Veto polêmico

Shopping pode barrar a entrada de menores, mas tem que barrar todos. Sem exceção

Está dando o que falar o caso do Shopping Palladium, que conseguiu uma liminar para impedir a entrada de menores de idade sem companhia dos responsáveis aos domingos, após tumulto ocorrido no último dia 10, quando o estabelecimento teria sido palco de uma briga de gangues.
De um lado, lojistas, funcionários e clientes reivindicam segurança e tranquilidade. Do outro, adolescentes se sentem discriminados por não ter acesso ao local. Especialistas são unânimes ao dizer que a questão é complicada. Mas como fica esse conflito, se a Constituição Federal protege tanto direitos individuais, como o de ir e vir, quanto a propriedade privada?

A professora de Direito Constitucional da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Estefânia Maria de Queiroz Barboza afirma que nenhum direito protegido pela Constituição é absoluto, e cabe ao juiz em questão avaliar quando o exercício de um está ultrapassando os limites do outro. “Nesse caso em concreto, me parece que o magistrado entendeu que havia ameaça de violência, e decidiu por proteger o patrimônio, os seguranças e os próprios menores”, opina.

Para ela, o shopping está resguardado se barrar todos os menores desacompanhados, e não apenas os que aparentarem ser da periferia. “Em 2008, o Palladium estava impedindo a entrada de adolescentes com roupas de hip hop, sem medida judicial, presumindo apenas pela vestimenta que eles iriam tumultuar”, relembra ela, frisando que essa atuação era discriminatória e inconstitucional. No caso atual, afirma Estefânia, o shopping pode ser alvo de investigação caso alguém se sinta lesado e denuncie ao Ministério Público.

Em nota, o Palladium garante que “está tomando as medidas necessárias para garantir a segurança das pessoas que transitam pelo shopping”.

Bons pagam pelos maus

Na visão da presidente da Comissão de Direito de Família da Ordem dos Advogados do Brasil seção Paraná (OAB/PR), Adriana Hapner, o shopping age de forma correta e necessária, já que as atitudes dos jovens estavam comprometendo não só a atividade à qual o estabelecimento se propõe, como também a integridade física de lojistas e funcionários. “Deve haver, sim, medidas restritivas de frequência a lugares abertos ao público quando há risco para a coletividade”’, diz.

Quanto aos adolescentes sem intuito de badernar que podem ser barrados, Adriana afirma que, infelizmente, os bons pagam pelos maus. “Até que os autores dos delitos sejam identificados, a medida terá que ser feita de forma ampla”.

Critério correto

Segundo ela, o critério de seleção pela idade seria o mais indicado, já que menores não podem ser legalmente punidos por atos criminosos. Acompanhados por um adulto, estariam sob cuidados de um responsável.

O perigo da discriminação

O risco dessa medida, alerta o professor de Ciências Sociais da UFPR e coordenador geral do Centro de Estudos em Segurança Pública e Direitos Humanos, Pedro Bodê, é que a administração do shopping restrinja o acesso somente a jovens pobres ou negros. “O critério de idade pega todo mundo. Quem fez isso [arruaça] foram jovens menores de idade que não podem ser responsabilizados pelo dano, então, os pais tem que estar juntos. Isso é um argumento minimamente razoável. Mas tem que haver um cuidado para não virar uma seleção pela classe social ou pela raça”, pondera.

Ele chama atenção ainda para o fato de que a discriminação social e racial provocaria impactos negativos nos jovens barrados, produzindo sentimentos de revolta e ressentimento, o que poderia gerar mais violência.

Crise na família influencia

De acordo com o sociólogo e professor da pós-graduação em Educação e Direitos da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) Lindomar Wessler Bone,ti, uma juventude abandonada pela família seria a causa das situações de tumulto e violência vistas no shopping e em outras situações semelhantes.

“Isso significa que esses menores não estão tendo acompanhamento nem o mínimo direcionamento familiar, e que eles acabam encontrando laços afetivos e de relações com outros da mesma idade, e vão à procura de aventura”.

Sem exclusividade

O sociólogo acrescenta que essa rebeldia não é exclusividade de jovens da periferia. “Independentemente da condição de classe, o adolescente passa por um momento de angústia por descobertas, por relações novas, e isso é normal”, explica. E ainda completa: “Tem famílias que conseguem administrar esse conflito próprio da adolescência e fazer com que essa energia toda seja canalizada positivamente; outras, não”.

Legislação

De acordo com o artigo 16 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em vigor desde 1990, a criança e o adolescente têm direito à liberdade de “ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais”, e de “participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação”.