Trabalho perdido

Câmara Municipal legisla fora de sua competência

Na vontade de querer atender ao apelo popular e a temas de maior repercussão, a Câmara Municipal de Curitiba tem aprovado projetos na área da segurança pública, que a princípio são de competência dos estados e da União.

A eficiência desses projetos também é duvidosa. Até agora, numa análise de todos os projetos colocados em pauta pelos vereadores, as agências bancárias foram o alvo da vez na discussão de temas dos últimos meses.

Os vereadores aprovaram a proibição do uso do celular dentro das agências e, mesmo com a lei municipal afixada nas paredes dos bancos, muitos clientes continuam usando seus celulares dentro das agências, enquanto os seguranças se sentem pouco à vontade para pedir que se desligue os aparelhos.

Além desse projeto foram aprovados a instalação de câmeras de segurança nas áreas externas dos bancos; o controle biométrico na entrada desses estabelecimentos e a Lei dos Biombos, que exige a separação entre os caixas e as pessoas na fila de espera.

A Constituição Federal prevê que temas relativos à segurança pública não fazem parte do rol das atribuições dos vereadores, cabendo essa responsabilidade aos governos estaduais e federal, salvo se houver interesse local.

“O controle de constitucionalidade feito ainda no âmbito do Legislativo é muito mais em razão do autor da proposição do que de fundamentos técnicos. Com falta de rigor técnico e inspiração nos holofotes, a consequência natural é a usurpação da competência legislativa da União e dos Estados”, diz o advogado Ludimar Rafanhim, especialista em Direito Administrativo e Constitucional.

O advogado lembra que a lei que anos atrás tornou obrigatório o uso do cinto de segurança foi aprovada em Curitiba e nunca teve sua constitucionalidade questionada.

Um dos problemas da aprovação de projetos polêmicos é que, na prática, algumas leis acabam não tendo eficácia. “As propostas nascem da inspiração oriunda dos gabinetes parlamentares sem que segmentos interessados da sociedade tenham sido consultados. Muitos projetos são apresentados com base na repercussão imediata que terá”, afirma Rafanhim.

Ele acredita que, para evitar tais equívocos, é preciso que o Poder Legislativo Municipal invista em assessoria técnica apropriada para analisar a constitucionalidade das normas e sua repercussão social. Isso sem contar ações que já estão contempladas em leis anteriores.

“Vive-se no Brasil uma verdadeira inflação legislativa quando na verdade muitas questões já têm suporte na constituição Federal, Estadual e Lei Orgânica do Município”, completa.

O líder do prefeito na Câmara, vereador Mário Celso (PSB), defende os companheiros e diz que todos os projetos colocados em pauta são importantes, assim como a suplementação orçamentária aprovada para dar respaldo às ações da prefeitura, em diversas áreas.

“O autor só coloca projeto quando há cobrança da comunidade, é difícil alguém criar um projeto de livre arbítrio. A gente atende a um momento, como agora é a falta de segurança na cidade, com o aumento no volume de assaltos a bancos”, afirma. Márcio Celso é autor do projeto que prevê a instalação de leitores de impressão digital na entrada dos bancos.

Gastar tempo em aprovar nomes de rua não vale a pena, diz advogado

A prática de gastar boa parte das sessões plenárias para denominar logradouros públicos recebe críticas do especialista em Direito Administrativo e Constitucional Ludimar Rafanhim.

“O Legislativo Municipal é muito o,neroso para a sociedade se persistir aprovando nomes de ruas, títulos de cidadão honorário, vulto emérito e homenagens. Ele precisa tratar do zoneamento, transporte público, participação social, funcionamento e qualidade dos serviços públicos”, exemplifica Rafanhim, lembrando a responsabilidade dos vereadores na fiscalização de atos administrativos e contas públicas.

Entre todas as sessões plenárias deste ano na Câmara, o assunto mais presente foi a denominação de logradouros públicos. Foram 88 denominações de logradouro, seguido pela aprovação de 39 declarações de utilidade pública e 14 concessões do título de cidadão honorário.

Autor do projeto que proíbe o uso de telefone celular dentro dos bancos de Curitiba, o vereador Tito Zeglin (PDT) justifica a atividade. “Nome de rua às vezes é mais importante para determinada comunidade do que outras questões. Só quem mora em rua que não tem nome e precisa de código postal para receber carta sabe como isso faz falta”, responde.

Outros dois projetos criticados por sua relevância foi a instituição de ave (grimpeiro) e árvore-símbolo (caaingá) para Curitiba, com a defesa de que são espécies específicas da região e ameaçadas de extinção.

Outros projetos de relevância pública duvidosa chegaram a ser colocados em votação e depois vetados, como a ideia do plantio de árvores frutíferas nos bens públicos da cidade.