Porte de arma

Há males que vêm para o bem. Na próxima terça-feira, todos os portes de arma em vigor em todo o País perderão seu valor. Terão caducado por causa da lei, da falta de sua regulamentação e ausência de autoridades que possam renová-los ou concedê-los a quem de direito. Há pouco tempo, mas ainda não finalmente, pois a proibição definitiva e mais absoluta ainda depende de um plebiscito que deverá acontecer daqui a cinco anos, o Congresso Nacional votou o Estatuto do Desarmamento. Aprovou-o, sob protestos de fabricantes de armas e equivocados que entendem que a permissão de seu uso deveria ser mantida, para que se armem as presumíveis vítimas, defendendo-se com a mesma moeda, olho por olho, dente por dente, de seus agressores. Argumento correto, não existisse a figura do Estado para defender os cidadãos em geral e os de bem, em particular. Se não o faz, há que se exigir que o faça, mas não implantar a lei da selva, com a liberação geral do uso de armas.

Nesse estatuto, no seu artigo 29, está prevista a anulação de todas as autorizações de porte de arma de fogo três meses depois de sua publicação. A lei foi publicada no Diário Oficial da União no dia 23 de dezembro do ano passado. Agora, na próxima terça-feira, fazem esses três meses. O estatuto também determina uma série de regras, dentre elas um teste psicotécnico, exigido para quem quisesse ter porte ou registro de arma. Isso demandaria uma regulamentação de parte do governo federal. Que fez o governo? Constituiu uma comissão interministerial para elaborar a regulamentação. Como diz o ditado, quem quer fazer, faz. Quem não quer, cria uma comissão. Mais uma vez se comprovou a sabedoria do povo. A comissão interministerial nada fez e, sem regulamentação, não dá para fornecer porte de arma para quem a ele tenha direito, apesar das restrições do novo estatuto. A proposta da comissão, mesmo depois de pronta, tem de ficar quinze dias sob consulta pública. Depois, sai o ato por decreto do presidente. Assim, está longe de tornar-se uma realidade, enquanto que o fim da validade dos atuais portes de armas acontece, indefectivelmente, na semana que vem.

Mas, mesmo que o governo tivesse constituído e feito funcionar dita comissão e ela tivesse submetido seu projeto de regulamentação à consulta pública, na prática continuaria impossível conseguir porte de arma de fogo. Isso porque a autoridade para concedê-lo, que era das polícias estaduais, passou para a Polícia Federal. E esta está em greve.

A nova lei proíbe o cidadão comum de ter porte de arma, excetuando aqueles que comprovarem a necessidade por correrem risco de vida ou morarem em lugares perigosos em área rural. São exigidas provas de saber manusear as armas e passar por teste psicotécnico. Ter tido porte antes não exime de fazer tais provas para requerer um novo, válido de acordo com o estatuto.

O que está impossibilitando o uso do Estatuto do Desarmamento poderá ser um mal que vem para o bem. Uma oportunidade para que as polícias dos estados façam uma varredura, promovendo amplo desarmamento. Seria interessante cada governador, aceitando esse desafio, promover tal campanha e determinar aos seus secretários de Segurança que coloquem em praça pública, à vista de todos, as armas apreendidas, para depois, dentro da lei, serem destruídas. Destruídos os instrumentos que têm destruído tantas vidas.

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