórum e do governo Lula.

3. Mais liberdade – Pela proposta, trabalhadores e empregadores terão mais liberdade de criar legítimas entidades de classe, terão, também, o direito de decidir quando pagar às instituições que os representam, e como fazer o pagamento, eliminando as contribuições compulsórias. A negociação poderá ser feita em todas as instâncias: sindicatos, centrais sindicais, federações e confederações, que estarão aptos a contratar acordos. A negociação, aliás, será a regra básica de convivência e haverá mecanismos de garantia de que os conflitos não se arrastarão indefinidamente prejudicando os cidadãos.

4. Solução de conflitos – Os mecanismos de conciliação, mediação e arbitragem estarão integrados no sistema de solução de conflitos. A Justiça do Trabalho será fortalecida e terá suas funções renovadas. Deixará de exercer o poder normativo e passa a atuar como árbitro. O direito de greve será amplo, mas trabalhadores e empregadores serão responsáveis pela garantia do atendimento das necessidades essenciais da comunidade.

5. Contra a unicidade – Os consensos do FNT naturalmente não refletem a posição original do governo, que prega a mais ampla liberdade sindical, definida na Convenção 87 da OIT. Tampouco os demais atores mantiveram suas propostas originais. E este é um dos maiores méritos do Fórum: as partes terem aberto mão de determinadas posições em nome do entendimento.O governo renunciou à prerrogativa de elaborar propostas de autoria exclusiva a fim de buscar o consenso. Sempre defendemos que a melhor reforma seria a que surgisse da mesa de negociação. Nos casos em que o acordo foi impossível, mantivemos a decisão de encaminhar ao Congresso nossas propostas. Modernizar a legislação sindical é um compromisso do presidente e parte de um diagnóstico que mostra a falência do modelo vigente. O excessivo número de sindicatos de baixa representatividade só se explica pelo Imposto Sindical e pela unicidade imposta. A falta de representatividade leva à existência de mais de 2 milhões de novos processos na Justiça do Trabalho a cada ano. Somente com sindicatos democráticos e representativos, com presença nos locais de trabalho, contribuições vinculadas à negociação coletiva, com mais espaço para negociar e solucionar conflitos e centrais democráticas e representativas, o trabalhador poderá de fato se fazer representar" (fonte:DIAP).

IX. Projeto de Lei Fórum Sindical dos Trabalhadores

O Projeto de lei que altera a organização sindical foi divulgado em reunião do FST com parlamentares no dia 25.08.2004. Foi subscrito e apresentado pelo deputado federal Sérgio Miranda e outros parlamentares, sob o nr. 4554/2004, estando anexado ao PL 1528/89, ao qual estão também anexados mais 10 projetos de lei, ora em tramitação na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público, tendo como relator o deputado Tarcisio Zimmermann (PT/RS). Eis alguns pontos do projeto de lei:

1. Princípios sindicais – Defesa dos direitos e interesses individuais e coletivos, inclusive como substituto processual. Participar das negociações coletivas, inclusive no âmbito judicial, mediação e arbitragem. Representar os trabalhadores em organismos do poder público.

2. Entidades Sindicais – Mantém o sistema atual da representação de categoria profissional ou econômica. – Mantém o sistema da unicidade sindical e cria as Centrais Sindicais. – É considerado crime o ato de abusar das prerrogativas sindicais. – Registro sindical no Conselho Sindicais Nacionais de Trabalhadores e de Empregadores.

3. Organização sindical – Sindicato, Federação e Confederação: plano confederativo vertical. – Central Sindical dos Trabalhadores: representação horizontal de classe. – Sindicato mantém a exclusividade da representação da categoria..Formação da Central Sindical: (a) 2/3 dos Estados em 05 regiões geográficas (b) representação mínima de 10 categorias profissionais (c) representação de 2% das entidades sindicais registradas em seis Estados.

4. Conselhos Sindicais Nacionais – Conselho Sindical Nacional dos Trabalhadores – 9 titulares e 9 suplentes – eleitos pelas Confederações – mais 3 titulares e 3 suplentes indicados pelas Centrais Sindicais. – Competência (a) efetuar registro das entidades sindicais e das alterações estatutárias e decidir sobre as impugnações (b) definir controvérsias sobre enquadramento sindical, base territorial, registro, representatividade (c) opinar sobre projetos de lei (d) atualizar o quadro de atividades e profissões (e) alterar classificação de serviços e atividades essenciais. – Conselho Sindical Nacional dos Empregadores – será definido pelo regulamento interno.

