Relatório macabro

O chocante número de 492 laudos de mortes por armas de fogo ocorridas entre os dias 12 a 20 de maio na cidade de São Paulo e municípios vizinhos, em meio à onda de ataques do Primeiro Comando da Capital (PCC), foi entregue aos ministérios públicos federal e estadual pelo presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), Desiré Carlos Callegari.

Um saldo macabro apurado por médicos-legistas que integram o corpo técnico de 23 institutos médico-legais distribuídos no território estadual, chamados a colaborar no grande esforço de emitir os laudos necrológicos das 492 pessoas mortas a tiros no período mais violento vivido pelos habitantes da maior cidade da América Latina.

O Cremesp se reservou o direito de não revelar à imprensa os nomes das vítimas e tampouco a forma como foram mortas, ao enfatizar que em se tratando de problema de criminalística, nada mais oportuno que confiar o trabalho dos legistas aos órgãos competentes da esfera policial, Ministério Público e Poder Judiciário.

Os laudos não se referem com exclusividade aos mortos nos confrontos entre policiais e civis no período citado, mas despertam a atenção geral para o elevado número de óbitos (117) registrado no dia 15, segunda-feira, quando praticamente a cidade de São Paulo parou. Em anos recentes a média diária de mortes por arma de fogo em São Paulo, cidade notória pelos índices de criminalidade, era de 20. Como resultado da explosão detonada pelo PCC, a média extravasou para 62 no período mais intenso dos conflitos entre a polícia e os milicianos do crime organizado.

A constatação levou a Comissão Especial Independente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe), a estranhar o inusitado número de mortos e decidir-se a investigar com o rigor necessário os indícios que venham a comprovar o curso de circunstâncias ilegais e abusivas na ação de policiais ou grupos de extermínio, porquanto não se afasta a idéia de represálias dos agentes da lei contra pessoas inocentes.

Além do sentimento de temor ante a falta de sintonia dos órgãos responsáveis pela segurança pública, a sociedade se confronta com fatos estarrecedores que podem estar ligados a grupos de extermínio agindo ao arrepio da lei e da convivência ordeira. Por mais difícil que seja o dever de investigar, denunciar e punir com dureza, cabe ao Estado se conduzir com louvor na nobre missão de defender a cidadania.

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