5. Custeio Sindical – Manutenção da contribuição sindical obrigatória com base na remuneração de um dia de trabalho: 70%:sindicato; 17%:federação; 6%:confederação; 5%:central; 2%:Cons Sind Nacional. Contribuição da categoria – compulsória a todos os trabalhadores; – descontada em folha de pagamento; – derivada da negociação coletiva; – percentual fixado pela assembléia geral do sindicato; – no máximo de 1% da remuneração bruta anual do trabalhador em atividade; – rateio entre sindicato, federação, confederação e central a critério da assembléia geral.

6. Gestão Sindical – Eleições: – convocação no período máximo de 90 e mínimo de 60 dias antes do término do mandato. – Procedimentos eleitorais definidos do Estatuto. – Comissão Eleitoral: designada pela assembléia geral com três integrantes e mais um representante por chapa inscrita, podendo ser supervisionada pelo Conselho Sindical Nacional. – Membros da Diretoria: 03 no mínimo e 12 no máximo, com igual número de suplentes, com atribuições definidas em estatuto.- Acréscimo: um diretor a mais e seu suplente a cada 300 associados da entidade. – Diretoria da Federação: 7 dirigentes eleitos e seus suplentes. – Acréscimo: Mais um membro e seu suplente por aumento de novo sindicato filiado. – Diretoria da Confederação: 9 dirigentes e seus suplentes, com acréscimo de mais um dirigente por Federação filiada. – Central Sindical: Mínimo de 11 e máximo de 21 dirigentes e seus suplentes, com acréscimo de mais um dirigente por unidade da Federação com representação. – Conselho Fiscal:03 titulares e 3 suplentes. – Suspensão da administração que não tiver as contas aprovadas em assembléia geral.

7. Democracia da Organização Sindical – Prazo máximo de 4 anos a partir da vigência da lei para a entidade de grau superior adaptar o estatuto para assegurar que a entidade de base participe da gestão administrativa. – Mandato Sindical: não superior a 4 anos. – Edital das eleições: publicação em jornal de grande circulação na base territorial; e no Diário Oficial do Estado ou da União na caso de entidade estadual, nacional ou interestadual.

8. Da Representação Profissional no Local de Trabalho – Empresas até 100 empregados: constituição de Comissão Sindical de Base, coordenada pelo sindicato profissional. – Empresas como mais de 100 empregados: acresce mais um membro da Comissão a cada grupo de 200 trabalhadores, ou fração. – A CSB será constituída com pelo menos 03 empregados sindicalizados, por eleição dos trabalhadores da empresa, coordenada pelo sindicato. – Atribuições: (a) promover iniciativas do sindicato (b) fiscalizar a aplicação da lei, acordo ou convenção coletiva de trabalho e as condições de trabalho (c) acompanhar atividades da CIPA.

9. Disposições Transitórias – Prazo de 4 anos para as organizações sindicais efetivarem a adequação estatutária. – Reconhecer como válidos os registros das entidades sindicais legalizadas na data da publicação da lei. – O acervo do Cadastro Nacional das Entidades Sindicais do MTE será transferido para o Conselho Sindical Nacional dos Trabalhadores. – No prazo de três anos serão cancelados os registros das entidades sindicais obtidos em desacordo com o princípio da unicidade sindical, ou de forma ilícita ou fraudulenta. – Altera, para adaptação à nova, os artigos 517, 518, 523, 532, 540, 542, 545, 590, 591s da CLT, e revoga os artigos contrários às disposição da nova lei.

10. Observações finais: Confirmada a proposta do governo federal sobre a reforma sindical, com o envio da emenda constitucional e o projeto de lei de relações do trabalho, teremos o quadro completo na Câmara dos Deputados. As emendas constitucionais têm prevalência, eis que, se modificado o texto do artigo 8.º da Constituição Federal, poderão ser analisadas as proposições adequadas ao modelo do pluralismo sindical, inclusive as do multisindicalismo do projeto do Fórum Nacional do Trabalho-MTE. Caso não haja alteração constitucional do art.8.º, somente projetos de lei que complementem o atual dispositivo constitucional poderão ser debatidos. Por isso, haverá precedência do debate das emendas constitucionais. Neste ponto da análise, não é possível visualizar-se uma proposta consensual, já que essas fórmulas alternativas somente surgirão com o debate parlamentar. O ano de 2005 poderá ser produtivo neste sentido. Mas no ano de 2006, com as eleições presidenciais, para governadores e ao Congresso Nacional e Assembléias Legislativas, poderá ocorrer dificuldades para esse debate.

Edésio Passos é advogado e membro da Comissão Nacional de Relações e Direito do Trabalho do MTE. E mail: edesiopassos@terra.com.br

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